Que a British Library proteja o punk!
A exposição Punk 1976-1978 integra o programa Punk.London. Indignado com estas celebrações institucionais do movimento, Joe Corré, filho do manager dos Sex Pistols e de Vivienne Westwood, ameaça queimar a sua colecção de memorabilia punk.
Quando lançaram o movimento punk na Grã-Bretanha, em meados dos anos 1970, disparando para todos os lados, da família real aos políticos, da indústria musical ao consumismo, bandas como os Sex Pistols, os Damned, os Adverts ou os Buzzcocks dificilmente imaginariam que o pandemónio que ajudaram a criar há 40 anos iria ser celebrado na institucionalíssima British Library. Em Maio, a biblioteca nacional britânica vai mostrar, na exposição Punk 1976-1978, os muitos materiais relacionados com a emergência do punk que foi coleccionando ao longo das últimas décadas.
Discos, revistas, fanzines, entrevistas radiofónicas, fotografias, vídeos, cartazes de concertos e digressões são alguns dos materiais compilados pela biblioteca, que para esta exposição conseguiu ainda alguns empréstimos importantes, incluindo um raríssimo exemplar de uma gravação que não chegou ao mercado de God Save the Queen, a canção que os Sex Pistols lançaram em 1977, e que atingiu o topo das listas de discos mais vendidos no ano em que se comemorava o jubileu de Isabel II.
Outro núcleo forte da exposição, centrada na primeira vaga punk, e comissariada pelo responsável do departamento de música pop da British Library, Andy Linehan, é o das roupas, que mostra algumas peças originais da célebre loja Sex, de Chelsea, gerida por Vivienne Westwood e pelo músico, empresário, artista visual e estilista Malcolm McLaren, manager dos Sex Pistols. As suas t-shirts com fotografias de mamas ou com dois cowboys nus da cintura para baixo (descontadas as botas) tornaram-se ícones do movimento.
Linehan era um adolescente em 1976 e viveu de perto a explosão do movimento punk. “Gostava de poder dizer que estive todas as noites no clube Roxy – não estive –, mas foi um tempo muito excitante”, disse o comissário da exposição ao jornal britânico The Guardian. Uma das peças em exibição é justamente um programa mensal do Roxy, o clube de Covent Garden onde iam todos os que queriam ver bandas punk ao vivo. O menu é impressionante: só em Março de 1977, e para citar apenas alguns dos grupos mais conhecidos, o Roxy apresentou os Siouxsee and the Banshees, X-Ray Spex (autores do clássico Germfree adolescents), Chelsea, Jam, Adverts , Stranglers ou Eater, uma banda londrina que tinha um baterista de 14 anos com o nome artístico Dee Generator.
A exposição integra-se no programa Punk. London, que se propõe celebrar a história do movimento com várias iniciativas distribuídas ao longo deste ano. O paradoxo de uma comemoração do punk apoiada por instituições e fundos públicos não escapou ao filho de Malcolm McLaren (1946-2010) e Vivienne Westwood, o criador de moda Joe Corré, criador da marca Agent Provocateur, que não se limitou a acolher com um sorriso a óbvia ironia da coisa. Resolveu indignar-se e ameaça queimar a sua própria colecção de memorabilia punk, especialmente forte na secção da roupa, que a imprensa britânica diz valer mais de seis milhões de euros.
O que mais enfureceu Corré foram os boatos de que a própria rainha Isabel II estaria a apoiar Punk. London, e que o palácio de Buckingham já teria contactado Vivienne Westwood, ela própria uma figura um tanto paradoxal, na sua dupla condição de criadora de moda punk e Dama do Império Britânico.
“A rainha a dar a sua bênção a 2016, ano punk é a coisa mais assustadora que já ouvi”, diz Corré. “Em vez de um movimento pela mudança, o punk tornou-se uma peça de museu”, observa, aparentemente sem lhe ocorrer que a sua condição de coleccionador torna o lamento um pouco desconcertante.
Corré marcou o seu auto de fé para o dia 26 de Novembro, de modo a coincidir com o 40.º aniversário do lançamento do single Anarchy in the UK, dos Sex Pistols. E talvez, sugerirão os mais cépticos, para lhe dar tempo para mudar de ideias.