Era uma vez uma geração de ouro
Nessa tarde de domingo, com o Estádio da Luz a abarrotar (oficialmente cabiam 120 mil pessoas, mas estariam mais, a FIFA contabilizou 127 mil), o suplente não utilizado Luís Miguel irrompeu pelo relvado em euforia mal o guarda-redes brasileiro Roger foi batido ao quarto penálti (o Brasil falhou dois e Portugal converteu todos), juntando-se aos companheiros em festa. Hoje, está no desemprego e vive do subsídio - faz parte do que ele chama a "metade dos esquecidos". À outra metade, "a dos famosos" dessa selecção, pertencem Figo, Rui Costa ou Jorge Costa.
Há ainda os resistentes. Tó Ferreira é o único dos 18 campeões desse Mundial que ainda joga. Na última época defendeu a baliza do Boavista, no Nacional de Futebol da II Divisão, e só quer abandonar aos 40 anos. No Bessa, conta, jogou "com miúdos que nem eram nascidos" em 1991 e que "só viram estas imagens na Internet".
É essa imagem que perdura. Na memória e via computador. Porque este foi o último grande feito do futebol jovem nacional, já que as selecções foram-se afastando das fases finais - foi segunda no Europeu de 1994 e terceira em 2004; e no Mundial de 1995 atingiu o terceiro posto. De outro ângulo: nos últimos cinco mundiais, Portugal esteve ausente da fase final em 2009 (Egipto), 2005 (Holanda), 2003 (Emirados Árabes Unidos) e 2001 (Argentina), tendo apenas participado na edição de 2007 (Canadá), na qual foi eliminado pelo Chile (1-0) nos oitavos-de-final. Aquela final, na Luz, foi o último grito.
Nelo Vingada, adjunto de Carlos Queiroz, lembra, contudo, que o trabalho desenvolvido nessa altura ainda deu alguns frutos nos anos seguintes. "Depois de 1991, o edifício manteve-se sólido", conta ao PÚBLICO, recordando. "As selecções mais jovens tiveram sucesso até início de 2000, os resultados foram sendo bons, sempre presente nas fases finais", destaca. Portugal assemelhava-se a uma ilha - um país pequeno conseguia manter-se na luta com os maiores. Só depois veio o verdadeiro declínio.
Importação de estrangeirosUma análise muito cáustica dos últimos anos das selecções jovens portuguesas foi feita por Queiroz. O ex-seleccionador nacional afirmou mesmo que Portugal volta a participar num Mundial de sub-20 (este ano, na Colômbia) devido às "medidas desagradáveis" que implementou na federação enquanto foi seleccionador, entre 2008 e 2010.
"Vai à Colômbia, não vai? Já há alguns anos que não disputava um Mundial de sub-20", desabafou Queiroz. E apontou a justificação com "a alteração de treinadores, alteração de alguns conceitos, da forma de abordar a preparação dos jogadores".
Este hiato de presenças nos grandes torneios pode ter outra explicação. Comparar a aposta dos três maiores clubes de Portugal em jogadores portugueses no início dos anos 90 e agora, duas décadas depois, pode ser uma boa pista. FC Porto, Benfica e Sporting apresentavam uma média de oito portugueses na equipa titular, impensável nos tempos que correm, onde essa quota é preenchida por estrangeiros. Esta temporada, os portistas jogaram com oito estrangeiros (na maioria sul-americanos), fenómeno seguido pelos benfiquistas (nove não-portugueses) e sportinguistas (seis).
"A importação de jogadores estrangeiros" é também apontada por Vingada como o elo quebrado entre os clubes e as selecções nacionais. "A empatia era forte entre clubes e selecções", conta, havia uma "filosofia quase nacional". Agora tudo é mais "regrado" e essa identidade "esbateu-se".
O que aconteceu a 30 de Junho de 1991Final do Mundial de sub-20
Estádio da Luz, em Lisboa (0-0, nos 120 minutos)
Assistência:127 mil pessoas
Equipa titular de Portugal:Brassard; Nélson, Peixe, Jorge Costa e Paulo Torres (Tulipa, 9", Capucho, 70"); Rui Bento, Rui Costa, Gil; João Pinto, Luís Figo e Toni.
Série de penáltis:Marcadores: Ramon, Jorge Costa, Elber (falhou),Figo, Andrei, Paulo Torres, Marquinho (falhou), Rui Costa.
Rectificação do nome de Fernando Couto pelo de Jorge Costa no final do segundo parágrafo