Dezenas de soldados sírios mortos em raide da coligação anti-Daesh
Rússia fala em “erro de coordenadas, uma consequência directa da teimosia dos EUA em recusarem coordenar as suas acções contra os grupos terroristas na Síria”.
Num momento já tenso, com trocas de acusações e bombardeamentos a ameaçarem a trégua em vigor desde segunda-feira, um raide da coligação internacional liderada pelos Estados Unidos para combater os jihadistas atingiu as forças do regime sírio junto ao aeroporto de Deir Ezzor. Damasco fala em “62 mortos e uma centena de feridos”; o Observatório Sírio dos Direitos Humanos diz que morreram “pelo menos 80 soldados”.
O Exército dos EUA confirmou o raide, explicando que “o ataque aconteceu numa área que a coligação já tinha alvejado no passado”. As forças da coligação “acreditavam estar a atacar uma posição do Estado Islâmico” e o bombardeamento “foi interrompido”. A coligação, dizem ainda os militares americanos num comunicado, “não atacaria intencionalmente uma unidade militar síria conhecida”.
"A Síria é um teatro de operações complexo com diferentes forças militares e milícias que se encontram num perímetro próximo", continua a declaração. "A coligação vai averiguar as circunstâncias deste ataque e ver se podem ser retiradas lições", diz ainda o texto do comando americano para o Médio Oriente (Centcom).
Esta cidade, capital da província com o mesmo nome, no Leste da Síria, está toda rodeada por combatentes do Daesh, mas há bairros que se mantêm sob controlo do Exército fiel a Bashar al-Assad.
Segundo um comunicado do Exército russo, aliado de Damasco e presente no terreno, “aviões da coligação internacional antijihadista fizeram quatro ataques aéreos contra as forças sírias cercadas pelo grupo Estado Islâmico perto do aeródromo de Deir Ezzor”. Russos e sírios dizem que “62 soldados sírios foram mortos e uma centena ficaram feridos nestes ataques”.
Antes, numa declaração das Forças Armadas sírias, o regime acusava os Estados Unidos de “agressão séria e descarada” contra a Síria, oferecendo assim, segundo Damasco, “provas conclusivas” de que Washington e os seus aliados apoiam o grupo extremista.
Numa lista que os americanos tinham divulgado com os ataques do dia incluíam-se alguns raides em Deir Ezzor, nomeadamente contra “estradas que servem de reabastecimento” aos radicais.
O comando sírio diz ainda que as bombas atingiram soldados que se preparavam para enfrentar o Daesh e que os raides abriram caminho para que os fundamentalistas conseguissem reconquistar a sua posição em Jebel Tharda, perto do aeroporto.
“Se este ataque foi o resultado de um erro de coordenadas é uma consequência directa da teimosia dos EUA que recusam coordenar com a Rússia as suas acções contra os grupos terroristas na Síria”, afirma o Ministério da Defesa russo na mesma declaração.
Moscovo diz que os ataques, entre as 17h e as 17h50 locais, foram realizados por dois F-16 e dois A-10, que entraram no espaço aéreo sírio vindos do Iraque. O Observatório Sírio, que tem uma vasta rede de activistas no terreno e tenta manter uma contabilidade das vítimas, não foi capaz de identificar os aviões envolvidos.
De acordo com a trégua iniciada há quase uma semana na sequência de um acordo negociado pelos EUA e pela Rússia, após sete dias de “diminuição significativa da violência” americanos e russos deveriam estabelecer um centro de comando conjunto para começaram a coordenar os ataques contra o Daesh e a ex-Frente al-Nusra (actual Jabhat Fatah al-Sham). A violência diminuiu, de facto, bastante, e até sexta-feira nem houve registo de vítimas civis, quando o Observatório Sírio deu conta de bombardeamentos em duas localidades rebeldes (uma na província de Idlib, a outra na de Alepo) e da morte de duas crianças e um homem perto de Idlib.
O problema é que o acordo prevê ainda que seja levada ajuda humanitária a todos os que dela precisem e isso ainda não aconteceu – segundo a ONU, porque o regime não autoriza o transporte de alimentos e outros bens essenciais para as zonas da cidade de Alepo controladas pela oposição, onde 250 mil civis desesperam.
Os EUA insistem que “não porão a funcionar um centro de coordenação militar” se a ajuda urgente não chegar. A criação do centro tem de ser precedido de “sete dias consecutivos de redução do nível de violência e de acesso ininterrupto da ajuda humanitária”, afirmou Obama, citado pela Casa Branca, numa reunião da sua equipa de Segurança Nacional.