As perguntas que interessam

A primeira coisa que dá vontade de dizer sobre "Oslo, 31 de Agosto" é “daqui ninguém sai vivo”, para citar a célebre biografia de Jim Morrison. Mas talvez fosse mais apropriado dizer que ninguém sai deste filme incólume, intocado; porque o que aqui se faz é, simplesmente, fazer as perguntas “que interessam”, aquelas que toda a gente faz a si próprio regularmente: o que fazemos aqui, o que queremos da vida, quem somos bem lá no fundo. São as perguntas mais simples, porque cabem numa frase, mas as mais complexas, porque não se respondem numa frase ou em duas palavras - e o que Joachim Trier faz é encenar esse questionamento com uma notável capacidade de não o reduzir a banalidades ou a simplificações.


Precisamente porque esta é a história de alguém que observa a vida como se estivesse de fora, alguém que regressa ao mundo depois de uma longa ausência e se pergunta se vale a pena tentar recuperar a vida que desperdiçou, se há alguma coisa neste “mundo real” para ele. Esse alguém que regressa ao mundo é Anders, drogado em reabilitação que regressa a Oslo pelo tempo de 24 horas, revisitando uma cidade onde tudo o recorda dessa vida anterior que sente ter desperdiçado. É uma interpretação assombrosa de Anders Danielson Lie, que habita literalmente a dor existencial de Anders, a sua capacidade de observar sem nunca sentir que faz parte do mundo que o rodeia, com uma presença que, à imagem do filme, é simultaneamente física e fantasmagórica.

Como se tudo funcionasse ao mesmo tempo num plano intimista, acompanhando a jornada interior de Anders, e num plano social, onde o seu questionamento interior é indissociável da sociedade em que a sua crise pessoal está a acontecer. Perguntando-se o que será melhor: seguir (para citar outra vez o rock'n'roll) o “better burn out than fade away” que Neil Young cantou em “Hey Hey My My (Into the Black)”, ou procurar acomodar-se a um lugar numa sociedade da qual sempre se procurou distanciar?

Qualquer que seja a resposta, Oslo, 31 de Agosto começa com um tour-de-force extraordinário - dez minutos puramente narrativos quase sem diálogo - antes de ganhar embalo para um filme que segue os ritmos do melodrama clássico mas o faz de modo moderno, com uma espantosa humanidade, de uma simplicidade atenta e observacional aos ritmos e às energias do mundo moderno, de uma maturidade extraordinária para apenas uma segunda obra. O facto de, no final, percebermos que se trata de uma adaptação - da novela de Pierre Drieu de la Rochelle que já inspirara a Louis Malle um dos seus grandes filmes, Fogo Fátuo (1963) - não lhe retira nem um grama do que o torna num dos mais extraordinários, grandíssimos filmes que vimos nos últimos meses. Porque ninguém sai deste filme incólume, intocado - para o bem ou para o mal.

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