Jean-Loup Passek, o cinéfilo curioso

Cinemateca Portuguesa homenageia Jean-Loup Passek, em Setembro, com um ciclo de cinema a celebrar a curiosidade eclética do coleccionador francês e fundador do Museu de Cinema de Melgaço.

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O título do ciclo a Cinemateca foi buscá-lo a uma declaração pública de Passek: “Sou pela curiosidade total” Fernando Veludo/Arquivo

O que é que há de comum entre Vilarinho das Furnas (António Campos, 1971), Vale Abraão (Manoel de Oliveira, 1993), Morte em Veneza (Luchino Visconti, Itália, 1970), Foi uma Mulher que o Perdeu (Marcel Carné, França, 1939), Os Dez Mil Sóis (Ferenc Kosa, Hungria, 1967), Pássaros Selvagens (Alf Sjöberg, Suécia, 1955), ou Não Matarás (Krzysztof Kieslowski, Polónia, 1988)?...

A resposta vai poder ser encontrada na Cinemateca Portuguesa, em Lisboa, entre 9 e 30 de Setembro, num ciclo intitulado Pela curiosidade total – uma homenagem da instituição portuguesa a Jean-Loup Passek, historiador, crítico, programador e coleccionador de cinema, na passagem do seu 80.º aniversário.

O título deste ciclo a Cinemateca foi buscá-lo a uma das raras declarações públicas de Passek – “Sou pela curiosidade total” –, um programa de vida que este francês de “espírito eslavo e coração português” tem vindo a praticar desde que, no início da década de 1960, entrou nas edições Larousse, onde se ocupou do departamento de espectáculos (1963-85) e posteriormente dirigiu o prestigiado Dictionnaire du Cinéma (1986-2001). Do lado exclusivamente do cinema – e deixando de fora as suas experiências como crítico de música, escritor, editor… e explorador de um histórico carrossel no Jardim do Luxemburgo, ainda desenhado por Charles Garnier, o arquitecto da Ópera de Paris –, Passek tem o seu nome ligado aos festivais de La Rochelle (director, 1973-2001) e de Cannes (coordenador da Cámera d’Or, 1978-2002) e ao Centro Pompidou (responsável pelo sector de cinema, 1978-2001).

E foi na viragem do milénio, dando sequência a uma relação que se tornou cada vez mais afectiva desde que no final dos anos 60 conheceu trabalhadores imigrantes portugueses nas obras do metro de Paris, que então filmava como cineasta amador, que Passek se virou em definitivo para Portugal, privilegiando uma remota vila do Alto Minho, Melgaço, como sede de um museu onde decidiu depositar a sua valiosa colecção de memorabilia cinéfila.

Inaugurado em 2005, o Museu de Cinema de Melgaço Jean-Loup Passek acolhe cerca de meio milhão de fotografias de estúdio e de cena da história da Sétima Arte, bem como milhares de cartazes e uma bem documentada colecção de aparelhos e materiais que fazem a história do pré-cinema.

Uma sucessão de exposições tem vindo de desvendar, na última década, a importância deste acervo, e a mais recente, intitulada História sem palavras, é dedicada aos tempos do cinema mudo.

“É o museu improvável no lugar perfeito, pequeno por vocação, remoto por opção, a festejar um encontro com um território (nos precisos lugares em que esse encontro primeiramente se deu) e com pessoas concretas dentro dele”, escreve a Cinemateca Portuguesa no texto de apresentação do ciclo Pela curiosidade total.

Depois de no passado sábado a Câmara Municipal de Melgaço ter condecorado Jean-Loup Passek com a Medalha de Honra do concelho, cabe agora à Cinemateca, em parceria com aquele município, prolongar a homenagem de Portugal a uma personalidade a quem a comunidade do cinema tanto deve.

Serão 20 sessões, preenchidas com obras de outros tantos realizadores, que mostram bem o eclectismo – outro conceito programático da vida de Passek – da atenção do historiador francês. Cobre praticamente a história do cinematógrafo, vindo de um autor histórico do cinema soviético, Lev Kulechov (O Grande Consolador, 1933), até ao realizador do Bangladesh Tareque Masude (O Pássaro de Barro, 2002). Não esquece os dois portugueses por quem Passek sempre nutriu maior admiração – Manoel de Oliveira (Vale Abraão) e António Campos (Vilarinho das Furnas) –, e que ajudou a divulgar em França, entre La Rochelle e o Centro Pompidou. E vai abrir, na noite de 9 de Setembro, com outro clássico, Morte em Veneza, na presença de dois dos amigos mais próximos de Passek (que não poderá deslocar-se a Lisboa por se encontrar doente): o produtor e distribuidor Marin Karmitz e Bernard Despomadères, também um francês, igualmente rendido a Portugal, e que é seu adjunto na direcção do Museu de Cinema de Melgaço. 

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