Fotogalerias
Nascer, viver e morrer em Chernobil
Aos 90 anos, Shamyanok tem uma certeza: o segredo da longevidade é nunca sair do sítio onde se nasceu. Mesmo que esse sítio seja uma aldeia contaminada por um desastre nuclear.
São 6 da manhã e ouve-se o hino nacional da Ucrânia a tocar no rádio. Shamyanok levanta-se e acende o fogão antigo. Há 30 anos, no dia 26 de Abril, a antiga União Soviética acordou para aquele que se tornaria o pior desastre nuclear da história da humanidade. Quatro explosões num dos reactores da central nuclear de Chernobil lançaram uma nuvem radioactiva que se espalhou por vários países da Europa. Mais de 100 mil pessoas foram obrigadas a deixar as suas casas em zonas gravemente contaminadas ao longo da fronteira entre a Ucrânia e a Bielorrúsia.
Após o desastre nuclear, a vida de Shamyanok não mudou muito. A sua família continuou a comer fruta e legumes cultivados no quintal e a criar animais para ter leite, ovos e carne. Shamyanok tinha na altura 60 anos e vivia com a mulher na aldeia de Tulgovich, num dos extremos das zonas contaminadas da Ucrânia. Ambos recusaram ser realojados, ao contrário dos vizinhos, que com receio de adoecerem com os efeitos da radioactividade abandonaram o local.
Hoje, Shamyanok vive sozinho. Antes das refeições, bebe um pequeno copo de vodca para abrir o apetite. A mulher morreu e os filhos já não vivem na aldeia. Só ficou um neto. Duas vezes por semana, compra aquilo de que precisa através de uma carrinha que visita a aldeia. Aos sábados, a neta cozinha-lhe refeições para o resto da semana e limpa a casa. Recebe regularmente a visita de médicos: até agora não lhe foi diagnosticado qualquer problema de saúde.
Grande parte das casas da aldeia estão abandonadas. Shamyanok já não acredita que as pessoas possam voltar, pois aqueles que estariam dispostos a fazê-lo já morreram. “A minha irmã vivia aqui com o marido. Decidiram sair da aldeia e pouco depois já estavam debaixo da terra”, disse Shamyanok à Reuters. “Morreram de ansiedade. Eu não sou ansioso. Canto um bocado, dou uma volta ao quintal, não tenho pressa e vivo”.
Cerca de cinco mil pessoas contraíram cancro da tiróide depois das explosões de 1986. Em 2006, a Organização Mundial de Saúde (OMS) apelou à continuação da ajuda às vítimas do desastre nuclear de Chernobil, alertando para os milhares de casos de cancro e outras doenças registadas entre os sobreviventes.
Veja ainda: Voltar a Fukushima, como se nada tivesse acontecido