Portugal desconhece norma que inviabiliza candidatura a secretário-executivo da CPLP
Regra de 1996 não é recordada por todos os intervenientes. O primeiro secretário executivo, o angolano Marcolino Moco, diz que só agora ouviu falar de tal disposição.
Fontes diplomáticas não confirmam a existência de uma norma que inviabiliza a candidatura de Portugal ao cargo de secretário-executivo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), por Lisboa albergar a sede da organização. O actual secretário-executivo da organização, Murade Murargy, afirmou esta segunda-feira à Lusa que "houve um acordo de cavalheiros" para que o país que acolhe a sede (Portugal) não assuma o secretariado executivo. Tal posição não foi confirmada pelo primeiro secretário-executivo da CPLP, o angolano Marcolino Moco.
“O Governo português não tem conhecimento dessa disposição”, afirmou ao PÚBLICO uma fonte diplomática. Na sequência da ordem alfabética dos Estados membros da organização, cabe a Portugal apresentar candidato ao cargo de secretário-executivo. Aliás, esta questão consta da ordem de trabalhos da reunião ministerial dos chefes da diplomacia da CPLP que vai decorrer em Lisboa a 17 de Março.
Foi deste modo reafirmada a posição expressa pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, Angusto Santos Silva, na abertura do seminário diplomático em Janeiro passado. "Aprovaremos na próxima cimeira, no Brasil em Julho, a nova visão estratégica da CPLP e estamos a participar activamente nesse processo. Cabe a Portugal apresentar a candidatura ao próximo secretário ou secretária-executiva da organização. Temos aí uma responsabilidade muito importante, de que evidentemente não declinaremos", declarou então o chefe da diplomacia portuguesa.
Também em entrevista ao PÚBLICO Santos Silva confirmou aquele objectivo, não tendo precisado o nome do candidato ou candidata nem o seu perfil. Nalguns círculos, tem sido apontado o nome de Vitor Ramalho, actual secretário-geral da União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa. Contudo, tal hipótese não foi confirmada pelo próprio ao PÚBLICO.
No entanto, o primeiro-ministro de Cabo Verde, José Maria Neves, insistiu esta segunda-feira à Lusa na existência do acordo verbal. O actual secretário executivo confirmou a versão: "Dizem que é de 1996, quando foi a constituição da CPLP. Segundo dizem, houve um acordo de cavalheiros, não escrito". Murargy sublinhou ainda que esta é uma matéria que não lhe diz respeito e que devem ser os governos a encontrar uma solução.
Sustentou, ainda, que a experiência internacional aponta que o país que tem a sede da organização não apresenta candidatura a secretário. Assim, exemplificou que os norte-americanos não se candidatam ao cargo de secretário-geral das Nações Unidas, França não se candidata à Francofonia ou à Unesco nem Inglaterra à Commonwealth.
Já o primeiro secretário-executivo da CPLP entre 1996 e 2000, o angolano Marcolino Moco, disse à Lusa desconhecer "qualquer acordo verbal" de 1996. "Não senhor. Na minha vez, nunca ouvi tal acordo verbal e isso nem sequer está escrito em lado nenhum", frisou, admitindo, porém, que ouviu falar da questão "apenas este ano", sem, contudo, adiantar pormenores.
Desde a sua criação, em 1996, o secretariado executivo tem sido assumido rotativamente pelos Estados-membros, por ordem alfabética: Angola, Brasil, Cabo Verde e Guiné-Bissau. Moçambique assumiu o cargo nos quatro últimos anos, com os dois mandatos de Murargy. Seguem-se, nesta lógica, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste. Recorda-se que a Guiné Equatorial é o membro mais recente na CPLP, tendo aderido em 2014.