Fotografia
Quando o corpo deixa de obedecer
Um dia, ao apertar os botões da camisa, Giuseppe teve uma sensação inesperada: os seus dedos estavam fracos e respondiam com dificuldade aos comandos do seu cérebro. Maria Antonietta, por sua vez, começou por sentir um ligeiro torpor nos membros inferiores, um cansaço que a impedia de caminhar com a agilidade habitual. "Os Filhos de Steinert", Giuseppe, Maria Antonietta, Gabriella, Giulia e Roberto, têm em comum uma herança genética rara: distrofia muscular miotónica. Perda de força muscular, rigidez dos membros superiores e inferiores, desregulação do funcionamento gastro-intestinal, coronário e respiratório, problemas de visão (cataratas), são apenas alguns dos muitos sintomas da doença que afecta, em média, uma a cada oito mil pessoas no mundo. "A doença é tão pouco conhecida que entre a manifestação dos primeiros sintomas e o estabelecimento de um dignóstico correcto passam, em média, sete anos", disse ao P3 o italiano Luca Meola. O fotógrafo, cujo pai é médico e investigador de doenças neuromusculares, elaborou o projecto com o objectivo de compreender como a doença "afecta a vida sentimental dos pacientes, a sua capacidade de ter filhos ou educá-los ou de ter/manter um emprego". Maria Antonietta vive com o marido, que é também seu cuidador. Giuseppe vive ao cuidado da mãe e sonha encontrar uma namorada. Gabriella conheceu o actual parceiro numa rede social para pessoas com deficiência. Roberto foi deixado pela esposa após o diagnóstico e é, neste projecto, o único retratado cuja condição física lhe permite exercer uma profissão. A pequena Giulia sofre de uma variante congénita da distrofia miotónica (MC2). "A forma infantil desta doença apresenta um quadro clínico mais severo, acarreta problemas cognitivos significativos e uma taxa de mortalidade de 90% nos primeiros meses de vida", informa Meola. Foi em conjunto com a Fondazione Malattie Miotoniche, fundação italiana dedicada ao apoio da investigação de doenças neuromusculares, que Luca Meola desenvolveu o actual projecto. O autor não é estreante no P3, tendo publicado em 2015 a série de fotografias "L'Arène de Dakar", que pode ser revista aqui. Ana Marques Maia