Mulheres cientistas apresentam hoje a sua associação em Portugal

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A associação chama-se Amonet, o nome de uma deusa egípcia DR

Apesar de mais de 60 por cento dos diplomados que saem do ensino superior serem mulheres, poucas atingem posições de topo. "As mulheres estão sub-representadas nas posições mais avançadas da carreira. A percentagem das que atingem posições de chefia é muito pequena. As mulheres perdem-se pelo caminho", diz a ecóloga Maria Rosa Paiva, catedrática da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa.

"É um desperdício grande de recursos humanos, porque investimos na educação de metade da população e depois ela desaparece, sublima-se", acrescenta Rosa Paiva, da comissão de gestão da Amonet e uma das sócias fundadoras. "Elas existem em números, mas são invisíveis", refere por sua vez a psicóloga social Lígia Amâncio, catedrática do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa, em Lisboa, e outra das fundadoras da Amonet.

Exemplos da sub-representação das mulheres em lugares de decisão não faltam, mas há um caso paradigmático relatado na página na Internet da associação (http://www.dq.fct.unl.pt/qoa/amonet.htm ) e que, de certa forma, levou à criação da Amonet.

Em 2003, as comissões de avaliação das licenciaturas de Ambiente e de Química (nomeadas pelo Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior) não tinham uma única mulher - "apesar de, nestes campos, mais de 50 por cento dos docentes e investigadores serem mulheres", lê-se. "Quase todas as restantes comissões de avaliação de licenciaturas de áreas científicas apresentavam distorções inaceitáveis, na sua composição, relativamente a uma justa representatividade de mulheres."

Rosa Paiva dá também o exemplo de só haver duas reitoras em Portugal, nas universidades de Aveiro (Maria Helena Nazaré) e Aberta (Maria José Ferro Tavares).

Para acabar com situações deste género, e também fomentar a participação das mulheres na ciência e tecnologia e aumentar a sua visibilidade, 16 investigadoras, quase todas catedráticas, juntaram-se para criar a associação, que recebeu o nome de uma deusa do Baixo Egipto. Geradora do vento Norte, a deusa Amonet soprava sabedoria nas mentes das elites e dos governantes.

"Sentimos a responsabilidade de contribuir para que não se continuasse a desperdiçar uma parte importante dos recursos", diz Rosa Paiva.

Homens também são bem-vindos

Entre os objectivos da Amonet está a realização de estudos sobre estas questões e a apresentação de propostas de diplomas, ou a alteração de legislação, para se obter igualdade de direitos e oportunidades entre homens e mulheres. Promover o debate sobre a situação das mulheres cientistas, divulgar os seus direitos e denunciar formas de discriminação são também objectivos, tal como o intercâmbio com outras organizações portuguesas e internacionais.

"Portugal era dos poucos países da Europa e do mundo desenvolvido cientificamente onde não existia uma associação de mulheres na ciência, tecnologia e engenharia. Países como Espanha, França, Inglaterra ou Alemanha têm, há muitos anos, associações que se preocupam especialmente com a situação das mulheres em carreiras técnico-científicas", sublinha Rosa Paiva.

Não se pense que na Amonet os homens não têm lugar. "De modo algum", diz Rosa Paiva. Podem tornar-se membros agregados, tal como mulheres que trabalham em ciência há menos de cinco anos, associações de cientistas ou qualquer pessoa que defenda estas causas. Mas para pertencer à Amonet como membro efectivo, com capacidade eleitoral, é necessário ser-se investigadora, portuguesa ou residente em Portugal, em qualquer domínio científico, incluindo as ciências sociais, há pelo menos cinco anos.

Para já, a Amonet planeia organizar um encontro internacional de mulheres cientistas, no início do próximo ano em Lisboa. Para a apresentação pública de hoje, veio Marina Marchetti, da Unidade Mulheres e Ciência da Direcção-Geral de Investigação da Comissão Europeia. De resto, a Comissão Europeia considera a luta contra a falta de visibilidade das mulheres na ciência uma prioridade.

Para Lígia Amâncio não parece difícil explicar por que poucos se lembram do nome de uma mulher cientista. "São eles que estão à frente das instituições. Elas não estão na gestão da ciência, dos laboratórios." Por isso, quando alguém contacta com uma instituição científica é com o responsável que fala - ou seja, geralmente com um homem.

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