À moda antiga

Shane Black regressa ao género que o celebrizou com uma comédia policial como Hollywood parece ter deixado de fazer.

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Bons Rapazes: um filme que não se leva demasiado a sério

É impossível não simpatizar com a ideia de fazer, hoje, uma comédia policial “à moda antiga”, um bom velho buddy movie como aqueles a que o cinema americano nos habituou nos anos 1970 e 1980. Shane Black, realizador e co-argumentista de Bons Rapazes, tem experiência no género — escreveu Arma Mortífera (Richard Donner, 1987), A Fúria do Último Escuteiro (Tony Scott, 1991) e O Último Grande Herói (John McTiernan, 1993) e dirigiu o divertidíssimo Kiss Kiss Bang Bang (2005). E o seu novo filme não tem o mínimo prurido em aderir fielmente às regras do género: dois tipos, um detective privado de meia tigela e um gorila de aluguer, forçados a reunirem-se para resolver um mistério que literalmente lhes cai nos braços, com tanto de humor como de acção.

O equilíbrio comédia/acção pende aqui mais para o lado da comédia, o que é o grande trunfo do filme: há uma química natural e sem esforço entre Ryan Gosling (o detective de meia tigela) e Russell Crowe (o gorila), par tão improvável como inspirado. Com o “bónus” de Angourie Rice quase lhes “roubar” o filme no papel da filha pespineta do detective, que será decisiva na resolução do que começa por ser um caso de pessoa desaparecida e acaba como complexa teia de corrupção e pornografia na Los Angeles de 1977. Mas é por essa teia que Bons Rapazes “escorrega”: à medida que a trama se complica e vai enviesando, o filme começa a sentir-se na obrigação de ter de “fechar” as portas narrativas que foi abrindo e de se voltar a instalar no mais sisudo das regras de género.

É pena que assim seja, mas não é suficiente para diminuir o prazer de ver um filme que nem a si próprio se leva demasiado a sério, regresso ao “passado glorioso” de fitas como Dois Polícias à Solta ou 48 Horas. Mas será isso ainda possível, num sistema de produção polarizado entre as super-produções de efeitos especiais e o drama humano apontado aos Óscares? Financiado independentemente, Bons Rapazes quer estar por inteiro no “cinema do meio” de que Hollywood tinha o segredo mas do qual parece ter-se desinteressado há muito, e o próprio facto de ser ambientado nos anos 1970 parece sublinhar que Black não tem grandes ilusões quanto ao lugar que o seu filme pode ocupar hoje — como se a “batata frita” da Hollywood de há 30 anos não passasse hoje de uma raridade gourmet. Bons Rapazes merecia mais do que isso, mas se calhar também não se leva suficientemente a sério para o justificar.

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