Desesperadamente à procura de...

As ondas gravitacionais já cá cantam, depois de um século a tentar encontrá-las. É um dos itens de uma longa lista. Da desova das enguias ao “horizonte de eventos” [dos buracos negros, também conhecido como ponto de não retorno], eis outras 11 coisas que andarão algures – se as pudermos encontrar.

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REUTERS/NASA

Buracos negros

No coração da Via Láctea vive um objecto tão radical que desafia toda a tentativa de o descrever. Por uma simples razão: ninguém o consegue ver.

Temos praticamente a certeza de que algo de monstruoso está ali pela forma como as estrelas próximas rodopiam loucamente à sua volta, como se estivessem a orbitar à volta de um objecto que tem quatro milhões de vezes a massa do nosso Sol. Para a maioria dos cientistas, é sem dúvida um buraco negro. “Temos um caso incrivelmente consistente para sustentar isto, tendo em conta que não o podemos observar directamente”, diz Daniel Marrone, da Universidade do Arizona, nos EUA.

Os buracos negros são corpos tão densos e maciços que nada – nem mesmo a luz que os permitiria ver – consegue escapar à sua gravidade. A detecção de uma onda gravitacional em Fevereiro deste ano, que aparentemente ondulou a partir da colisão de dois buracos negros relativamente pequenos, é a última prova circunstancial de que eles são mais do que meros sonhos teóricos. “O sinal do LIGO [observatório nos EUA que detectou a onda gravitacional] parece ser um teste muito importante – talvez o melhor até agora – de que os buracos negros, ou algo muito parecido com eles, existem na natureza”, afirma Steve Giddings, da Universidade da Califórnia, Santa Barbara, EUA.

Isso é um problema. Os buracos negros emanam paradoxos flagrantes entre a teoria da relatividade geral e a teoria quântica, os dois pilares sobre os quais assenta a nossa compreensão da realidade física. Os modelos indicam que com o tempo os buracos negros se vão evaporando até se tornarem em nada, libertando um tipo de emissão conhecido como “radiação de Hawking”. Mas o que acontece à matéria e à luz que engoliram e sobretudo a qualquer informação que contêm? “Não parece haver uma história totalmente consistente sobre como eles conseguem fazer isso sem alterar alguns dos nossos princípios físicos mais básicos”, adianta Giddings.

Marrone está envolvido num projecto que tem como objectivo ajudar a esclarecer as coisas. O Event Horizon Telescope (Telescópio Horizonte de Eventos) é uma rede mundial de telescópios que estará a funcionar em pleno em 2017. O seu objectivo é encontrá-los. Se o que vir for consistente com um buraco negro, características como a distorção da luz dar-nos-ão pistas sobre o funcionamento interno de um buraco negro – e se estaremos realmente a olhar para destruidores negros da teoria. Richard Webb

O primeiro antepassado darwiniano

No princípio era o Ida, o primeiro antepassado darwiniano – ou seja, o primeiro material inerte da Terra que se transformou em não inerte. Ida gerou Luca, a sigla em inglês do último antepassado comum universal, que era uma molécula que armazenou toda a informação como código genético e deu origem a toda a vida na Terra.

Ida e Luca continuam a viver entre nós. Todas as nossas células usam o código genético incorporado no ADN, sugerindo que o próprio Luca era composto por ADN. Só que não é assim tão simples. Todas as formas de vida utilizam proteínas para formar o ADN e executar o seu código – mas as próprias proteínas são feitas a partir do ADN. Qual deles apareceu primeiro?

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Provavelmente, nenhum deles. O ARN é um parente próximo do ADN que se encontra em todas as células vivas, que também transporta um código genético e, o que é crucial, consegue catalisar reacções químicas sozinho. A hipótese do “ARN mundial” diz que o Luca nasceu de uma sopa de ARN que acabou por dar origem ao ADN e às primeiras células.

Mas de onde apareceu o ARN? Na década de 1950, os químicos norte-americanos Stanley Miller e Harold Urey fizeram a experiência famosa de misturar gases e água com electricidade e acabaram com um punhado de moléculas bióticas. Mas, actualmente, estão em voga ideias com mais nuances. Nick Lane, do University College de Londres, por exemplo, sustenta que fontes hidrotermais no fundo do mar que emitem fluidos quentes forneceram um caldo de metano, minerais e água a partir do qual se formou o ARN. Entretanto, Michael Yarus, da Universidade do Colorado, em Boulder (EUA), defende antes a ideia de um lago lamacento cujo congelamento e descongelamento contínuo juntou os elementos químicos da forma certa.

É intrigante que as investigações mais recentes sobre a origem do ARN mostrem que, quando a química se dá da forma correcta, muitos destes tijolos de vida parecem criar-se espontaneamente – aumentando a probabilidade de isso acontecer também noutro sítio. Catherine Brahic

A nuvem de Oort

Está em todos os manuais de astronomia: a nuvem esférica constituída por milhares de milhões de pedaços de rochas e gelo que forma a fronteira mais longínqua do sistema solar. O extremo mais distante da nuvem de Oort pode estar 100 mil vezes mais longe do Sol do que a Terra e a mais de um terço do caminho até ao vizinho estelar mais próximo, a Proxima Centauri.

Mas um habitante da nuvem de Oort dos manuais é demasiado pequeno para que o possamos observar e vive na escuridão quase total. “A essa distância, o Sol parece tão pequeno que podemos tapá-lo completamente com a cabeça de um alfinete”, diz Mike Brown, do Caltech (Instituto de Tecnologia da Califórnia). A única prova, circunstancial, da sua existência é a passagem ocasional de um cometa com um “período longo” – presumivelmente, um objecto da nuvem de Oort lançado na nossa direcção pelas perturbações gravitacionais de outras estrelas.

Pensa-se que os objectos da nuvem de Oort são restos da formação de planetas, e a sua distribuição e o seu tamanho poderão ajudar-nos a compreender esse processo. Uma das ideias para os localizar envolve uma técnica utilizada pelos caçadores de exoplanetas: detectar uma redução da luz da estrela quando um planeta em órbita faz um “trânsito” à frente do disco estelar. Em 2009, Eran Ofek, do Caltech, e Ehud Nakar, da Universidade de Telavive, em Israel, mostraram que o telescópio espacial Kepler então recentemente lançado poderia, teoricamente, detectar os objectos da nuvem de Oort com poucas dezenas de quilómetros de diâmetro ao passaram à frente de uma estrela.

Na prática, uma fugaz redução do brilho da estrela poderia apenas ser uma falha no detector – e, além disso, o Kepler estava a apontar para cima do plano do sistema solar, longe da concentração mais densa de objectos. Mas um fluxo constante de novos cometas, como o ISON, que se partiu em Dezembro de 2013 quando se aproximou mais do Sol, é suficientemente bom para a maioria dos astrónomos. “Podemos estar bastante confiantes de que a nuvem de Oort existe, mesmo que nunca tenhamos recebido a imagem de um objecto”, diz Scott Sheppard, da Instituição Carnegie para a Ciência, em Washington DC. Stuart Clark

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O lugar da consciência

A consciência parece um fenómeno que está sempre a ser ligado e desligado: ou estamos a sentir o mundo ou não estamos. Mas encontrar o interruptor que permite ao nosso cérebro movimentar-se entre estes dois estados não é fácil.

“A consciência não é algo que possamos ver, é algo através da qual nós vemos, o que torna o seu estudo um desafio”, comenta George Mashour, director do Centro para a Ciência da Consciência da Universidade do Michigan, em Ann Arbor (EUA).

Uma das definições comuns de consciência é “a coisa que nos abandona quando caímos num sono sem sonhos e que regressa quando acordamos”. Mas suponha o leitor que o anestesiamos: poderá ouvir a minha voz e não lhe responder; poderá estar a sonhar e não ouvir a minha voz; ou poderá não estar a ouvir nem sentir nada. Que padrões da actividade cerebral se co-relacionam com estes níveis de experiência consciente?

Sabemos que certas regiões do cérebro podem causar perda de consciência se forem lesadas ou estimuladas. O claustro – uma finíssima estrutura enterrada dentro do cérebro – é uma delas. Mas muitas das teorias que tentam descrever a consciência afastam-se da hipótese de haver um único local anatómico onde ela repouse.

A maioria aposta na ideia de que a informação que chega do mundo exterior luta por atenção. Só nos tornamos conscientes de uma coisa – por exemplo, um telefone a tocar – se ela superar tudo o resto que possa ser emitido através do cérebro.

Depois, há a teoria da informação integrada, que sugere que a consciência é o resultado da combinação de informação para que esta se torne mais do que a soma das suas partes. “A perda de consciência não precisa necessariamente de ser mediada por regiões do cérebro que são apagadas ou suprimidas, mas antes por uma quebra na comunicação”, diz Mashour.

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Um estudo recente que monitorizou a actividade cerebral dos participantes enquanto eram lentamente anestesiados parece sustentar este quadro. Pode também explicar como uma substância chamada “cetamina” “apaga” as pessoas: este potente tranquilizante aumenta a actividade em regiões do cérebro responsáveis pela vigília, mas apaga as comunicações entre diferentes regiões. Linda Geddes

Bolas de gluões

Se quiser um sabre de luz que realmente funcione, tente um formado por bolas de gluões – partículas formadas apenas por força. Só há um problema. Apesar de os teóricos estarem de acordo de que as bolas de gluões têm de existir, os investigadores que conduzem as experiências estão igualmente de acordo em que será improvável conseguirmos prová-lo. “Não é possível fazer uma experiência e ficarmos a saber que elas existem”, diz Frank Close, da Universidade de Oxford, no Reino Unido.

As bolas de gluões são pacotes de gluões, partículas que transmitem a força nuclear forte entre os quarks, juntando-os em coisas como protões e neutrões dentro dos núcleos atómicos. Os gluões têm uma estranha característica: eles próprios possuem uma carga de força forte, o que significa que conseguem colar-se uns aos outros.

As simulações de um mundo repleto de gluões sugerem que uma energia de cerca de 1500 megaelectrões-volt (MeV), ou cerca de uma vez e meia a energia contida num protão, deve ser suficiente para juntar toda essa carga numa bola de gluões. Em 1995, Frank Close e teórico Claude Amsler, da Universidade de Zurique, na Suíça, mostraram que a “ressonância” de duas partículas com energias de 1370 e 1500 MeV, que tinham acabado de ser descobertas no CERN [Laboratório Europeu de Física de Partículas], podia encaixar-se nesse modelo. Desde então juntou-se uma terceira candidata, com 1710 MeV.

Mas sabe-se que é muito difícil fazer cálculos com a força forte e, a bem da simplicidade, as simulações sobre as bolas de gluões tendem a assumir um mundo com toda uma carga de gluões e nada mais. “O universo real não é assim”, afirma Close. “Se as coisas se puderem misturar, é o que irão fazer.”

Por isso, no universo real, quando finalmente se conseguir medir o estado de uma bola de gluões, os quarks terão começado a colar-se a ela como borbotos a uma meia, tornando impossível provar que alguma vez chegou a ser uma bola de gluões pura.

A explicação para aquelas três ressonâncias sugestivas é muito provavelmente um enorme frasco de cola contaminado por quantidades variáveis de diferentes quarks, diz Close – e, por agora, teremos de nos contentar com esta ambiguidade. “Se a natureza for bondosa, talvez alguma coisa se destaque”, afirma. “Mas não estou optimista.” Talvez seja melhor contentarmo-nos com um sabre de luz convencional. Richard Webb

Receptores magnéticos

Ken Lohmann estava sossegado à espera, enquanto as crias emergiam dos seus ovos numa praia da Florida. Depois, pegou em 32 tartarugas minúsculas e levou-as para uma sala escura onde estava um tanque com água rodeado de bobinas electromagnéticas. Vestiu as suas presas, uma a uma, com arreios de licra, depois accionou os ímanes.

A experiência seminal de Lohmann em 1991 confirmou o que muitos suspeitavam: as tartarugas sentem os campos magnéticos, e estes fazem-nas alterar a direcção do seu nado. De que outra forma, senão através da percepção do campo magnético da Terra, conseguiriam elas navegar no oceano? Espécies tão variadas como ratinhos, lagostas ou moscas da fruta parecem ter capacidades semelhantes – e, no entanto, ninguém consegue encontrar o seu receptor magnético, o mecanismo biológico que lhes permite fazer isso.

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Do ponto de vista cerebral, temos algumas pistas. Em 2009, os neurocientistas David Dickman e Le-Qing Wu, da Faculdade de Medicina Baylor em Houston, Texas (EUA), captaram imagens dos cérebros de pombos enquanto mudavam o ângulo de um campo magnético. Observaram mudanças nas emissões de 53 pares de neurónios enquanto o ângulo era alterado. Mas de onde lhes eram enviados esses sinais? “Não existe um órgão óbvio, como um ouvido ou um nariz”, afirma Peter Hore, da Universidade de Oxford, no Reino Unido.

Um dos suspeitos é a criptocromo, uma proteína encontrada nos olhos de muitos animais, incluindo aves e trutas. Sabe-se que produz fragmentos de substâncias químicas chamadas “radicais”, de forma que está dependente dos campos magnéticos. E as moscas da fruta que sofrem uma alteração no gene que produz a criptocromo deixam de responder aos ímanes.

Mas a história não pode terminar aqui. Para começar, os nossos olhos também têm criptocromos e nós não conseguimos sentir o magnetismo. E também não sabemos como é que os radicais emitem o sinal que o cérebro consegue interpretar.

No ano passado, Xie Can, da Universidade de Pequim, descobriu uma proteína sensível ao magnetismo que pode controlar as células nervosas e musculares. Será que esta pode ser uma nova candidata? “Duvido de que esteja totalmente enganado”, diz Hore, que afirma ter visto em laboratório as partículas da proteína a girar quando um íman se aproximou. Mas esta é uma das áreas onde ainda estamos um bocadinho perdidos. Joshua Howgego

Ondas gravitacionais primordiais

Quando o champanhe fica um século no frigorífico, as rolhas fazem ainda mais barulho ao saltar. Foi assim em Fevereiro deste ano, quando os físicos do Advanced LIGO anunciaram a detecção de uma onda gravitacional a atravessar a Terra. Sem dúvida de que isto foi uma vitória – mas e aquelas que escaparam?

As ondas gravitacionais são ondulações no tecido do Universo, criadas quando objectos gigantescos se movem e aceleram nos campos gravitacionais uns dos outros. O que o Advanced LIGO captou emanou de dois buracos negros, cada um com cerca de 30 vezes a massa do nosso sol, quando caíram nos braços um do outro há 1300 milhões de anos-luz de distância de nós.

Mas as fusões de buracos negros ainda maiores, como os supermaciços que se pensa formarem o centro de galáxias já com maturidade, produzirão ondas gravitacionais com maior comprimento de onda. “O LIGO não será sensível a elas”, diz o astrónomo Avi Loeb, da Universidade de Harvard. “Precisamos de observatórios diferentes.”

Um detector espacial que está a ser projectado, conhecido como eLISA, deverá ser sensível a esses comprimentos de onda. E em Dezembro do ano passado foi lançada uma sonda, a LISA Pathfinder, que será um teste a este projecto. Mas nem mesmo a eLISA conseguirá detectar as ondas gravitacionais mais ansiosamente procuradas. O nosso modelo mais convincente sobre o nascimento do Universo com o Big Bang, mas que ainda não testado, sugere que o espaço-tempo passou por um período de expansão, conhecido como inflação, enviando ondas gravitacionais de uma frequência extremamente fraca, mas com comprimentos de onda talvez tão grandes quanto o Universo “visível”.

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VIVEK PRAKASH/reuters

Ainda não há um detector que seja suficientemente grande para detectar estas ondas gravitacionais “primordiais”, por isso as provas serão indirectas. Em Março de 2014, investigadores da experiência BICEP2, no pólo Sul, pensaram tê-las encontrado em padrões da polarização da radiação cósmica de fundo, uma radiação em forma de microondas que é uma relíquia do Big Bang. Isso acabou por ser um falso alarme, mas a detecção em Fevereiro último dá novo alento para pensar que poderemos vir a detectar esses ecos da criação, considera Loeb. “Abre uma nova janela para o Universo.” Richard Webb

A baleia 52

Tornou-se famosa como a baleia mais solitária do mundo. Nada pelo Pacífico chamando os outros, mas nunca obtém resposta. A baleia 52 é única, com uma cantiga única, só dela – ou, pelo menos, é essa a história.

Na verdade, ele – são as baleias macho que cantam, por isso é quase certo que é um ele – poderá não estar sozinho. “Provavelmente, há mais do que um”, afirma John Hildebrand, do Laboratório de Acústica de Baleias do Scripps em San Diego, na Califórnia, cuja equipa gravou durante algumas horas este chamamento peculiar, com hidrofones distantes uns dos ouros.

Quando o canto invulgar da baleia 52 foi pela primeira vez ouvido pelo biólogo Bill Watkins, em 1989, o animal cantava a 52 kilohertz, mas gradualmente baixou aos 47 kHz. Os seus movimentos sazonais eram semelhantes aos da baleia-azul, e Watkins propôs que este fosse um híbrido entre uma baleia-azul e a baleia-comum. Hildebrand acha que é filho de uma mãe baleia-azul e de um pai baleia-comum. As baleias-comuns são como bateristas, cantando em cadências curtas, explica. Já as baleias-azuis são cantoras de ópera, segurando a nota. O canto da baleia 52 é uma mistura. “Culturalmente, é como o da baleia-azul”, diz Hildebrand.

No ano passado, uma expedição preliminar de um projecto destinado a filmar a baleia 52 acabou em nada. A rede de hidrofones do laboratório acústico não está ligada à costa, e quando as gravações voltaram para terra para serem analisadas, os animais que detectaram já tinham desaparecido há muito. Uma rede de monitorização em directo ao largo de Santa Barbara propunha-se a ajudar a acabar com a matança das baleias por barcos, aumentando consideravelmente as hipóteses de descobrir este misterioso animal – ou animais.

Se houver apenas um, será justo descrevê-lo como solitário? A estrela pop Taylor Swift levantou a questão numa entrevista em 2014. “Toda a gente tem imensa pena desta baleia – e se ela se está a divertir à grande?”, perguntou.

Pensa-se que as baleias machos cantam sobretudo para atrair as fêmeas, mas para as baleias o acasalamento não é uma camaradagem. Posto isto, a baleia 52 poderá muito bem ficar frustrada com a sua falta de êxito. Talvez ele seja mesmo a baleia macho mais excitada do mundo. Michael Le Page

A desova das enguias

Aristóteles pensava que elas vinham das minhocas. Outros acharam que eram de geração espontânea. Até agora, ninguém sabe realmente onde são feitas as enguias. E, no entanto, as enguias existem – aos montes.

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Swinburne Astronomy Productions

É assim que a história é normalmente contada: as enguias americanas e europeias nadam ao longo de milhares de quilómetros para desovar no mar dos Sargaços, uma extensão gigante de água no Atlântico ocidental, perto das Bermudas, morna e salgada. Os novos meixões [enguias bebés] contorcem-se e nadam até ao ponto de partida.

Mas esta missão extraordinária é apenas uma questão de inferência, registada pela primeira vez pelo investigador dinamarquês Johannes Schmidt, depois de várias expedições ao mar dos Sargaços, há um século. Nunca foram vistas enguias adultas a desovar ali. Até muito recentemente, nem sequer tinha sido avistada qualquer enguia adulta a dirigir-se para lá. “A sua migração continua a ser um mistério total”, afirma Melanie Beguer-Pon, da Universidade de Laval, no Quebeque, Canadá. Mas tem de haver alguma veracidade na história do mar dos Sargaços, diz Håkan Wickström, do Instituto de Investigação da Água Doce, em Drottningholm, na Suécia. “Elas devem desovar ali porque encontramos lá larvas de enguias minúsculas.”

Isto é muito mais do que uma questão de curiosidade académica. Nas últimas décadas, as enguias europeias e americanas têm estado em declínio rápido, e agora são consideradas animais em risco. Poluição, diques que bloqueiam rios, a pesca e o aquecimento da água do mar são todos culpados – embora isso não explique o elevado número de enguias que voltaram aos rios europeus em 2009.

Na última tentativa de resolver o mistério da desova, cientistas dos dois lados do Atlântico decidiram equipar enguias prateadas, que já são maduras [sexualmente], com pequeníssimos detectores de microondas que ao fim de seis meses se ejectam e vão para a superfície da água, transmitindo os seus dados a satélites próximos. Inicialmente, não havia um pio sequer – até que, em 2014, uma enguia da Nova Escócia foi detectada a 2400 quilómetros de distância do limite norte do mar dos Sargaços. Como prova, não é nada de especial.

Nenhuma das enguias europeias marcadas na Suécia enviou qualquer informação para além dos Açores, a menos de meio caminho dos Sargaços. E, até que os cientistas consigam detectar uma única enguia que seja no momento da desova, qualquer prenúncio de compreensão destes seres escorregadios não passará de uma história de pescadores. Fred Pearce

O elo perdido chimpanzés-humanos

É incrível como se encontram fósseis todos os anos, mas ainda não conseguimos escavar da terra o “elo perdido”. Onde está o último antepassado comum de humanos e chimpanzés? “Eu adoraria saber”, afirma Sergio Almécija, da Universidade George Washington, em Washington DC. “Essa pergunta não me deixa dormir à noite.”

Temos uma ideia relativamente clara de quando e onde esta criatura andava a arrastar-se ou a baloiçar-se nas árvores: em África, há cerca de sete milhões de anos. Mas as provas fósseis serão muito, muito difíceis de encontrar. Depois de décadas de buscas, temos uma colecção relativamente rica de fósseis dos nossos antepassados hominíneos [depois da separação do ramo dos chimpanzés] de há quatro milhões de anos, mas pouco mais do que uma caixa de sapatos com linhagens anteriores.

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Há muitas razões para isto, afirma Nathan Young, da Universidade da Califórnia, em São Francisco. “Os [fósseis de] hominíneos são comparativamente mais abundantes por terem vivido em regiões onde mais facilmente fossilizam, como nas margens de lagos e grutas, e há muito mais pessoas à procura deles.”

Ajudaria se soubéssemos exactamente o que procurar. Ao comparar os fósseis dos primeiros hominíneos com os dos chimpanzés e um grande número de primatas, Almécija acha que os nossos antepassados tinham mãos e ossos da coxa mais parecidos com os dos humanos do que com os dos chimpanzés. Provavelmente ainda andariam com os quatro membros, adianta, mas não da mesma forma que andam os chimpanzés. Young e os colegas utilizaram uma abordagem semelhante para concluir que os ombros seriam mais como os dos chimpanzés – sugerindo que se balançavam pelas árvores como estes fazem actualmente.

Espera-se que a comparação dos genomas dos símios actuais possa fornecer provas com as quais todos concordem. Mas isto parte do princípio de que há um único antepassado. Os estudos genéticos indicam que alguns dos nossos cromossomas divergiram dos dos chimpanzés muito mais cedo do que outros, indicando que provavelmente populações parecidas com os primatas estiveram separadas durante um tempo, voltaram a juntar-se e misturaram-se, para depois se separarem permanentemente – tudo isto no decorrer de milhões de anos. Tentem lá apontar para um único antepassado no meio desta confusão. Colin Barras

Infinito

Criámos um monstro com o infinito. As nossas mentes exigem que exista – para depois rapidamente derreterem face às consequências de um conceito como este, que é, por definição, demasiado grande para os nossos cérebros.

O prazer da dor começa quando começamos a escrever todos os números: 1, 2, 3, 4... Não há nenhum fim óbvio para esta sequência – por isso chamamo-la infinita. Mas então pensemos nos números reais: os números inteiros, mais os números racionais e irracionais entre eles (1, 5, Pi, a raiz quadrada de dois e por aí fora). Também há infinitamente muitos números deste tipo – com a diferença que podemos demonstrar que esta infinidade resulta num número maior. “Na verdade, há um conjunto infinito de infinidades e, independentemente de quão longe se vai, poderemos sempre chegar a um maior”, explica o matemático Ian Stewart, da Universidade de Warwick, no Reino Unido.

Muito pouco da matemática funciona suavemente sem a manipulação do infinito e do seu anverso infinitesimal. Definir um círculo perfeito requere os dígitos infinitos de Pi [3,14…]; calcular movimentos suaves obriga a partir infinitamente o tempo em pequenos blocos.

Mas será que alguma destas coisas é de facto real? Por exemplo, os números inteiros: nunca poderíamos realmente escrevê-los todos. “Apagávamo-nos antes disso”, afirma Stewart. Mesmo que outra pessoa nos viesse substituir, num Universo finito, não seria possível compilá-los.

Estas considerações práticas significam que geralmente os físicos vêem o infinito como uma coisa a evitar – apesar de frequentemente isso ser mais fácil de dizer do que fazer. A teoria do Big Bang, por exemplo, sugere que o Universo começou como uma “singularidade” de uma densidade e temperatura infinitas, mas a descrição matemática cai por terra quando se coloca demasiada gravidade num espaço demasiado pequeno. Substituições como a “teoria das cordas”, que pretende aproximar-nos disso, frequentemente evoca uma infinidade de universos, tornando impossível sabermos por que é que o nosso funciona como funciona.

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REUTERS/University of Alaska Fairbanks/Russ Hopcroft

Uma minoria de físicos e matemáticos foge completamente do infinito, argumentando que não tem lugar num Universo finito. Para a maioria das pessoas, isto será ir longe de mais, afirma Stewart, mas provavelmente é um conceito para o qual não vamos querer ficar especados a olhar. “O infinito é incrivelmente útil, mas só se tivermos a certeza de que não nos rebenta na cara”, diz. Richard Webb

Exclusivo PÚBLICO/New Scientist

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Pormenor no túmulo do faraó Ramsés II corbis
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