Foi numa crítica do diário Guardian que se forçou uma resposta para um “porquê Oldboy, Spike Lee?”: estaria ele na mesma situação que o Martin Scorsese de final dos anos 80, quando, exaurido por ter subido lá acima (O Touro Enraivecido, de 1980) e a ressacar (O Rei da Comédia, 1982) depois do high - comercialmente nada lhe estava a correr bem, na verdade -, precisou de se recriar. O filme dado como exemplo é Nova Iorque Fora de Horas (1985): Oldboy, remake do filme do coreano Park Chan-wook, corresponderia também à necessidade de Lee, a atravessar dificuldades em concretizar projectos e em conseguir sucessos, em manter as mãos ocupadas e em não perder o jeito. Há aqui uma coincidência que podemos oferecer para fantasiar com essa narrativa: foi naqueles anos, 1987, que Scorsese realizou o videoclip de Bad, de Michael Jackson; foi o ano passado que Spike Lee realizou o documentário sobre Jackson e o legado do álbum Bad (Bad 25). Ficamos por aqui. É que se há qualquer coisa da ordem da variação em Nova Iorque Fora de Horas (ou, como na encomenda seguinte, A Cor do Dinheiro, de 1986, exercício literal com o que se dizia ser “scorsesiano” - Paul Newman mergulhava como um Cristo, e as personagens de Scorsese, de antes e de depois, passaram a reclamar-se como “crísticas”), tudo nesses filmes é uma continuação de si, em tom menor: para poder (continuar a) existir num meio que se mostrava adverso porque definitivamente mudara. Regressar a esses filmes é regressar intrinsecamente a Scorsese. Mas o Oldboy de Spike Lee é um filme de uma ausência de si: Spike quer ser coreano (quando não quer ser Tarantino) e cada movimento só reitera uma desadequação, a dificuldade que é simular (sequer) o júbilo do exercício que seria fazer-se passar por outro. Com uma falta de atenção, por exemplo, à figuração risqué, coisa pouco habitual para um actor americano, de Josh Brolin e com um desinteresse total por Elizabeth Olsen. Oldboy é uma experiência de entorpecimento: o espectador é levado a esquecer-se de “ver” e também se esquece de si.