Porque se calam?
A Educação e o Ensino devem ser analisados na sua globalidade, sendo certo que nas universidades e politécnicos existem também alunos, professores, funcionários que merecem ser defendidos e apoiados.
É normal falarmos daquilo que se passa nas escolas básicas e secundárias, e de tempos em tempos, no ensino superior; ensino superior que, passe a ligeireza, mais parece um feudo. Afigura-se que a desgraça e os males estão no patamar inferior e, raras vezes, desconhece-se o estado da arte do que está acima. Fazem-nos acreditar que o ensino não superior está na mó de baixo, quando o criticam (sobretudo por parte de alguns sindicatos, mas também de quem opina publicamente) e o universitário (incluo o politécnico) está de boa saúde (talvez porque a atividade sindical é quase inexistente ou do conhecimento público e os cronistas não tenham muita aptidão para abordarem essas questões).
Há dias, vozes de personalidades com grande responsabilidade, falavam em “completa degradação”, referindo-se ao ensino universitário, acrescentando existirem professores que “recebem como salário cinco euros por hora”. Não tendo profundo conhecimento daquilo que se passa no privado, esta notícia deixou-me preocupado e estupefacto pois, a ser verdade (não li ou escutei qualquer desmentido por parte dos responsáveis), deve ser denunciado, já que se refere a “80% de professores” (cerca de 8.783). Se se fala, e bem, em precariedade na Educação, qual a palavra a aplicar para caracterizar esta situação?
Ao mesmo tempo, sabemos que há professores no ensino superior público, convidados, sem remuneração, o que para alguns será “normal”. Parece que as aulas - quase grátis! -, não são ministradas por peritos convidados, pertencentes a outras instituições e, muito menos, esporadicamente. Em sentido irónico, dá vontade de estabelecer um paralelo com a exploração dos estagiários não remunerados ou com ordenados baixíssimos, a fazer lembrar um certo mercantilismo…
Pergunto: existe, hoje, nas universidades e politécnicos, um regime de exploração de jovens docentes? Ainda que legalmente seja possível, eticamente é reprovável e inadmissível.
À população em geral, não parece ser nada normal o descrito, caso se confirme a veracidade do modus operandi. Mais parece trabalho precário, ou voluntariado forçado, que coloca mal as instituições, quer públicas quer privadas.
Contudo, fico ainda mais entristecido, quando constato que o ensino superior é quase intocável, e figuras conhecidas que sistematicamente denunciam, e bem, a precariedade/condições de trabalho/etc. dos professores das escolas básicas e secundárias, raramente ou mesmo nunca, têm uma palavra pública de estímulo para com os seus colegas, com quem se cruzam diariamente nas universidades e politécnicos, e de denúncia do que se passa com eles; condoem-se com as dores e tristezas dos outros, mas ignoram uma realidade bem conhecida, escondendo-se numa cumplicidade que os deveria envergonhar, uma vez que a integram.
O ensino superior é ainda muito fechado e a sua organização assiste à “degradação do setor”, facto apontado por vários responsáveis. É curioso que as dissertações de mestrado ou as teses de doutoramento ligadas à Educação e ao Ensino abordam, quase invariavelmente, temáticas relativas às escolas básicas e secundárias e, poucas vezes, assuntos relativos às universidades. Porque será?
Parece ter chegado o tempo de apontar o que está mal nas universidades e, já agora, refletir no que se tem feito nas escolas básicas e secundárias, para tentar melhorar; é inadmissível que se esteja constantemente a censurar o ensino não superior e os respetivos ministros, por tudo e por nada, independentemente do ensino superior estar acoplado ao Ministério da Educação, sem cuidar de acarinhar os excelentes profissionais que trabalham nas universidades e politécnicos. Porque são esquecidos?
A Educação e o Ensino devem ser analisados na sua globalidade, sendo certo que nas universidades e politécnicos existem também alunos, professores, funcionários que merecem ser defendidos e apoiados por todos, pois têm família, sentimentos e sensibilidade, direitos e deveres, nunca devendo ser esquecidos, sob pena de caírem na letargia de uma máquina que se encarregará de triturar o que já parece ser frágil.