Estado aplicou 15 milhões de euros em acções da Galp
Parpública reforçou posição por causa da emissão de obrigações convertíveis em acções da petrolífera, que vence em Setembro.
A Parpública, holding estatal que concentra diversas posições financeiras do Estado, desembolsou 15,2 milhões de euros para reforçar a sua posição na Galp Energia com mais 1.242.485 acções, detendo, no total, 7,33% do capital da petrolífera. A operação, que decorreu em duas fases, em Julho e Outubro do ano passado, está ligada à emissão de obrigações convertíveis feita pela Parpública em 2010, e que tem como activo subjacente o equivalente a 7% da Galp.
Em resposta ao PÚBLICO, a holding estatal liderada por Miguel Cruz diz que não só “está obrigada a manter em carteira os activos subjacentes ao empréstimo obrigacionista”, como adicionalmente, “está obrigada a aplicar o valor dos dividendos recebidos, na parte que exceda o valor contratualmente previsto, na aquisição de acções Galp”.
Para a mesma fonte, “trata-se de uma cláusula normal neste tipo de contratos, que tem como objectivo a protecção dos obrigacionistas, através da salvaguarda do valor do activo subjacente (ou seja, os títulos da Galp) face a uma eventual 'excessiva' distribuição de dividendos”.
O compromisso tem levado a ajustes pontuais na carteira de acções da Parpública; já em 2014, quando a Galp anunciou o pagamento de um dividendo intercalar de 0,1728 euros, a Parpública considerou que a remuneração accionista excedeu o previsto na chamada cláusula de protecção de dividendos, anunciando a compra de mais 816 mil acções. Com esses reforços, a Parpública detém actualmente 7,33% do capital da petrolífera liderada por Carlos Gomes da Silva, num total de 60,7 milhões de acções.
Esta posição, aliás, mostrou-se valiosa nos últimos anos: entre 2010 e 2016 a holding estatal recebeu o total de 122 milhões de euros (valor bruto) em dividendos entregues pela Galp. De acordo com a fonte oficial da empresa, a parte destes 122 milhões “que não corresponde a excesso de dividendo” constitui “receita própria da Parpública e foi aplicada na cobertura das suas necessidades de financiamento, como qualquer outra receita própria”.
Inquirida sobre o valor que foi retido na Parpública, a empresa não respondeu em tempo útil. Em 2016, a Galp entregou à Parpública dividendos no valor de 27,4 milhões de euros (valor que compara com os 22,4 milhões de 2015).
Decisão dentro de poucos meses
A emissão de obrigações - tendo como activo subjacente 7% das acções da Galp - foi realizada no âmbito da 5ª fase de reprivatização da petrolífera mas, com a maturidade da dívida a aproximar-se, no próximo mês de Setembro a Parpública pode optar por pagar em dinheiro mesmo que os investidores queiram ser accionistas da empresa.
Questionada pelo PÚBLICO sobre essa questão, e se pretende manter-se accionista da Galp, a Parpública respondeu apenas que “o financiamento de qualquer das possíveis opções foi devidamente acautelado” e que comunicará ao mercado, “em devido tempo, a opção escolhida”.
Em 2015, já houve investidores que requereram o reembolso antecipado das obrigações, mas a uma pequena escala (14 obrigações, no valor global de 700 mil euros).
Actualmente, o valor devido pela Parpública está nos 884,9 milhões de euros. Este seria o valor a pagar pelo Estado caso, em última análise, o Governo optasse por permanecer como accionista da empresa, que teve um lucro de 483 milhões no ano passado.
As acções da Galp associadas ao empréstimo da Parpública são a única fatia da Galp que não está à negociação no mercado de capitais, onde a petrolífera conta com um free float da ordem dos 59,6%. Os outros 33,3% do capital estão nas mãos da Amorim Energia, liderada por Américo Amorim (que este ano cedeu a liderança do conselho de administração da empresa à sua filha Paula Amorim), em parceria com a petrolífera estatal angolana Sonangol e Isabel dos Santos, filha do presidente de Angola.
Embora a última fase de reprivatização da Galp tenha sido decidida em 2008 pelo Governo de José Sócrates, a emissão obrigacionista apenas avançou no Verão de 2010. Nessa ocasião, a Parpública informou que os títulos foram colocados “exclusivamente junto de investidores qualificados, nacionais e internacionais”.
Um ano depois, a Assembleia da República, já sob maioria PSD/CDS, aprovou as alterações propostas pelo Governo à Lei-quadro das Privatizações que, com outras mudanças nos diplomas das reprivatizações em causa (Decreto-Lei n.º 90/2011), puseram fim às golden shares que o Estado ainda detinha em empresas como a PT, a EDP e a Galp, consideradas estratégicas. Uma medida que o Governo de coligação tomou de “forma decidida e convicta", como afirmou o então ministro das Finanças, Vítor Gaspar.
Em Novembro de 2012, o Estado deu mais um passo no sentido de sair da estrutura accionista da Galp quando a Caixa Geral de Depósitos (CGD) vendeu a posição de 1% que tinha no capital – acompanhando a operação de venda da Eni, uma possibilidade que tinha sido acordado com os antigos accionistas italianos, que chegaram a ter 33% das acções da petrolífera. Nessa operação, o banco público realizou um encaixe de 95 milhões de euros.
Mudanças na Parpública
Actualmente, a Parpública apresenta-se cada vez mais como uma entidade gestora de activos imobiliários do Estado e como uma espécie de consultora do que uma holding onde se concentram participações públicas, até porque estas últimas são cada vez menos. Além das privatizações, onde se incluem os 50% da TAP que ficam em mãos privadas (incluindo os 5% dos trabalhadores), que tiraram dimensão à holding, houve a decisão de passar os 49% da Parcaixa da Parpública para a CGD.
Agora liderada por Miguel Cruz (ex-IAPMEI), a holding tem entre as suas missões funcionar como “centro de competências para as empresas públicas”, papel a assumir este ano. De acordo com a empresa, que teve um lucro de 94 milhões de euros no ano passado, a Parpública passará, “gradualmente”, a prestar apoio “às empresas públicas do sector empresarial do Estado nos domínios de competência que são os seus”.
Neste momento “presta já serviços partilhados, no âmbito da articulação com as empresas públicas do grupo Parpública (entre elas a Águas de Portugal, a Casa da Moeda e a Companhia das Lezírias)”. Este ano, diz a holding, “constituirá um período de implementação gradual desse centro de competências”.
No imobiliário, a Parpública começou a reestruturar esta área de negócio há cerca de dois anos, tendo sido incorporada a Sagestamo. Além desta, há ainda a Estamo e a Fundiestamo. De acordo com o relatório de 2016, “este processo está dependente da análise que se encontra em curso, nomeadamente por parte da Administração Tributária”.
A Sociedade Portuguesa de Empreendimentos (SPE) também vai deixar de fazer parte do universo da Parpública, mas através de dissolução. Depois ter resolvido o diferendo que tinha com o Estado angolano no seu único negócio, a exploração de diamantes na zona da Lundas, através da venda da sua posição no negócio (detinha 49% da Sociedade Mineira do Lucapa - SML), a empresa encaixou 130 milhões de dólares (cerca de 115 milhões de euros). A participação na SML era o seu único activo, e foi votada a distribuição de dividendos e posterior extinção da empresa onde o Estado detém 81%. O resto do capital está disperso por mais de 4000 accionistas, aos quais cabem 15 milhões de euros. De acordo com as informações prestadas ao PÚBLICO pela Parpública, neste momento “a grande maioria dos accionistas privados já recebeu os dividendos”, no valor de 7,4 milhões de euros.