Novas regras nas fidelizações deixam os consumidores "mais protegidos"

As alterações à lei das telecomunicações entraram em vigor neste domingo. A Deco e a Anacom garantem que os consumidores ficam a ganhar.

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A Deco recebeu cerca de 20 mil reclamações sobre telecomunicações no primeiro trimestre Patrícia Martins

Entre o aplauso da Deco e do regulador (Anacom) e as críticas dos operadores, as novas regras nas fidelizações nas telecomunicações entraram em vigor neste domingo. É um diploma que se presta “a interpretações dúbias” e tem “uma redacção que em nada irá contribuir para a salvaguarda dos interesses dos consumidores”, queixaram-se os operadores ao PÚBLICO aquando da promulgação da lei, em Junho.

É um diploma que garante “mais liberdade”, aos consumidores, introduz “maior razoabilidade e proporcionalidade” nas situações de compensação às empresas e dá “maior capacidade de intervenção” ao regulador (Anacom) em caso de diferendos, contrapõe o jurista da Deco Paulo Fonseca. “O legislador deu os instrumentos todos às empresas para protegerem os direitos dos consumidores, se a lei for cumprida”, disse ao PÚBLICO.

Já a Anacom assumiu, numa declaração enviada ao PÚBLICO, que terá maior capacidade de intervir em questões como as fidelizações e as rescisões contratuais e concorda que “a lei traz maior protecção aos consumidores”, assegurando-lhes mais liberdade de escolha e melhor informação.

A Deco, que no primeiro trimestre recebeu 20.088 reclamações sobre telecomunicações (menos 1186 que no mesmo período do ano passado), vai estar “muito atenta” ao cumprimento da lei e a quaisquer “comportamentos oportunistas” das empresas, frisou Paulo Fonseca.

Foi a petição de Deco (que reuniu 160 mil assinaturas) a pedir a redução do período máximo de fidelização de 24 meses que acabou por motivar a discussão do tema no Parlamento, no final do ano passado. O legislador deu resposta a “95% das preocupações” da associação, mas mesmo nos 5% que não resolveu (a redução do período máximo de fidelização), “encontrou uma alternativa que cumpre o objectivo de dar mais liberdade aos consumidores”. A partir de agora, para qualquer oferta que façam, as empresas têm de assegurar tarifários sem fidelização e com fidelizações de seis, 12 e 24 meses, e essas alternativas têm de constar, por exemplo, nos seus materiais publicitários.

Tão importante quanto assegurar a liberdade de escolha, foi a introdução de “balizas” à refidelização, sublinhou o especialista da Deco. Vão acabar “as situações em que o cliente, estando já perto do final do contrato, recebia uma chamada a oferecer mais um canal ou um upgrade da velocidade”. Era um tema sobre o qual “não havia regulamentação e que permitia às empresas irem eternizando” as fidelizações. Agora, excepcionalmente poderão estabelecer um novo período máximo de refidelização de 24 meses, mas cumulativamente é obrigatório que façam uma actualização dos equipamentos ou da infra-estrutura tecnológica. “Tem de ser, por exemplo, mais um telemóvel ou a passagem de um ADSL para fibra”, um novo canal ou uma actualização de software da box, não contam. E mesmo assim, tem de haver expressa aceitação do utilizador.

Paulo Fonseca sublinha que outra das vantagens da lei “é colocar o ónus da demonstração de que o consumidor foi informado da existência de uma fidelização no operador”, seja nas vendas porta a porta (com a assinatura de um documento) ou nas vendas ao telefone, onde as gravações passam a ter de ser conservadas durante todo o período do contrato e devem ser disponibilizadas se o cliente as pedir. Importante também é que a lei reforça as competências da Anacom nos conflitos entre clientes e empresas. O regulador pode, por exemplo, exigir às empresas que demonstrem qual a vantagem que dizem estar a atribuir aos utilizadores e que justifica a fidelização, e poderá sancioná-las, em caso de incumprimento. “A Anacom passa a poder ter mão pesada, mas o ideal é que as empresas cumpram a lei”, diz Paulo Fonseca.

O jurista da Deco assinala ainda as alterações às compensações por cessação antecipada dos contratos, um dos temas mais polémicos na relação entre operadores e clientes. As empresas deixam de poder exigir, como até agora, o pagamento das mensalidades em falta até ao fim do contrato e não vão poder cobrar mais do que os custos com a instalação do serviço. A partir deste domingo isso passa a ser válido para os novos contratos, mas não para aqueles já existentes e em que haja fidelização. Nesses, as empresas ainda podem fazer valer a prática antiga de cobrar as mensalidades, o que “tem a ver com a segurança jurídica dos contratos” e com a expectativa de receita que representam, explicou ao PÚBLICO. Mas, se houver uma alteração contratual introduzida pelas empresas, “os clientes já poderão invocar as novas regras” para rescindir os contratos.

Os operadores têm razão nas queixas que fazem? “É natural” que sejam críticos da lei, diz o especialista da Deco. Paulo Fonseca não reconhece as “incoerências e contradições insanáveis” que apontaram ao diploma, mas, quanto à queixa de que a lei é “susceptível de interpretações dúbias e incorrectas”, admite que há “alguns conceitos indeterminados”, ou seja, algo vagos, que podem proporcionar “leituras criativas” por parte das empresas. É o caso, por exemplo, dos termos “actualização da infra-estrutura” e “actualização do equipamento”, que são critérios sem os quais as empresas não podem justificar a introdução de um período adicional de fidelização, ou mesmo “o custo de instalação”.

A Deco diz compreender esta redacção “com a necessidade de acautelar um máximo de situações” e não produzir um texto demasiado rígido, que acabe por jogar a favor das empresas. Ainda assim, embora considere que, no geral, o diploma garante margem para “defender os direitos dos consumidores”, o jurista lança “um repto ao regulador” para que publique guias de actuação ou emita recomendações às empresas. “O desejável sempre é prevenir os conflitos”, afirmou.

 

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