O primeiro galo a cantar é o que manda mais no galinheiro

Os resultados de uma equipa japonesa são um primeiro passo para a identificação do mecanismo genético que regula a vocalização inata nos animais.

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Num galinheiro pequeno, a hierarquia entre os galos determina-se... lutando Max Rossi/REUTERS

O ciclo circadiano – uma espécie de relógio biológico – regula a actividade de cada um dos galos segundo um ritmo próprio, definindo ainda quando é o momento oportuno para cantar, segundo dados de um estudo anterior coordenado pelo mesmo investigador. O novo estudo publicado na última edição da revista Scientific Reports mostrou que este ciclo, diferente para cada galo, é submetido à hierarquia social e depende sempre do ritmo do galo líder: este é que marca o passo do coro de vozes que se lhe seguem, por ordem descendente.

“O nosso objectivo final é identificar o gene que regula a vocalização inata”, explica ao PÚBLICO Tsuyoshi Shimmura, da Universidade de Nagóia e um dos autores do estudo. “Para isso, tivemos de identificar quando é que os galos cantam e qual o seu motivo.”

A vocalização inata é comum à maior parte dos animais – cada espécie vocaliza de forma diferente, sem que isso seja aprendido. Essa característica é regulada por um gene, cujo mecanismo permanece ainda desconhecido. “A nossa equipa usou o canto do galo como modelo, pois este animal tem uma forma de vocalização inata”, explica Tsuyoshi Shimmura.

Os investigadores juntaram quatro galos, para determinar a hierarquia entre eles. Quando os grupos envolvem menos de dez indivíduos, galos e galinhas são capazes de se reconhecerem entre si, desenvolvendo uma hierarquia linear e fixa, que determinará comportamentos diversos, como saber qual tem prioridade para se alimentar ou acasalar.

“Quando se juntam galos que não se conhecem, eles vão começar uma luta entre si”, explica à agência noticiosa AFP Tsuyoshi Shimmura. “Depois de serem identificados os mais fortes, o combate diminui, continuando por vezes os mais bem posicionados na hierarquia a provocar os outros com bicadas, mas jamais acontece o inverso.”

Após verificarem qual é que tinha a prioridade do canto inicial, que é o mais longo e que determina os que se lhe seguem, os investigadores retiraram esse animal do grupo para ver o que acontecia. Conclusão: o galo que se lhe seguia na hierarquia assumiu o primeiro lugar no grupo, passando a ser ele a dar o sinal de alerta todas as manhãs. “Quando o galo no topo da hierarquia é retirado do grupo, o que está em segundo lugar comporta-se como se fosse o primeiro”, sublinha o artigo.

“Pensa-se que o canto do galo é também um modo de demarcação de território”, explica Tsuyoshi Shimmura. “Na nossa experiência verificámos que quando um galo era mantido sozinho, a frequência do seu canto ia decrescendo gradualmente até que o animal deixava finalmente de cantar.”

Estudos anteriores de outras equipas de cientistas sugeriram que o canto do galo líder suprimia por completo o dos subordinados. O que esta nova experiência vem agora contradizer.

Os investigadores japoneses verificaram ainda que os galos subordinados apresentavam uma frequência de canto voluntário inferior à dos dominantes, mas a situação mudou quando se aplicaram estímulos externos. O efeito de estímulos luminosos e sonoros (o canto de outros galos) provocou uma alteração no comportamento dos subordinados, que passaram a cantar tanto quanto os seus superiores na hierarquia.

Portanto, todos os galos têm a capacidade de cantar e de cantar em primeiro lugar, segundo indicam os resultados, o que também já era sugerido pela parte das experiências em que se retirou o galo dominante do grupo. Há assim uma ordem hierárquica em que os galos subordinados aguardam pacientemente todas as manhãs pela sua hora de cantar.

Os resultados agora obtidos pela equipa japonesa vêm aproximar os investigadores do objectivo que motivou o estudo. “Ainda não sabemos por que é que um cão faz ‘ão ão’ e um gato faz ‘miau’”, diz Takashi Yoshimura, citado num comunicado de imprensa. “O nosso interesse está em identificar o mecanismo genético que controla este comportamento, e os galos podem ser um excelente modelo.”

Texto editado por Teresa Firmino

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