Ricardo Gonçalves é o meu herói
O PS que saiu do congresso do Parque das Nações é um partido profundamente perigoso para o país.
“Lamento profundamente que a moção de António Costa seja muito radical, que esteja mais preocupada em justificar o actual governo do que em falar do futuro. O governo está legitimado na Assembleia e nos órgãos do partido. O que é preciso é tratar da coisa mais importante de todas: ou o país cresce ou não temos futuro. O PS prometeu que este ano Portugal ia crescer 2,6% e para o ano 3,1%. Últimos dados: este ano vamos crescer 1,2% e para o ano 1,3%. Regredimos perto de 10% com a crise e não conseguimos crescer? Este é o maior falhanço de um governo em Portugal depois do 25 de Abril.
“Não crescendo, não resolvemos o problema do emprego, não mantemos o Estado social e vamos ter pressões e sanções da União Europeia. O PS aí vai ter que optar: ou fica do lado da Europa e perde o apoio do PC e do Bloco, ou fica do lado do PC e do Bloco, entra em confronto com a Europa e faz uma bravata igual à do Syriza, que neste momento tem 17% nas sondagens. Ainda há pouco tempo o Syriza era o máximo, era extraordinário, e agora já não há quem o defenda no PS. A princípio, também era popular, como o PS está a ser, mas não fez o trabalho de casa. O PS tem poucos meses para fazer leis, tomar medidas e dar confiança aos investidores. Não é com um governo apoiado pelo Partido Comunista e pelo Bloco que alguém tem confiança para investir.
“Não é possível criar emprego com crescimentos abaixo de 2%. Obviamente que é fácil o PS desculpar-se com a crise internacional. Mas atenção: os outros países da Europa estão a crescer mais do que nós. Nós vamos crescer menos do que a União Europeia, menos do que a Zona Euro e menos do que cresceu o ano passado o governo de Passos Coelho. Mais: quando Passos Coelho se desculpava com a crise internacional, o PS dizia-lhe para fazer o trabalho de casa e parar de se desculpar. E agora vai o PS queixar-se da crise internacional?
“As desculpas que o PS apresenta são insustentáveis: ‘ah, não exportamos para Angola.’ Não exportamos para Angola porque o petróleo está barato. Mas se exportássemos para Angola tínhamos o petróleo caríssimo. A economia estava pior e seria impossível ter a carga de impostos que neste momento o petróleo tem. Pôr o petróleo barato e Angola a comprar, meus amigos, isso só se for mesmo uma vaca a voar – as duas coisas não são possíveis. É preciso explicar isto às pessoas. É melhor para a economia portuguesa ter o petróleo barato e não exportar para Angola do que ao contrário. Nós exportámos muitos anos para Angola e nunca crescemos. Entre 2001 e 2013 o nosso crescimento foi nulo. Entre o que subimos e o que caímos ficámos no zero. Perdemos mais de uma década. E grande parte desse tempo esteve o PS no governo.”
Nenhuma das palavras transcritas em cima é da minha autoria. Todas elas foram proferidas pelo antigo deputado socialista Ricardo Gonçalves no congresso do PS. Fixemos o seu nome, para que na hora do desastre saibamos homenagear quem, no momento certo, teve a coragem de remar contra a corrente. O PS que saiu do congresso do Parque das Nações não é apenas um partido muito mais à esquerda e muito mais eurocéptico – é um partido profundamente perigoso para o país. António Costa está a brincar com o fogo, e quem se vai queimar somos nós. Ricardo Gonçalves, tal como Francisco Assis, disse o que precisava de ser dito numa altura em que era difícil dizê-lo. Faço questão de que as suas palavras aqui fiquem registadas, para memória futura.