Pensar em Naked Lunch, mesmo em Crash, dois momentos em que Cronenberg se aproximou de escritores (Burroughs e Ballard) que, mais do que “fornecedores de narrativas”, transportam uma personalidade que resiste à rasura - e nesses filmes Burroughs e Ballard estavam lá, mas também estava Cronenberg, a olhar para eles, em duelo com eles, numa espécie de confronto de universos. Em Cosmopolis a sensação é que Cronenberg se furta ao confronto: sai-se do filme e se se começa a discuti-lo rapidamente se percebe que o que se está a discutir é DeLillo, não Cronenberg. Abre com Pollock e fecha com Rothko (genéricos de abertura e fecho), mas é Cronenberg em modo figurativo, ilustrador, decepcionante. O Carnaval antropológico desta Nova Iorque muito strange days (bom dia sra. Bigelow) tem a sua piada, mas o puritanismo blasé desta crónica de uma dissolução generalizada fica sempre pela superfície: é uma questão moral, ideológica, não é uma questão “orgânica” (no exacto sentido cronenberguiano do termo). Ou por outra: desta vez a palavra não se torna carne.
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