Tekever quer levar o conceito de Internet para o espaço

Portugueses são uma comunidade jovem e pequena, mas fazem parte da elite mundial na investigação aeroespacial e constituem um dos nossos melhores "produtos" de exportação. Criada por dois engenheiros, a Tekever não para de somar missões espaciais ao seu cv

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Quando a Agência Espacial Europeia (ESA) lançar, em 2017, a missão PROBA-3, com o objectivo de estudar o Sol, levará a bordo um sistema de comunicações desenvolvido por uma empresa portuguesa. Antes disso, já neste mês de Setembro, a mesma tecnologia vai integrar a missão TW-1, do Centro de Engenharia de Micro-satélites de Shangai. No Brasil, está a ser construída uma rede de estações de comunicação para alimentar, a partir da Terra, essa missão chinesa e fazer ligações com qualquer satélite que esteja no Espaço e tenha a tecnologia portuguesa Gamalink a bordo. E, até ao fim do mês, uma tecnologia inédita criada para estudar outros planetas será testada no Ártico. Estes são apenas quatro itens no “currículo” da Tekever, uma empresa tecnológica que quer “levar o conceito de Internet para o Espaço” e ajudar a revolucionar um mercado que, do ponto de vista tecnológico, “permanece nos anos 60”.

O investimento no Espaço, “um mercado que costuma ser muito conservador, mas que tinha necessariamente de ser revolucionado”, surgiu apenas em 2009, oito anos depois do arranque do grupo Tekever, criado por dois engenheiros informáticos formados no Instituto Superior Técnico. A tecnologia criada pelos portugueses começou a entrar no mercado há cerca de dois anos e tem como objectivo “fazer comunicações no Espaço com a mesma facilidade com que se fazem comunicações na Terra”. Chama-se Gamalink e não é um produto acabado. Tem uma “base tecnológica” já construída que é adaptada consoante o “cliente”: “Os requisitos exigidos variam de missão para missão. Por exemplo, para a missão da ESA é preciso proteger a tecnologia do ponto de vista da radiação”, explica Ricardo Mendes, um dos fundadores.

A Gamalink é baseada numa tecnologia já utilizada em comunicações terrestre móveis, como os telemóveis (a SDR, Software Defined Radio), e incorpora ainda um Sistema de Rádio Cognitivo, suporte para o uso eficiente do espectro eletromagnético e já utilizada nos rádios de militares. Numa única plataforma física, consegue juntar vários tipos de ligações via rádio, um desenvolvimento importante para quando as missões comportam vários aparelhos a trabalhar em conjunto.

Mercado em mudança

É o que acontece na missão TW-1, que vai lançar para o Espaço três micro-satélites. A Tekever pô-los a trabalhar em conjunto, “como uma constelação de satélites e não um conjunto de três satélites desconexos” que não interagem nem comunicam. Já na missão da ESA PROBA-3, o sistema de comunicações concebido pelos portugueses vai permitir que duas naves independentes orbitem de forma perfeitamente sincronizada. E é essa sincronização dos dois satélites que torna possível o estudo da coroa solar, uma vez que um dos satélites transportará um sensor e o outro obscurecerá o sol, de forma a permitir a observação apenas da coroa solar.

Nos próximos anos, a Tekever quer aumentar o número de satélites e estações equipados com a tecnologia portuguesa. E o passo que está a dar, neste momento, no Brasil é fundamental para isso. “Há dez estações que estão a ser equipados com o nosso produto. Isso não só vai permitir dar cobertura à missão chinesa como, mais tarde, vai possibilitar a comunicação com essas estações a qualquer satélite com um Gamalink a bordo.”

Ricardo Mendes fala de uma revolução em curso na Europa. Se é verdade que o mercado aeroespacial é “muito pequeno” e continua a ser “dominado por meia dúzia de empresas com fortes ligações aos Estados” também é certo que a dificuldade dessas firmas reagirem rapidamente às mudanças tecnológicas dá espaço aos “players” privados. “Há mais empresas a criarem e de forma mais barata. Isso vai necessariamente mudar o mercado.”

Mas ser competitivo nesta área é difícil. “As participações em missões como as da ESA, por exemplo, são muitas vezes financiadas pelos países. E com o nível de financiamento que Portugal dá é difícil ser líder.” Apesar disso, aponta o engenheiro informático, “há empresas espanholas e francesas a abrirem cá para terem acesso a financiamentos portugueses”.

A Tekever encara o mercado nacional como “um laboratório” e exporta “cerca de 80%” do negócio. Mas vai mais longe: tem escritórios nos EUA, Brasil, China e Inglaterra e, ainda este ano, vai abrir nos Emirados e reforçar a presença na América do Sul. São já cerca de duas dezenas as pessoas que trabalham na área do espaço dentro do grupo Tekever, que conta com 150 trabalhadores.

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