Isto é também o "product placement" levado ao seu limite: "Transformers" é baseado nos brinquedos articulados e nos desenhos animados dos anos 80 sobre robôs mutantes que andavam pela Terra disfarçados de veículos convencionais, e é basicamente um filme sobre robôs mutantes extraterrestres que andam pela Terra disfarçados de veículos convencionais (não por acaso, a recém-lançada linha 2007/2008 da General Motors...) e arreiam porrada à grande e à francesa uns nos outrosenquanto o povo fica a vê-los a dar cabo do cenário com requintes de malvadez. Não quer ser mais do queisto e tem um enorme prazer em ser só isto, ou não trouxesse a assinatura de Michael Bay, publicitáriopromovido acima das suas competências, com umimpressionante talento de "filmador" e montador eabsolutamente zero jeitinho para contar uma história (não fossem Sean Connery e Nicolas Cage e "ORochedo", 1996, seria uma maçada chatíssima). Só num filme, o alucinante "Armageddon" (1998),cristalização avassaladora do formato do "blockbuster" inane de grande produção registado pelo produtor Jerry Bruckheimer (com a mãozinha de J. J. "Perdidos" Abrams no argumento...), o talento de Bay para encenar banalidades de forma grandiosa encontrou o guião ideal para exibir o seu virtuosismo, acelerando a louca odisseiaapocalíptica de uma equipa de perfuradorespetrolíferos enviada para destruir um asteróide antes que este destrua a Terra até nada restar senãoo prazer da adrenalina e da velocidade.
Depois, Bay quis provar que sabia contar histórias e estatelou-se ao comprido com o empolado "PearlHarbor" (2001) e "A Ilha" (2005). "Transformers", felizmente, recupera um pouco da "velocidadefuriosa" de "Armageddon" - nem podia ser de outra maneira, combinado com um curioso conjunto de referências que remete simultaneamente para a série Bclássica da década de 50 e para uma nova cultura "pop de culto" (perdoem a redundância) que não se limita ao cinema, à literatura ou à música mas abrange o próprio contexto em que tudo foi criado e recordado. Tal como escrito por Roberto Orci e Alex Kurtzman (habituais colaboradores de J. J. Abrams nas séries "A Vingadora" e "Perdidos"), "Transformers" funciona ao mesmo tempo no tabuleiro "a-verdade-está-lá-fora" herdado dos "Ficheiros Secretos" e da Área 51 que alimentou gerações de teorias da conspiração e fitas de baixo orçamento; no tabuleiro do "novo apocalipse tecnológico" que tem alimentado tanto "blockbuster"americano desde "O Dia da Independência" (Roland Emmerich, 1996) (e do qual o superior "Die Hard 4.0" é um curioso "colega"); e no tabuleiro patriótico dos soldados valorosos e heróicos que defendemabnegadamente a noção americana que cai bem neste tempo de apoio às tropas (cujo lado icónico Bayexplorou com óbvio deleite em "Pearl Harbor").
É evidente, dito isto, que por muito divertido que seja (e é, sobretudo numa estética Zssumidamente "trash" "eu-não-acredito-que-estou-a-ver-isto-mas-é-tão-fixe-que-estou-a-curtir-que-nem-um-castor" e sobretudo sempre que John Turturroaparece em grande forma a fazer de FBI desvairado empermanente modo "toda-agente-me-deve-e-ninguém-mepaga"), "Transformers" não é um grande filme, nem sequer algo que fique na memória para lá da sua duração (algo indigesta, como é hábito em Bay). É sóum quase-manga de imagem real sobre robôs mutantes adar porrada uns nos outros enquanto dão cabo do cenário. Mas o cinema também é feito destes prazeres culpados inconsequentes. Sobretudo quando tudo se resume a robôs mutantes a dar porrada uns nos outros.Godzilla aprovaria.