Em defesa do direito à habitação no Bairro Nicolau do Porto

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O Bairro Nicolau, localizado na escarpa das Fontainhas, foi alvo de uma intervenção de entaipamento por parte da Câmara Municipal do Porto, por ser considerado uma zona de risco. Participaram nesta evacuação forçada dos moradores a Domus Social, a Protecção Civil e a Policia Municipal.

Os moradores foram sujeitos a uma acção de grande violência psicológica e física em virtude da acção musculada e prepotente dos agentes municipais. Os moradores não apresentaram resistência física perante tamanho aparato policial. Eram dezenas de carros patrulha, com dezenas de policias que ocuparam a entrada do bairro, cercaram-no e definiram um perímetro de segurança. De forma a impedir as pessoas de circularem de forma livre e de terem acesso aos seus bens pessoais.

Todo este aparato de intimidação tem como fundamento a existência de estudos e relatórios que apontam para uma derrocada iminente na escarpa. Contudo, os moradores sabem que não é bem assim, que outros interesses e outros objectivos estão por detrás da sua expulsão do Bairro Nicolau.

Pessoalmente, pensamos que não existe risco iminente, mas sim uma vontade política e técnica de deslocar estes moradores do bairro e da escarpa. Pelo simples facto de ser esta a prática comum na Domus Social e no pelouro da Habitação. Fizeram o mesmo no Bairro da Corujeira, em Campanhã. Destruiram as casas, os acessos, as infra-estruturas, os jardins e hortas. Deixaram um enorme vazio no sitio e no coração dos antigos moradores.

Consideramos importante, tendo em conta os acontecimentos recentes, colocar aqui algumas das referências técnicas, cientificas e sociais sobre este problema de existência de risco e sobre a sua dimensão...

Em relação ao problema da estabilidade, o relatório realizado sob coordenação de técnicos do LNEC considerava, por exemplo, que os problemas ficam reduzidos à zona superficial do maciço granítico mais atingida pelas acções climatéricas, na qual a rede de fissuras se vai adensando e isolando blocos que pouco a pouco se vão desprendendo até caírem.

Segundo este relatório, as medidas necessárias para assegurar a estabilidade desta zona superficial devem, em primeiro lugar, sanear a escarpa dos blocos de que se receie a queda iminente. Em segundo lugar, há que consolidar os blocos de precária estabilidade para assegurar o seu bom comportamento a longo prazo. Depois, convém proteger o maciço granítico das incidências climatérias para atenuar, quanto possível, a progressão do processo de instabilização. Finalmente, vigiar periodicamente a encosta, para que o indispensável trabalho de conservação tenha lugar a tempo de prevenir eventuais acidentes.

Neste sentido, a protecção da escarpa deve ser feita em relação às águas, por drenagem, e em relação ao sol, por meio da cobertura com terra, arbustos ou edificações. A drenagem deve evitar quanto possível a infiltração das águas das chuvas. Impedir que as águas caídas nos terrenos na parte superior que vem dar à escarpa sejam desviadas para locais onde se acumulem.

Considera o relatório do LNEC que a cobertura com edificações é, sem duvida, uma das soluções mais eficazes, não só pela sua permanência em todas as estações do ano, mas também pelo conjunto de obras acessórias que envolve, quase todas benéficas para a estabilidade: drenagem das águas pelos telhados e pavimentos, permanente vigilância  e conservação feita pelos utentes das edificações.

Este dado leva-nos a reflectir sobre as medidas agressivas agora tomadas pela Câmara do Porto. Com o entaipar e destelhar das casas, e consequente abandono dos moradores do local, este ficará em estado de abandono permanente. Agravam-se as condições de degradação da escarpa e, aí sim, acentua-se e potencia-se o risco de derrocada. Se as encostas da Sé e da Vitória ficassem sem casas, sem bairros, sem moradores, que seria da estabilidade física e ambiental destas encostas?

Em conclusão, este risco pode, porém, eliminar-se, se procedermos ao saneamento e consolidaçao dos blocos, protegendo a escarpa das acções climatéricas, pela dreanagem das águas e cobertura da rocha granítica com tapetes de relva, arbustos e edificações. E depois, com a vigilância e a conservação. Sem duvida que a habitação permanente permite assegurar essa monitorização constante e vigilância. Aliás, ao longo destes anos foram muitos os abaixo-assinados a denunciar os problemas ambientais, urbanísticos e físicos da escarpa. Para os quais as entidades competentes nunca, ou quase nunca, deram resposta adequada, e continua por resolver o problema.

Limitaram-se desalojar, a entaipar e a destruir casas, bairros e comunidades de famílias estruturadas por relações de vizinhança sólida e inclusiva.

Antropologo MIA-ESAP, Investigador CICS-UM
 
 
 
 

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