História verídica de um boxeur do Massachusetts dividido entre a lealdade à família e a ambição de ser um lutador de sucesso, "Último Round" remete para o cinema americano dos anos 1970 - David O. Russell nem sequer se esquiva a convocar as referências todas da altura, com o binómio "Rocky"/"O Touro Enraivecido" à cabeça, até na imagem granulada, no modo como se deixa espaço aos actores para definir e dirigir a narrativa.
Mas se, como filme de boxe, "Último Round" não consegue marcar a diferença dos clássicos que o antecederam e se refugia (sobretudo na segunda metade) num convencionalismo narrativo decepcionante, a verdadeira força do filme está noutro lado: no seu retrato entomológico de uma comunidade de classe trabalhadora americana dos anos 1990, no modo como o boxe não é para eles tanto um desporto como um escape do quotidiano, uma possível porta de saída. Aí, nesse olhar muito 1970 sobre gente que luta contra uma vida que não lhes dá hipótese, é que o filme é digníssimo sucessor dessa última década em que o cinema americano ainda foi capaz de nos surpreender. Com uma série de interpretações extraordinárias das quais a que merece nota mais alta - porque é a injustamente menos celebrada de todas - é a de Mark Wahlberg, que ancora todo o filme e, à imagem da sua personagem, lutou para que este filme existisse.