“Dá-me gozo estragar o bonitinho”

Republicamos aqui a entrevista que o Ípsilon fez a Armando Silva Carvalho em 2007, a pretexto do lançamento de O Que Foi Passado a Limpo, compilação da sua obra poética.

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RG RUI GAUDENCIO - PòBLICO

Armando Silva Carvalho acabou de lançar, na Assírio & Alvim, O Que Foi Passado a Limpo, onde reúne quarenta anos de trabalho poético, desde Lírica Consumível (1965) a Sol a Sol (2005). Nunca lhe faltaram sinais exteriores de reconhecimento, incluindo prémios literários, mas escreveu-se pouco sobre a poesia. Ele não liga muito. Diz que já está habituado a “causar uma certa estranheza”. Nunca apreciou poemas “bonitinhos” e, se escreveu alguns, foi porque se esqueceu de “torcer o pescoço à rima”. Ao aproximar-se, agora, dos 70 anos, confessa um desejo: “Gostava de escrever poemas políticos”.

O Que Foi Passado a Limpo abre com um longo texto do poeta e ensaísta José Manuel de Vasconcelos. Além desta, não me lembro de muitas outras abordagens de fundo à sua poesia...

Penso que não há mesmo mais nenhuma.

E não acha isso insólito?

Já estou habituado à reacção das pessoas e da crítica. Não tenho tido problemas com os críticos, no sentido de dizerem que os meus livros são horrorosos, mas acho que o que escrevo causa uma certa estranheza. E há grandes confusões: ou sou anti-lírico, ou sou satírico, ou sou um continuador espúrio do Alexandre O’Neill. Penso que tenho uma vertente lírica que não é levada em consideração. Neste prefácio, José Manuel de Vasconcelos faz uma abordagem mais abrangente.

Porque é que não está na Poesia 61 [colectânea constituída por cinco livros autónomos, assinados por Maria Teresa Horta, Fiama Hasse Pais Brandão, Casimiro de Brito, Luiza Neto Jorge e Gastão Cruz]? Conhecia aquelas pessoas, colaborou com elas na Antologia da Poesia Universitária

Conhecia as pessoas, mas não havia grande intimidade. Penso que eles próprios não estavam interessados em criar nenhuma escola. Aquilo aconteceu por acidente, e depois acabou por se transformar em algo que foi considerado uma posição nova. Não sei bem dizer porque é que não estou lá. Foi por acaso. Aquelas pessoas, por qualquer razão, aproximaram- se naquele momento e decidiram publicar aquilo. Mas depois cada qual fez a sua vida, em termos de trabalho poético.

Já na altura eram poetas bastante diferentes.

Completamente diferentes. Talvez o Gastão [Cruz], mais do que todos os outros, tenha organizado as coisas dele em função de uma determinada forma de encarar o trabalho poético.

Lírica Consumível saiu em 1965, mas escreveu-o antes, uma vez que o livro já ganhara o Prémio de Revelação da Associação Portuguesa de Escritores. Tinha vinte e poucos anos. Tendo em conta a sua idade, e o facto de se tratar de uma obra de estreia, não era já um livro um tanto programático?

O que havia de sentido programático era em relação a mim próprio e a leitura que eu fazia do Portugal da época. Tinha também a ver com as minhas origens, com o modo como eu cheguei à universidade, com a visão que tinha do mundo académico. E do mundo burguês, eu que vinha de um universo completamente rural. Acho que tudo isto está na Lírica Consumível.

Apesar de algumas semelhanças ao nível dos processos de construção com poetas como Gastão Cruz ou Fiama...

Tínhamos afinidades. Era a fruta da época...

…mas não lhe parece que, já nesses seus primeiros livros, se sente como que uma suspeita da poesia, uma certa dessacralização da palavra poética, que o distingue desses autores?

Essa ideia é interessante, mas penso que aquilo que há de dessacralizante naquilo que escrevo é o resultado da minha relativa ignorância. É um pouco forte o que estou a dizer, mas a verdade é que o que eu lia, em termos de poemas, não me espantava o suficiente para que eu levasse aquilo demasiado a sério. Talvez seja o espírito do homem do campo, que é sempre muito desconfiado. (E não estou aqui a defender o homem do campo, que, aliás, já não existe.) Havia sempre qualquer coisa que me fazia ficar de pé atras. Vou dar um exemplo. A dada altura senti muito a influência do João Cabral de Melo Neto, fiquei muito espantado com aquilo, gostava imenso. E pensei: isto pode ser feito assim dentro da minha casa, da minha fábrica. Mas o que eu lia do Melo Neto eram alguns poemas ou excertos, e três ou quatro críticas que o Gaspar Simões lhe fez. Daí eu dizer que essa dessacralização é fruto da ignorância. Não sou, realmente, um autor muito culto.

Mas há muitas referências culturais na sua poesia.

Sim, mas essas referências são um pouco para espantar.

E traduziu vários poetas e ficcionistas…

A tradução já veio depois.

Tem sido aproximado de Alexandre O’Neill, como disse, mas o seu humor parece ser bastante mais duro.

Gosto muito do texto do O’Neill. É muitíssimo trabalhado, coisa que o meu não é, mas penso que ele estava de certo modo integrado naquilo mesmo que criticava. Era um anti-burguês dentro da burguesia. Eu não estava mesmo integrado. Isto pode parecer uma pose da minha parte. Hoje sou um burguês como outra pessoa qualquer, mas, nessa época, quando escrevi os primeiros livros, não era mesmo. Também o Cesariny nunca foi um burguês, em termos de comportamento. Tenho uma grande admiração por ele. Mas nessa altura não lia muito nem um, nem outro. O autor que lia com mais intensidade era o Mário de Sá-Carneiro.

Os poetas da sua geração, mesmo os que procuravam uma linguagem mais distante do uso comum, davam muita atenção ao modo como os poemas soavam, e moviam-se num território vocabular que não transgredia assim tanto as fronteiras convencionais do poético. O seu jogo parece ter sido outro desde o início, quer pelo modo como ia buscar palavras a múltiplas proveniências, quer pelo que se diria ser uma sabotagem deliberada da eufonia.

A construção, o bonitinho, o composto sempre me fizeram confusão. O O’Neill dizia que não gostava do bonito, mas estava a fazer bonito. Nos seus últimos textos, sente-se muito essa construção. E há quem defenda que, num poema, a construção está acima de tudo. Não tenho essa posição, mas é aceitável. A mim, dá-me gozo estragar o bonitinho, porque a musicalidade convencional, a metáfora adjectivada, tudo isso é-me bastante acessível.

Há até testemunhos disso: volta e meia, aparece nos seus livros um soneto em decassílabos impecáveis…

Pois, às vezes esqueço-me de torcer o pescoço à rima.

Essa recusa do “bonitinho” não justificará a tal estranheza da crítica a que há pouco se referiu?

Há uma frase do António Ramos Rosa que ficou quase como um “slogan”. Ele escreveu que eu era “anti-lírico por excelência”. Nunca disse mal do que escrevi, até pelo contrário, mas nessa frase conseguiu sintetizar tudo o que então se dizia dos meus textos. A mim parece-me que já nos primeiros poemas, independentemente de também serem de crítica social e política, há ali de vez em quando um transbordar lírico muito forte.

Num texto de O Alicate [1972], invectiva “os poetinhas [que] marujam na versátil confusão dos versos”.

Já estou velho, e quando agora leio isso faz-me confusão. O que é que me levou a escrever aquilo? O sangue na guelra? O estar despeitado por uma razão ou por outra? Hoje não escreveria isso.

Mas, descontada a terminologia, foi sempre mantendo uma atitude crítica em relação ao modo como a literatura se foi tornando indistinguível de outros produtos de consumo. E saberá do que fala, uma vez que foi técnico de publicidade.

A grande tragédia da minha vida foi ser publicitário. Digo isto muito seriamente. Uma vida que fui obrigado a viver de forma...

Esquizofrénica?

Exactamente, a palavra é essa. Nessa altura, a publicidade era vista pelos bem pensantes como um trabalho quase de prostituição. O facto é que não consegui arranjar emprego com o curso de Direito, e também não me interessava muito ser advogado. E na função pública estava proibido de trabalhar por razões políticas. Eu achava que um dia poderia ir para a diplomacia. Via o Saint-John Perse, esses tipos, o Paul Claudel, e achava que era o que me convinha. Sentava-me a uma secretária e tinha tempo para fazer versos. Não fazia mais nada, só versos, e andava com uma faixa ao peito. É ridículo, mas é verdade que pensava nisto. Também podia ter ido para Medicina. E se calhar devia ter ido. Houve um professor que insistiu muito comigo, mas acabei por ir para Direito. Sempre com a expectativa de que um dia o Salazar ia morrer – caía de uma cadeira qualquer –, e depois havia liberdade e eu podia ir para a diplomacia.

Em Portuguex [1977], usa o discurso publicitário para criticar o país e, em certa medida, também a própria publicidade.

Esse livro tinha muita coisa misturada – eu usava várias estruturas textuais – e acho que aquilo ficou um pouco amalgamado, uma confusão. Nessa altura, não havia trabalho nas agências publicitárias. Estava tudo parado. Passávamos o tempo em reuniões de comissões de trabalhadores. Eu estava lá no meu gabinete e ia escrevendo aqueles textos. Agora, noutro registo, poeticamente, fiz uma coisa, chamada Armas Brancas, que considero um trabalho honesto sobre o desenvolvimento da chamada revolução. Mas praticamente ninguém deu por isso. É um texto de que nunca se falou, mas tenho orgulho nele. Não era panfletário, era um texto, desculpe a palavra, reflexivo sobre o que se estava a passar. Escrevi quase diariamente – só faltou pôr as datas –, mais ou menos até ao Natal de 1975.

Não pôs datas, mas acrescentou notas...

São umas notas um bocado pretensiosas, mas achei que as devia dar. Por exemplo, pus num poema alguns chavões do Abraham Moles, e achei que devia justificar isso. Outras notas são indicativas de episódios, uma ocupação, uma manifestação.

Referi as notas, porque elas deveriam ter deixado claro para os leitores da época qual era o pretexto do livro.

Pois, se calhar também as pus com essa intenção pedagógica.

Embora os poemas de Armas Brancas sejam autonomizáveis, vê o livro como um único texto?

Sim, não é propriamente um diário, mas é um escrever ao lado do que se estava a passar, com atenção aos fenómenos sociais e políticos. E tive a pretensão de encontrar uma linha de interpretação racional, sem andar atrás dos foguetes, nem com euforias excessivas, como acontecia com a maior parte das pessoas.

Em 1983 publicou Alexandre Bissexto, que é consensualmente reconhecido como um ponto alto da sua obra. Nada fazia prever que estaria depois 12 anos sem voltar à poesia. Entretanto, escreveu ficção.

Fiz um ou dois romances e também contos.

Regressa com Canis Dei, onde a presença de Deus não parece ter já a carga irónica que tinha em Alexandre Bissexto. Conciliar a existência de Deus com o mal do mundo é uma dificuldade teológica clássica. Mas esse Deus que irrompe na sua poesia com Canis Dei parece nascer justamente do mal. O livro tem um ambiente pestífero.

 O Bissexto, como lhe chamo, é um livro um pouco litúrgico. Está muito ligado à minha profissão, por assim dizer, de ajudante de padre. Em miúdo eu ajudava na missa, na liturgia, na paramentação. Mas nunca tive fé, ou tive apenas períodos muito curtos com fé. O Alexandre Bissexto está muito preso à liturgia católica. No Canis Dei, nem liturgia, nem Deus. Ou um Deus só por oposição, por carência, por incapacidade de ver no mundo um sinal que me leve a conceber a existência dele. Já essa referência à peste era uma coisa que andava muito no ar: a irrespirabilidade da existência, uma natureza que deixara de ter sítio, que estava completamente disfuncional. Falava-se muito das chuvas ácidas. Havia essa ideia de apocalipse, de terror, um mundo em que o próprio homem – ou Deus, sendo o homem feito à sua semelhança – estava a levar isto cada vez mais depressa até à etapa final.

Há duas palavras recorrentes na sua poesia, que atravessam todos os livros: cão e mar. Trinta anos antes de Canis Dei, escreve no poema O Peso das Fronteiras: “Esse sou eu. Um cão dentro do túnel”...

É um texto abusadamente lírico. Aí eu assumo a posição de cão.

E não faz o mesmo em Canis Dei?

Sim, obviamente. A noção de cão, para mim, é a de um animal dependente. Não é o que defende, é o que depende. A minha experiência com cães vem sobretudo da infância, dos perdigueiros que o meu pai tinha na aldeia, que eram animais submissos, solícitos. E essa carga que eu transporto na metáfora “cão”. E o mar também é o da infância, o mar do Baleal. A minha aldeia fica a 15 quilómetros do mar, mas para se lá chegar, nesse tempo, era uma odisseia. O meu pai punha uns burros em cima da camioneta e, quando deixava de haver estrada, eram os burros que transportavam os haveres.

No seu último livro, Sol a Sol, diz que “O mar é um vasto céu de belas caixas cranianas”. É uma imagem estranha.

Muito estranha. Quando ma disse, agora, eu próprio fiquei espantado.

É também uma imagem violenta. José Manuel dos Santos aproxima Canis Dei de Vulcão de Luís Miguel Nava, que me parece um dos livros mais violentos da poesia portuguesa contemporânea. Desse ponto de vista, Canis Dei até nem será o melhor exemplo. Mas na generalidade dos seus livros há, de facto, uma violência pouco comum na nossa lírica.

Ainda em relação ao mar: eu costumo pensar que ele só nos dá o que nele pomos. E eu ponho lá muito pouco. A Sophia ia lá buscar – como é que era? – os momentos todos que não viveu. Espantam-me as pessoas como ela, a quem o mar inspira aquelas imagens de tanta beleza. Eu tento interrogar o mar, a ver se ele me responde, mas a resposta é sempre absurda. Aquele infinito de água devolve-me um absurdo também infinito, sem fundamento, que é a minha vida e a dos outros. Onde vejo mais violência é em alguns animais. Nas gaivotas. A gaivota, coitada, nunca mais sai dos versos. Entra num poema, sai, e vai logo para outro. Mas é um animal predador extremamente desagradável. Na gaivota encontro a violência da vida, da sobrevivência, mas no mar, quando ele está liso, só vejo algo que está morto. O que é curioso, uma vez que é dali que vem tudo o que vive.

O seu penúltimo livro, Lisboas, parece ser um livro um pouco diferente dos outros. É talvez o mais fácil de ler, não é?

É um livro de circunstância. Tinha de apresentar um projecto para me darem uma bolsa e lembrei-me daquilo. Só tinha escrito um ou dois poemas, que acrescentei ao projecto, para exemplificar. Há tempos vi na Internet uma coisa escrita por um brasileiro que esteve em Lisboa, comprou o livro, e gostou muito. Mas, depois, já falava de comidas, de coisas pitorescas da cidade. Eu pensei: bem, o homem quase transforma o livro...

Num guia turístico?

Sim, num guia. Hoje escreveria uma coisa completamente diferente. Acho que tem razão quando diz que é o livro mais facilmente percorrível. Não digo que roce o pitoresco, mas pode ter alguns toques de bairrismo ou coisa que o valha.

Quando disse “fácil de ler”, a intenção não era de todo pejorativa. Mas parece ser um livro menos “sabotado” ao nível da escrita. Tem alguns desses tais poemas...

À Carlos de Oliveira, não é?, com as sílabas todas muito bem medidas. Esse, sim, é que era um grande trabalhador do verso, e que nunca foi devidamente apreciado como poeta. Ficou sempre na sombra de dois ou três nomes muito mais conhecidos, e mais acessíveis. Tenho uma grande admiração por ele.

No que escreve, há muitas referências à infância. Mas não é uma infância nada idílica.

Pois não. O Borges dizia que o pior do homem é sempre a infância. E a dele parece ter sido a de um menino de ouro, com tudo o que havia de melhor em termos de cultura. A minha não foi mesmo nada idílica. Sabia lá o que era um livro, quanto mais ter uma biblioteca. Andei sempre a tentar denegar a infância, a ver se ela me deixava de vez, mas claro que nunca me deixou. Agora, quando vou à aldeia, tenho encontros, às vezes simpáticos, com pessoas da minha idade, mas nunca farei as pazes com aquele mundo. A ignorância da burguesia urbana do que era a vida no campo fazia-me confusão. Essa vida também já não existe, mas mesmo na época, naquilo que eu lia, não encontrava um conhecimento profundo do que era ser-se originário do mundo rural. Nem nos neo-realistas, apesar dos seus clichés. Essa ignorância exasperava- me, e talvez esteja aí a mola que me acicatou para que eu tivesse este tipo de violência face a tudo o que me rodeava. Ninguém me marginalizava, mas eu marginalizava-me a mim próprio para depois poder agredir o outro.

Em Sol a Sol, cruza a sua infância com a de Fiama Hasse Pais Brandão...

Há um poema em que ando a brincar com as nossas infâncias. Com aquilo que eu supus que pudesse ter sido a dela, porque não a conheci. Nem sequer era assim tão íntimo dela como se possa pensar. E não conversávamos muito sobre poesia, ainda que a Fiama não fosse como a Luiza Neto Jorge, que gostava de falar de tudo menos de poesia. Era fantástica.

Em termos de escrita, não está mais próximo da Luiza Neto Jorge do que de qualquer outro dos chamados poetas de 61?

Ao nível da escrita, é verdade. Em termos eróticos, ela é extraordinariamente violenta. Conheço poucos homens – até não conheço nenhum – que cheguem lá perto. Eu posso aproximar-me, mas ela vai muito à frente.

Por contraste com a primeira fase da sua obra, os seus últimos livros parecem um pouco mais apaziguados. Concorda?

Alguém até disse que o Sol a Sol parecia póstumo. Os últimos livros são mais pacificadores. Lutar por quê? Pela sobrevivência? Às vezes nem me apetece. Por causas sociais? Gostaria, antes de morrer, de escrever poemas políticos. Mas não sei como.

Mas boa parte do que escreveu não é poesia política?

Penso que sim. Mas, agora, gostaria de a escrever de uma forma muitíssimo mais directa. O problema é encontrar a linguagem certa, para que aquilo não soe completamente fraudulento e amorfo. É muito difícil. Mas a ideia de que não há nada a fazer, essa aceitação, irrita-me. Já não posso ouvir falar do fim das ideologias. O que é que isso quer dizer? Só porque acabou o pseudo-socialismo, ou o pseudo-pseudo-comunismo na pseudo-União Soviética? Isso não quer dizer nada. Foi um acontecimento histórico, foi um falhanço, mas porque é que não podem existir outras possibilidades? Gostaria de ter a esperança, nestes anos que me restam, de que isto não é para acabar tudo de vez, se bem que tudo me diga que é mesmo para acabar, e nada me diga o contrário. Sente-se uma efervescência na humanidade, nos cidadãos, nos consumidores – é esta a melhor palavra –, como se quisessem apressar o fim disto tudo. Mas como eu não tenho filhos nem sobrinhos, talvez não saiba o que querem estes jovens de hoje.

Há um autor recente, José Miguel Silva, que me parece ter resolvido bem o problema de encontrar uma linguagem eficaz para a poesia política.

Gosto imenso. Mas como sou muitíssimo mais velho do que ele, já não o posso copiar. Estes que escrevem a tal poesia do quotidiano começam a ter uma linguagem – e uma linguagem que eu aceito, e sou velho –, que ultrapassará toda aquela imagética, todas aquelas metáforas que tínhamos há vinte anos e que iriam tornar-se insuportáveis.

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