Já se sabe como é que alguns cogumelos brilham
Descritos os componentes moleculares envolvidos no lado nocturno e luminoso dos cogumelos.
Já se sabia que o brilho nocturno dos cogumelos fluorescentes servia para ajudar na sua reprodução. Agora, os cientistas esclarecem o mecanismo que faz com que estes fungos fiquem iluminados, irradiando um verde fluorescente. Um artigo publicado na última edição da revista Science Advances descreve os componentes moleculares envolvidos neste lado nocturno e luminoso dos cogumelos.
Há insectos, bactérias e alguns animais marinhos que brilham e, nestes casos, os sistemas usados por organismos vivos para emitir luz (a que se chama “bioluminescência”) já foram caracterizados . De uma forma geral, este brilho nasce de uma reacção química que envolve a enzima luciferase e a molécula luciferina (do latim lucifer, “que ilumina”). Na presença de oxigénio, a luciferase reage com a luciferina emitindo luz e formando um subproduto chamado oxiluciferina. Este é o sistema que está por trás do brilho de um pirilampo, por exemplo, para citar o mais conhecido caso de bioluminescência.
Porém, até agora, este circuito (e os seus componentes moleculares) não tinha sido caracterizado nos cogumelos que brilham em todo o mundo e há quatro linhagens conhecidas de fungos luminescentes que somam cerca de 80 diferentes espécies.
Uma equipa de cientistas da Rússia, do Japão e Brasil analisou extractos de duas espécies de cogumelos: o Neonothopanus gardneri (um cogumelo que existe no Brasil e que também é conhecido por flor-de-coco) e o Neonothopanus nambi (um cogumelo venenoso que é encontrado nas floresta tropicais do Sul do Vietname). O flor-de-coco, que cresce na base de palmeiras na mata dos cocais nos estados de Piauí, Maranhão, Tocantins e Goiás, no Centro e Norte do Brasil, só se “acende” à noite e a intensidade da luz que emite varia com a idade e o tamanho do cogumelo.
No artigo científico na Science Advances, os investigadores apresentam o equivalente da oxiluciferina para os cogumelos e sugerem que, nestes fungos, a luciferase poderá misturar-se com diferentes moléculas, conseguindo assim alterar a intensidade e a cor da luz emitida. “A luciferase dos fungos pode ser ‘promíscua’, conseguindo interagir com múltiplos derivados da luciferina”, concluem os autores. Esta “promiscuidade” química poderá traduzir-se numa capacidade de mudanças na intensidade e mesmo da cor da luz emitida e que pode ser explorada no desenvolvimento de novas ferramentas em diversas áreas de investigação. É por isso que uma das imagens que acompanha este estudo mostra quatro cogumelos com cores diferentes. Porém, trata-se apenas de uma liberdade artística que pretende resumir uma das principais conclusões do estudo. Que fique claro que o brilho dos cogumelos fluorescentes que foram usados neste estudo só tem uma cor na natureza: verde.
A identificação e a caracterização dos mecanismos que fazem com que os organismos vivos brilhem têm sido importante para vários avanços em técnicas usadas, por exemplo, para estudos genéticos e trabalhos de biologia molecular em que é necessário recorrer a proteínas fluorescentes ou enzimas que interagem com substratos quimiluminescentes. “Estes resultados sugerem a utilidade da bioluminescência fúngica como um sistema modelo para a conversão contínua de energia química em emissão de luz”, referem os cientistas no artigo.
Um estudo anterior já tinha respondido à questão do porquê ou, mais precisamente, para que serve esta luz nos cogumelos. Segundo concluíram nesse trabalho que também se debruçou sobre o cogumelo flor-de-coco, a luz do fungo ajudava na sua reprodução, atraindo os insectos que depois espalham os seus esporos. Acendendo-se durante a noite, o fungo conseguia que os insectos pousassem nele e ajudassem no transporte dos seus microscópicos esporos que geralmente é feito à custa do vento. Uma vantagem, portanto.
Agora, os cientistas responderam ao “como” brilham estes impressionantes cogumelos armados em pirilampos.