Ensino superior: jovens desconfiam e empresas não acreditam

As reformas no ensino superior não poderão ser feitas por apenas um partido ou governo.

Para analisar este sector é importante reconhecer desde já dois princípios: por um lado, Portugal aumentou de forma exponencial a oferta formativa e o número de inscritos e diplomados desde a década de 80, tal como a qualidade da formação ministrada (de acordo com o relatório Education at a Glance 2013, em Portugal, a taxa de graduação ao nível da licenciatura cresceu dos 15% em 1995 para os 39% em 2011, o que coloca o nosso país em linha com a média dos países da OCDE (39%)); e, por outro lado, o ensino democratizou-se e chegou a todas as classes sociais, assumindo-se como o principal factor de ascensão social. Temos hoje licenciados, mestres, doutores e mesmo reitores que são fruto do seu esforço e trabalho individuais, mas cujo acesso ao ensino superior apenas foi possível graças à eficiência da Acção Social Escolar, que apoia atualmente cerca de 60.000 estudantes carenciados por ano.

É tempo, e já vai tarde, de olharmos para a qualidade e para a eficiência do ensino superior em Portugal e analisarmos o que nele investimos. Neste contexto, foi oportuno o trabalho de investigação que a esta semana o jornal PÚBLICO levou a cabo sobre o investimento público nas instituições de ensino superior (IES) e que relança este debate. Não basta investir ou gastar uma percentagem maior ou menor do PIB, mas sim saber como investimos e o que isso acrescenta à qualidade e à eficácia de todo o sistema. Basta de discussões vazias sobre se este ou aquele governo gastou mais ou menos do que o anterior, mas sim como gastou ou investiu e com que prioridades.

Urge desenvolver reformas que aumentem a qualidade, a competitividade e a eficácia do sistema. O ensino superior existe sobretudo para dar formação de qualidade aos estudantes, incentivar a inovação e dar à sociedade soluções para aumentar o seu desenvolvimento sustentável.

Nestes últimos dias tivemos conhecimento, através de um estudo de uma consultora, que quatro em cada dez jovens não prosseguem estudos superiores por dificuldades financeiras. Mas também ficámos a saber que a maioria dos empregadores considera que não encontra nos jovens as competências necessárias para os integrar nas suas empresas.

Percebemos com isto que os jovens não veem que o ensino superior seja um investimento com retorno certo assegurado. Esta descrença faz-se sentir no abandono escolar. Em Portugal, 33% dos alunos inscritos em bacharelato ou licenciatura não chegam a concluir esse grau (face à média da OCDE de 32%). Por sua vez, as empresas percebem que as universidades e politécnicos não estão completamente de olhos postos nas saídas e oportunidades profissionais que as empresas procuram. Fica assim bastante claro que muita coisa é preciso mudar e que o fenómeno do abandono escolar merece a atenção do Governo e das IES.

Várias são as reformas que são necessárias fazer, quer ao nível do financiamento, da autonomia e responsabilização das instituições, do estatuto da carreira docente e dos incentivos aos investigadores, quer também ao nível da rede e oferta do ensino superior e da relação das formações com o mercado de trabalho e comunidade envolvente.

Considero que não é necessário fechar instituições de ensino, mas sim especializá-las em algumas áreas e regular a oferta ao nível regional em função das necessidades do mercado de trabalho. Urge assumir as diferentes vocações do sistema binário (ensino universitário e politécnico), assumindo sem tabus ou corporativismos as missões de cada um, que se complementam e não devem ser concorrentes.

O estudo agora divulgado confirma a análise que há muito fazemos do ensino superior e não deveria surpreender ninguém. Alguns olharão apenas para a escassez de financiamento e preferem ignorar a opinião das empresas, que lamentam a falta de qualificações necessárias para aquilo que são as suas necessidades. São de facto duas faces da mesma moeda que necessitam de reflexão.

As reformas no ensino superior não poderão ser feitas por apenas um partido ou governo, mas sim com todos os parceiros sem tabus, mas também sem corporativismos. Por isso é fundamental a participação de todos e com a coragem de enfrentar o problema por parte de todos os stakeholders interessados – o Governo, os partidos, as universidades, os politécnicos, os estudantes, as empresas e os autarcas.

Deputado, coordenador do Grupo Parlamentar do PSD para o Ensino Superior

 
 
 
 
 
 
 

Sugerir correcção
Comentar