A guerra, a mais terrível das viagens

“Escrever a Guerra” era o tema da conferência moderada pelo editor Manuel Alberto Valente, que contava ainda com um conferencista que nunca esteve na guerra, Henrique Levy, mas que acaba de publicar um livro - “Cisne de África” em que cria toda uma história que se passa no período da guerra colonial. A história de uma enfermeira portuguesa que se apaixona por um comandante da FRELIMO.

Uma nuance foi introduzida no tema em discussão por Manuel Alberto Valente, que perguntou aos seus convidados “se escreveram a guerra ou se escreveram sobre a guerra”.Se no início Carlos Vale Ferraz começou a contar histórias sobre a guerra porque a viveu e porque a guerra é “um mundo de aventuras e de tensões”, hoje para o comandante na reserva escrever sobre a guerra é escrever sobre o poder (os vitoriosos) e os guerreiros (os derrotados). “É a história do poder que hoje me interessa - escrevo à volta da guerra, sobre aqueles que assumem o poder”, disse. “A partir do momento em que há uma guerra já se sabe que os guerreiros vão ser eliminados”.

Para António Brito, que se voluntariou para ir para a guerra colonial quando tinha 20 anos, a guerra é um processo de amadurecimento. “Quando se vai para a guerra e se é muito novo… vemo-nos naquele mundo e temos de crescer depressa.” No seu romance quis falar do soldado anónimo que fez a guerra, quis dar alguma visibilidade a esse homem “esquecido”. Falar desse mundo de conflito em que o homem é levado aos seus limites. “Em que os actos que se praticam têm muito a ver com ser-se bem ou mal formado”.

“O conflito armado é uma ruptura em cada um de nós. Levanta muitas interrogações. Aos homens mobilizados para uma guerra são-lhes ensinadas as técnicas de combate, mas raramente estão preparados para o regresso à sua vida civil”, acrescentou o autor de “Olhos de Caçador”.“Porque não interrogamos o recrutador que nos manda para a guerra e interrogamos o polícia que nos manda parar na rua?”, deixou no ar Carlos Vale Ferraz. Que reafirmou aquilo que já disse em entrevistas “todos os soldados quando estão a combater tentam sobreviver. O soldado não combate pela pátria.” Numa situação de guerra “a diferença essencial entre o cobarde e o herói é a direcção em que fogem”, disse. “Mas fogem os dois, só que em direcções contrárias”.

Porque se vai para a guerra? Porque é que um jornalista vai para a guerra? Nasce de uma vontade imensa de estarmos onde se faz a história, de sermos testemunhas dos acontecimentos, defendeu Luís Castro que dividiu os jornalistas que cobrem os combates de guerra entre os que ficam no hotel, os que vão para a rua e aqueles que vão para a linha da frente, habitualmente esses são os repórteres de imagem. Como nos podemos preparar para a guerra quando não sabemos ao que vamos? Este jornalista da RTP contou duas situações em que se viu metido. Na primeira, em Angola, numa guerra onde não se costumavam fazer prisioneiros, viu-se perante um prisioneiro feito ali, à sua frente. Só para que o interrogasse para a sua reportagem e para que o seu câmara captasse as imagens do momento em que a sua cabeça seria cortada com uma catana. A segunda situação passou-se durante a guerra do Iraque.

O jornalista foi convidado por um grupo da Al Qaeda para ir assistir e filmar um atentado. “Vamos ou não vamos?” foi a pergunta que se colocou à sua equipa. Não foram. Como também não filmaram a execução do prisioneiro-fantoche. Luís Castro trocou a vida desse homem por dois maços de tabaco.

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