“Marty”, de Delbert Mann (1955)

Marty (Ernest Borgnine) é um homem sensível a quem a timidez e os hábitos simples afastam dos circuitos da conquista do par com que se esperaria que arrumasse a vida

Poster do filme Marty DR
Fotogaleria
Poster do filme Marty DR
DR
Fotogaleria
DR
Poster do filme Marty DR
Fotogaleria
Poster do filme Marty DR
DR
Fotogaleria
DR

E depois há filmes como este, aparentemente pequeninos, baratos, sem aparato, miudinhos, não no valor, mas na atenção que é preciso dedicar-lhes para não perder os pormenores que justificam que tenham sido feitos, para que os que sabiam pudessem lê-los quando se estrearam e os que sabem possam lê-los ainda hoje, 46 anos depois, e sempre e sempre. Melhor ainda é ter família ou amigos que compreendam um convite para partilhar, em casa, livros ou poemas, principalmente quando são contados em imagens e sons organizados em cinema, uma forma mais cómoda de os apreciar na companhia de alguém que escolhemos. Neste caso, é um poema, possivelmente um bom resumo do que fica após vermos “Marty”.

Marty (Ernest Borgnine) é um homem sensível a quem a timidez e os hábitos simples afastam dos circuitos da conquista do par com que se esperaria que arrumasse a vida, a exemplo dos seus inúmeros irmãos e irmãs. Morando sozinho com a sua mãe e passando o seu tempo livre com amigos que não sabem melhor do que ele o que fazer com esse tempo (“O que é que te apetece fazer”. “Não sei. E a ti, o que te apetece fazer?”), Marty acumula solidão e amargura, pois não é bem-parecido nem tem uma “profissão elegante”: ele é o homem do talho de uma rua do Bronx, Nova Iorque, que, por excesso de gordura ou falta de carisma, não detém os olhares das mulheres nem lhes inspira interesses ou paixões. As mulheres, sobretudo as mais velhas, procuram-no apenas para conseguir bifes em conta e para o massacrar com as perguntas: “Quando é que te casas, Marty? Não tens vergonha de já todos os teus irmãos se terem casado e tu não? Não tens vergonha?...”

Sim, este homem tem vergonha de ter 34 anos e ainda não se ter casado, mas sente um peso maior das rejeições que sofreu quando tentou dançar com raparigas num salão de baile onde a juventude se encontrava para engatar alguém ou simplesmente para tentar estar com alguém. Não o sabendo, é para esse salão – o Stardust Ballroom – que a sua mãe tenta empurrá-lo, com o engodo do calão jovem da época que ela tinha ouvido a um sobrinho: “I say, why don't you go to the Stardust Ballroom? It's loaded with tomatoes.” (“Por que não vais ao Stardust Ballroom? Está cheio de ‘brasas’”). A mãe está a tocar-lhe na ferida, ele explode, mas depressa volta à sua “boa natureza” e ri-se por a sua mãe idosa ter utilizado a expressão “it’s loaded with tomatoes”. Mesmo na dor, encontra espaço para a ternura e com isso conquista-nos para as suas batalhas.

Quando conhece uma professora de 29 anos (Betsy Blair) que também colecciona rejeições e humilhações e que, tal como ele, se não tem em grande conta, sabemos que chegámos ao ponto em que tudo se pode tornar mais interessante, que estas pessoas vão encontrar esperança e dar-nos esperança (pelo menos aos que precisam) porque, tal como diz a canção de Tom Jobim e Newton Mendonça e nós sabíamos antes da história começar, “no peito dos desafinados também bate um coração”.

“Marty”, a preto e branco e em pequeno formato, venceu quatro Óscares em 1956: melhor filme, melhor realizador, melhor actor principal e melhor argumento. 

Foto
“Marty” venceu quatro Óscares em 1956
Foto
“Marty” venceu quatro Óscares em 1956
Sugerir correcção
Comentar