A nova aposta do Governo para a ciência teve a primeira baixa antes de arrancar

Ausência de verbas no memorando que devia ter sido assinado na semana passada levou a Universidade da Beira Interior a recusar assinar acordo. Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro considera que o projecto precisa de “amadurecer”.

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Data Center da PT na Covilhã DR

Os memorandos para a Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) e a Universidade de Évora (UE) incluíam uma garantia de financiamento anual para o funcionamento dos respectivos centros de investigação. A iniciativa da criação dos centros de investigação nas universidades do interior foi apadrinhada pelo ministro-adjunto e do Desenvolvimento Regional, Miguel Poiares Maduro, e pelo ministro da Educação e Ciência, Nuno Crato. “Terá uma dotacão do Programa Operacional Regional de um valor de 1,5 milhões de euros por ano”, lia-se em ambos os acordos, assinados, respectivamente com as CCDR do Norte e Alentejo. O mesmo não acontecia no caso da UBI, por recusa da CCDR do Centro em incluir qualquer compromisso de verba no documento.

“Só na quinta-feira à tarde recebemos o memorando. Verificámos que faltava essa parte e disse à CCDR do Centro e ao gabinete do ministro-adjunto que, naquelas condições não podíamos assinar”, explica o reitor da UBI, António Fidalgo. Na ausência de um compromisso relativo ao financiamento, o memorando tornava-se “apenas uma carta de boas intenções”, refere o mesmo responsável. A sessão de assinatura dos acordos com as três universidades mudou de lugar em resultado deste desentendimento, passando da reitoria da universidade, na Covilhã, para a CCDR do Centro, em Coimbra.

A decisão da CCDR do Centro é justificada pela presidente daquele organismo, Ana Abrunhosa, com a necessidade de “amadurecimento” do projecto da UBI, que se propunha a criar um centro de competências em computação em nuvem e saúde: “Não posso afectar verbas a um projecto enquanto não tiver a certeza de que todas as suas dimensões estão bem estabelecidas.” Em concreto, o órgão de coordenação regional dos fundos comunitários tem dúvidas sobre a “componente empresarial” do projecto para a Beira Interior, em particular o facto de prever um papel central para o Data Center da Covilhã, centro de processamento de dados que pertence à PT, uma empresa “que vive uma fase de reestruturação”.

Para o reitor da UBI, estas são críticas que fazem pouco sentido. “O que é central no projecto é o Data Center e não a PT”, sublinha. Para António Fidalgo, o facto desta infra-estrutura se localizar na Covilhã, tal como a universidade, e de já existirem acordos anteriores – a instituição de ensino superior está ligada por fibra óptica de máxima prestação ao centro de processamento de dados e tem servidores ali acolhidos – faz com que a ideia tenha sentido, “seja com a PT ou com outra empresa, que possa vir a assumir aquela infra-estrutura”.

Desde a recusa da UBI em assinar o memorando, na sexta-feira, não houve desenvolvimentos no caso e só no final do mês, quando tiver passado o período de férias, deverão ser retomados os contactos entre a CCDR do Centro e a UBI para ultrapassar esta situação. Contactado pelo PÚBLICO, Miguel Poiares Maduro diz que tem “total confiança” que a CCDR e a UBI celebrarão o memorando, mas lembra que “é competência de cada autoridade de gestão ponderar estes diferentes elementos e negociar o projecto com a universidade da sua região”. Também a presidente da CCDR do Centro diz que se mantém o “total compromisso” neste acordo, assim que sejam ultrapassados os problemas agora levantados.

O centro de competências em computação em nuvem e saúde que devia ter sido formalizado na UBI é um dos três novos centros de investigação, especializados numa área relacionada com a economia das respectivas regiões. A nova estratégia do Governo para a ciência prevê que a UTAD se especialize na vinha e no vinho, capitalizando o facto de estar sediada no Douro, e a UE nos sectores da agricultura, água e energia como prioritários, beneficiando da relação com a barragem do Alqueva.

O que tinha sido anunciado pelo Governo era que os três centros têm financiamento garantido, no âmbito do Portugal 2020, para um período que pode ir até seis anos. Numa primeira fase, cada estrutura recebe um financiamento de 150 mil euros e, até meados de Setembro, cada universidade deverá indicar uma comissão de especialistas internacionais, que serão responsáveis por delinear as respectivas estratégias e seleccionar o quadro de investigadores e o director de cada centro, que se pretende seja um investigador reconhecido na área. A partir daí, cada centro poderá captar fundos comunitários através dos programas operacionais regionais, através de convites que serão endereçados por cada CCDR, com valores que variam entre os 1,5 e 2 milhões de euros anuais.

O lançamento desta nova estratégia para a ciência surge depois de um ano marcado pelas críticas ao desinvestimento do Governo no sector, sobretudo com a avaliação dos centros de investigação pela Fundação para a Ciência e Tecnologia, tutelada por Nuno Crato. Esse processo excluiu cerca de metade dos centros de investigação e atingiu especialmente as estruturas do interior do país.

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