Obama no Vietname para enterrar o passado, fazer negócio e avisar a China

Presidente dos EUA fica três dias no país e depois parte para a cimeira do G7, no Japão, onde vai também fazer um discurso em Hiroxima.

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O Presidente dos EUA à chegada a Hanói Carlos Barria/Reuters
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Obama é muito popular no Vietname Kham/Reuters
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Manifestação contra a poluição das águas em Hanói Kham/Reuters

Barack Obama inicia esta semana a sua primeira visita oficial ao Vietname, uma viagem que tem todos os condimentos para ser servida apenas como um acto simbólico da aproximação entre dois países que há pouco mais de quatro décadas travavam uma guerra sangrenta.

Mas esta visita à Ásia, que se estende também ao Japão, é muito mais do que isso – quando deixar a região, na próxima sexta-feira, o Presidente dos Estados Unidos terá deixado atrás de si um arsenal de setas apontadas ao músculo militar e ao domínio económico da China.

Com metade dos seus 90 milhões de habitantes abaixo dos 30 anos de idade, e após 20 anos de crescimento económico apesar da repressão num regime de partido único, o Vietname é hoje em dia um país virado para o futuro.

A guerra e as suas centenas de milhares de vítimas ainda estão bem presentes na memória de muitos, no Norte e no Sul do Vietname, e também nos EUA, mas a visita de um Presidente norte-americano é tudo menos uma novidade – antes de Obama, o país recebeu Bill Clinton, em Novembro do ano 2000, e George W. Bush, seis anos mais tarde.

"Não estou muito entusiasmado nem surpreendido. Há muitos líderes a visitar o Vietname hoje em dia. O Vietname não é um país pobre como no passado. Agora é mais normal", disse ao jornal USA Today Dinh Bao Khang, um contabilista de 29 anos de Ho Chi Minh, a antiga Saigão, capital do Sul anticomunista durante a guerra.

Apesar de tudo, a recepção vai ser calorosa, como se nota nas recordações à venda em muitas lojas do país com a figura do Presidente norte-americano, onde não faltam os icónicos posters da era "Yes We Can".

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LE QUANG NHAT/AFP

"É uma oportunidade para mostrarmos o nosso crescimento económico", disse ao mesmo jornal norte-americano Xuan Mai, uma estudante de 16 anos. "Acho que por causa do cinema o povo americano ainda pensa na guerra, ou que somos pobres. Quero mudar a perspectiva deles, esses estereótipos."

É, por isso, uma viagem em que o simbolismo fica mais para os comerciantes e para uma parte dos povos do que para as delegações oficiais dos dois países. Nas reuniões com o Presidente e com o primeiro-ministro do Vietname, mas principalmente com o verdeiro líder do país, o secretário-geral do Partido Comunista, Nguyen Phu Trong, os dois antigos inimigos vão tentar dar o passo definitivo para selar a aproximação – e com isso causar alguma irritação a Pequim.

No topo da agenda estão as relações comerciais entre os dois países através da Parceria Trans-Pacífico (TPP), um tratado que abre as portas de um mercado de 90 milhões de habitantes aos EUA, mas que vai também beneficiar muito o Vietname.

Com a deterioração das relações com a China, o Vietname aproveitou a boleia do pivô americano para a Ásia-Pacífico, pegou no crescimento económico dos últimos anos e espera agora colher muitos mais frutos com o TPP.

"Por cada mil milhões de dólares em exportações de têxteis e equipamento para os EUA vão ser criados cerca de 100 mil postos de trabalho. Essas exportações vão ultrapassar os 40 mil milhões de dólares em 2020", disse à Al Jazira Viet Tran, responsável pelo departamento de comunicação da empresa estatal Vinatex.

Em troca desta aproximação – que os EUA têm replicado noutros países da região e que entra em choque com a estratégia chinesa –, o Vietname espera receber finalmente a notícia do fim do embargo norte-americano à venda de armas. Este embargo já foi levantado em parte em 2014, para reforçar a capacidade de defesa marítima do Vietname, mas Hanói quer ver o fim definitivo daquele que é talvez o último vestígio da guerra nas relações entre os dois países.

A visita oficial de Obama só começa segunda-feira, mas o Presidente dos EUA chegou ao país este domingo, numa altura em que estarão a encerrar as mesas de voto para as eleições legislativas, onde a cada cinco anos os eleitores são chamados a escolher entre uma esmagadora maioria de candidatos escolhidos pelo partido. Desta vez, centenas de activistas tentaram inscrever os seus nomes nos boletins de voto, mas poucos passaram pelo crivo das autoridades.

Como mandam as regras diplomáticas, Obama vai encontrar-se com "representantes da sociedade civil" na terça-feira, antes de um discurso ao país nesse mesmo dia. Um discurso "muito centrado nas relações bilaterais, nas áreas de cooperação e na visão de futuro que ele tem para as relações entre os EUA e o Vietname", como avançou aos jornalistas Ben Rhodes, o vice-conselheiro de Obama para as comunicações estratégicas. "E, como é óbvio, sobre áreas em que há diferenças, que serão abordadas de forma respeitosa."

A visita do Presidente norte-americano ao Vietname termina quarta-feira em Ho Chi Minh – aí sim com uma carga simbólica muito forte, e com "uma homenagem às tradições culturais do Vietname".

Obama parte logo em seguida para a cidade de Shima, no Japão, que acolhe este ano a cimeira do G7, o grupo anteriormente conhecido como G8 antes de a Rússia ter anexado a península da Crimeia, em Março de 2014. Mais uma vez, os líderes das maiores economias vão discutir as melhores formas de promover o crescimento económico em todo o mundo e de combater as ideologias extremistas, mas a passagem do Presidente norte-americano pelo Japão vai ficar marcada por uma visita a Hiroxima.

Os detalhes ainda não são conhecidos, mas os serviços de imprensa da Casa Branca anteciparam que Barack Obama "terá a oportunidade de reflectir sobre o extraordinário custo humano da guerra e a perda de vidas inocentes na II Guerra Mundial – a perda de vidas inocentes em Hiroxima e Nagasáqui, mas também em muitos países do mundo".

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