“Gritei sou jornalista, sou jornalista mas pareciam não ouvir nada”
Fotojornalista da AFP Patrícia Melo Moreira foi agredida por um agente policial durante a manifestação da Greve Geral, em Lisboa. “Quero pensar que ele não viu sequer a carteira e não ouviu o que gritei”, disse ao P3
Não é a primeira vez que Patrícia Melo Moreira é agredida por forças policiais em trabalho, mas nunca a situação tinha tomado as proporções de ontem, quinta-feira, quando a fotojornalista da AFP fazia a cobertura da manifestação da Greve Geral, em Lisboa.
Estava ainda com a máquina fotográfica junto à cara, a registar um momento tumultuoso, quando é deitada ao chão por um agente policial. A jovem de 28 anos levou a mão ao bolso, onde prontamente tinha posto a carteira profissional, e levantou-se para mostrar ao agente a carteira. É nesse momento que é novamente derrubada e agredida. “Bateu-me com o cassetete várias vezes. No chão eu só gritei 'sou jornalista, sou jornalista' mas pareciam não ouvir nada”, recordou Patrícia Melo Moreira.
É nesse momento que um manifestante – o jovem de "t-shirt" cor-de-laranja e cabelo comprido que aparece na fotografia que correu mundo (em destaque) – ajuda a fotojornalista a levantar-se do chão. “Da segunda vez tive mesmo de fugir, comecei a correr”, contou ao P3. Mas não desistiu de trabalhar – a uns metros de distância olha para trás e tenta fotografar o agente que tinha acabado de a agredir. “Vi que o manifestante que me tinha ajudado estava também a ser agredido”, lamenta. As fotografias desse momento acabaram por se perder, provavelmente por danos na máquina fotográfica.
AFP fez queixa, Patrícia vai fazer
Patrícia não se lembra bem do que lhe veio à cabeça naquele momento – “A única coisa que pensei é ‘mas porque é que me estão a bater?”. “Quero pensar que ele não viu sequer a carteira e não ouviu o que gritei”, desabafou Patrícia Melo Moreira, que vai juntar ao protesto que a AFP já apresentou “uma queixa pessoal contra o agente”.
“Percebi que eles não estavam minimamente interessados em saber se eu era manifestante ou jornalista e se tinha feito alguma coisa errada ou não”, disse a jovem fotojornalista, que admite não se ter apercebido da origem do tumultuo.
Quando a confusão começou, Patrícia estava num café do Chiado a enviar algumas imagens que já tinha feito, com o fotojornalista da Lusa José Sena Goulão, que havia de ser também agredido pela polícia. “Achamos que, a haver problemas, seria mais ao pé da Assembleia [da República] e fizemos uma pausa. Mas de repente começamos a ouvir muito barulho e fomos a correr para lá”.
Os ânimos estavam agitados – “Havia muita polícia de intervenção a sair das carrinhas, um manifestante e um polícia feridos e coisas a voar”, recorda –, mas o cordão policial feito imediatamente parecia chegar para conter os ânimos. “A carga surgiu nesse momento”, contou.
Nas esplanadas do Chiado estavam várias pessoas que nem sequer estavam na manifestação, mas o que as imagens mostram é que a carga policial acabou por ir sobre elas também. Depois de ter sido agredida – momento que lhe valeu várias nódoas negras no pescoço e um joelho e cotovelos feridos – Patrícia Melo Moreira recorda a “cara de pânico” das pessoas que se encontravam no local. “Havia pessoas dentro da [cafetaria A] Brasileira, que fecharam a porta com medo do que estava a passar”.
A jovem, formada na Escola Técnica de Imagem e Comunicação de Lisboa, lamenta a aparente falta de preparação da Polícia de Segurança Pública, que já emitiu um comunicado onde refere que os jornalistas “têm de andar identificados”. Uma ideia que a fotojornalista recusa: “Não creio que tenha de estar identificada, de ter um colete ou um boné, não somos uma ameaça pública, só queremos fazer o nosso trabalho”, diz, lembrando que a carteira profissional, que a identifica como jornalista, foi mostrada ao polícia que a agrediu.
Notícia corrigida às 23h37 Foi rectificada a grafia da palavra "cassetete"