Mensagem na garrafa da Confraria do Bacalhau deu à costa nas ilhas Aran
Já foi encontrada uma das 38 garrafas lançadas ao mar, a partir de um navio bacalhoeiro. Foi achada por uma jovem irlandesa, filha de um pescador, cujo barco foi construído em Sesimbra.
Na última terça-feira, Áine Ní Fhlaithearta estava já prestes a terminar a habitual caminhada na praia, na companhia de Lola, a cadela da família, quando, de repente deu de caras “com uma garrafa na areia”. “Quando a apanhei percebi logo que tinha uma mensagem lá dentro, com um símbolo de uma âncora”, relata a jovem irlandesa, residente em Inishmore, a maior das três ilhas de Aran. Resistiu à tentação de abrir a garrafa naquele mesmo instante. “Queria dividir o entusiasmo que estava a sentir com a minha mãe e a minha irmã”, relata Áine. O que estava lá dentro? Uma mensagem - escrita em português e em inglês - que transmitia “Ao mar e ao mundo, um simbólico e fraterno abraço da Confraria do Bacalhau”, um cumprimento que colheu a maior simpatia junto da jovem irlandesa.
Esta habitante de Inishmore, de 26 anos, terá sido a primeira pessoa a encontrar uma das 38 garrafas que a Confraria Gastronómica do Bacalhau, de Ílhavo, decidiu lançar ao mar a partir de um navio bacalhoeiro português, durante a sua rota Terra Nova-Aveiro, entre Outubro e Dezembro do ano passado. “Mal vi a mensagem entrei em contacto com a confraria para lhes dar nota do achado”, conta ainda Áine ao PÚBLICO, numa entrevista feita por e-mail. Nascida e criada num meio fortemente marcado pelas tradições marítimas, filha de pescador, fez questão de tentar perceber de “onde a garrafa teria sido lançada e há quanto tempo estaria no mar”.
A resposta da associação ilhavense não tardou a chegar e assim teve conhecimento que se tratava de uma mensagem oriunda de Portugal e de uma instituição que pretende homenagear a epopeia dos portugueses na pesca do bacalhau, Áine ficou sensibilizada. “Achei curioso porque o meu pai passou imenso tempo em Sesimbra, há alguns anos, enquanto a sua traineira Glór na dTonn estava a ser construída”, relata a jovem, rendida às felizes coincidências da vida. Prestes a iniciar um voluntariado na Escócia, na Corbenic Camphill Comunity – que trabalha junto de adultos com dificuldades de aprendizagem - Áine tenciona viajar até Portugal assim que seja possível. “Toda a gente da organização portuguesa tem sido muito simpática comigo desde que dei nota do achado e adoraria conhecê-los pessoalmente”, assegura, já depois de assinalar que é das poucas da sua família que não conhece o nosso país. “O meu pai viaja para Lisboa, todos os anos, em férias, e a minha irmã já passou três semanas em Cantanhede, numa experiência de trabalho”, testemunha.
Confraria quer trazer Áine a Ílhavo
No seio da Confraria Gastronómica do Bacalhau, a notícia vinda de Inishmore tem gerado grande satisfação e, também, alguma expectativa. “Ainda há 37 garrafas por localizar e aguardamos por outros contactos, de outros locais”, recorda João da Madalena, grão-mestre da confraria ilhavense. Atendendo a que todas as garrafas estão numeradas, tendo sido registado numa carta náutica o ponto e a data de onde cada uma delas foi lançada, a associação ilhavense sabe que a garrafa encontrada por Áine (número 23) foi lançada ao mar a 26 de Novembro, durante a navegação Bancos/Açores. Segundo as contas do confrade que registou e efectuou o lançamento das garrafas, um oficial da pesca do bacalhau – que aproveitou uma das suas habituais viagens à Terra Nova para levar avante a iniciativa -, esta garrafa terá “navegado” cerca “de 1400 milhas, ou seja 2600 quilómetros, o que, em três meses, faz uma média de 15 milhas/dia ou 28 km/dia”.
Todos estes registos poderão vir a ajudar em estudos ou investigações académicas posteriores. “Tanto a Universidade de Aveiro como o Ciemar (Centro de Investigação e Empreeendedorismo do Mar) manifestaram interesse em receber os nossos registos. Resta saber como e em que âmbito isto será utilizado”, revela João da Madalena, sem deixar de notar que “esta iniciativa poderá ser muito mais do que uma mera brincadeira”. “E também não é um acto de poluição”, acrescenta o grão-mestre, sem esconder que, na altura em que foi dada nota pública da acção, a confraria “foi confrontada com duas chamadas de atenção de pessoas que estavam preocupadas com a poluição no mar”. “Tivemos a oportunidade de lhes responder e explicar que isto foi feito com algum sentido e propósito”, faz questão de sublinhar.
Enquanto aguardam por mais contactos, de outras pessoas que possam encontrar uma das restantes garrafas, os confrades preparam-se para enviar para Inishmore uma lembrança. “Também gostávamos de trazer cá esta jovem ao Festival do Bacalhau, em Agosto. É algo que estamos a estudar”, afiança João da Madalena.