A União Europeia foi galardoada com o Prémio Nobel da Paz, num momento de particular dúvida sobre o futuro da Integração Europeia, o que o reveste de um significado especial.
Este prémio é ao mesmo tempo tardio e extemporâneo: tardio, porque o mereceriam receber os pais fundadores da ideia de uma Europa enquanto projecto de paz sólida e duradoura. Extemporâneo porque neste preciso momento da História, a União Europeia não o mereceria plenamente. Há momentos em que parece que a Academia Nobel pretende fazer do prémio mais uma declaração de "wishfull thinking" (como o momento em que o atribuiu a Barack Obama pelo trabalho que este havia de fazer), do que reconhecer valores, atitudes e obra feita em favor daquele ideal.
Há que discutir então: servirá para alguma coisa no que diz respeito ao futuro da UE? Toda a história da integração europeia é feita de "checks and balances" entre federalistas e eurocépticos. E o que acontece é que, para não assustar os eurocépticos, se adoptou ao longo dos últimos quase 60 anos, a “política dos pequenos passos”: da escolha da integração económica antes da integração política, a diplomacia para resolver problemas e ultrapassar impasses, e acima de tudo, a quase proibição da palavra “federalismo” (shiiu!).
Não pode haver dúvidas quanto às vantagens e à prosperidade que 60 anos de paz — com excepção dos conflitos na ex-Jugoslávia — nos trouxeram. É por isso que não devemos ter receio de defender mais integração europeia. A discussão sobre o futuro da Europa já não pode estar centrada no “será que vale a pena”, mas sim no “como é que se fará valer a pena”.
E aí, sim, há muito caminho para andar. O profundo défice democrático e a falta de legitimidade dos órgãos da UE e dos seus processos de decisão são fragilidades demasiado evidentes para serem ignoradas: Em tempos de crise, a solidariedade passa a letra morta, o preconceito e o populismo vêm ao de cima, e a desconfiança, ou a criação de bodes expiatórios externos são expedientes demasiado fáceis para não serem utilizados pelos políticos que, no seu cantinho, querem ser eleitos ou reeleitos.
A resposta para a crise europeia passará por mais (e sobretudo melhor) integração e se for preciso usar a palavra “F”, de federalismo, não devemos ter medo dela. Porque aí, terão de acabar os momentos de hipocrisia em que há regras diferentes para situações iguais (relembrem-se os casos dos limites do défice e do proteccionismo que se aplica aos carros indianos, mas não aos têxteis chineses), terá de ser alterada a realidade burocratizante de Bruxelas para democratizar as instituições. Tem de haver verdadeiras políticas de coesão e defesa dos interesses comuns (em vez dos interesses só de alguns) e uma estratégia política obrigatoriamente validada pelos cidadãos, um Parlamento Europeu com poderes a sério, com a eleição pelo povo dos responsáveis pela governação.
Porque é aos cidadãos que cabe escolher a quem delega os poderes para gerir a coisa pública. Porque a Europa só para as elites não tem futuro, e o meio-termo em que nos encontramos — da transferência de soberania só em algumas coisas, mas sem uma palavra a dizer por parte do povo — não tem vindo a funcionar, e não funcionará no futuro. Esperemos que o Ano Europeu dos Cidadãos em 2013 ajude à discussão pública, sem tabus e sem preconceitos.