Em Vila Real, há uma mulher-aranha a arranjar prédios

Em Trás-os-Montes, uma empresa anda a reabilitar prédios com os operários pendurados em cordas. Entre eles está Cecilia Barreyro, a única mulher em Portugal a trabalhar nas obras que recusam os andaimes

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Ao longo dos seus 38 anos de idade já se dedicou à hotelaria e a trabalhos administrativos, mas quando viu uma equipa a limpar as janelas de um hotel, em Barcelona, suspensa por cordas, não teve dúvidas que era aquilo que queria fazer para o resto da sua vida. “Queria mudar de emprego mas não sabia bem para o quê. Depois de ver pessoas a fazerem isto contactei logo a empresa”. Em poucos meses Cecilia concretizou o seu desejo de trabalhar nas alturas. Sempre praticou desporto mas nunca tinha feito escalada nem tinha qualquer experiência com cordas. Contudo isso não foi um entrave no ingresso na profissão onde rapidamente se integrou depois de superar as provas com sucesso.

“Adoro estar lá em cima. Tenho outra perspectiva de tudo. Apaixonei-me logo por isto e não tive nenhuma dificuldade em adaptar-me!”. Actualmente é das poucas mulheres a realizar este tipo de serviço. Em Portugal, será mesmo a única. Uma situação que Cecilia gostava de inverter. “Se a mulher consegue fazer um parto porque não consegue fazer isto? O que eu gostava mesmo era de formar uma equipa de mulheres, mas é muito complicado. Infelizmente o meio da construção civil ainda é muito machista”, lamenta.

Apesar desta profissão exigir alguma força física, que, normalmente, está mais associada aos homens, Cecilia acredita que as mulheres podem perfeitamente fazê-lo. “Acho que se podia fazer uma grande equipa de homens e mulheres. O homem tem, geneticamente, mais força, mas as mulheres são mais sensíveis, têm a técnica e a delicadeza mais apurada”, explica.  A maior parte do tempo trabalha na sua zona de residência, em Barcelona, mas vai frequentemente a Vila Real e já pondera ficar por lá. “Estou apaixonada pela calma de Vila Real. Em Barcelona é um caos”, revela.

Daniel Machado fundou a sua própria empresa em 2013. Sediada em Vila Real, inicialmente actuava apenas na área da energia eólica mas, há cerca de um ano, Daniel viu na reabilitação urbana uma oportunidade e abriu esta secção. “Nesta fase de crise da construção civil somos muito requesitados. Como o nosso trabalho não implica montar gruas e andaimes, os seviços são bastante mais rápidos. A obra existe mas nem se nota que está lá. Chegamos ao final do dia e desmontamos tudo, o que é bom para os moradores”, explica. Além disso, Daniel Machado garante que é uma forma de trabalho menos atreita a acidentes e melhor remunerada. “É muito mais seguro. Nos andaimes existem muitos acidentes. Aqui nunca vi acidente nenhum. Além disso, conseguimos preços muito mais competitivos. O orçamento que levamos pela obra que vamos fazer às vezes é o mesmo que as empresas de construção civil levam só para montar andaimes”, adianta.

Toda essa segurança afasta o medo? “As cordas fazem-me sentir segura mas o segredo do sucesso é ter um pouco de sangue-frio, não ter medo, ir para lá sempre como se fosse a primeira vez e não achar que por se ter experiência não corremos riscos”, garante Cecilia.

O trabalho em acesso por cordas ainda não é muito usual em Portugal. É necessária uma formação específica e, no país, ainda existe “um vazio legal” relativamente às condições exigidas para trabalhar nesta área. “No estrangeiro não podemos subir a um prédio sem determinados cursos, como primeiros-socorros, que é fundamental. Na minha empresa toda a gente tem o curso internacional de cordas”, adianta Daniel Machado.  

Fazem de tudo. Reabilitam prédios, fazem impermeabilização e limpeza de fachadas e de tubos, mudança de azulejos, pinturas e restauração, reparação de torres eólicas e, até, inspecção e reparação de pontes e barragens. Mas são poucos. “Ainda há falta de trabalhadores, por isso, primeiro procuro bons operários de construção civil e depois dou-lhes formação. Há pessoas que ainda estão reticentes a estas novas actividades mas temos de inovar os métodos antigos”, conclui Daniel Machado.

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