Empresa brasileira prevê investir em fábrica de computadores em Ponte de Lima
O presidente da Cobra Tecnologia renova interesse em criar fábrica de computadores na localidade minhota, projecto visto pelo grupo brasileiro como uma oportunidade de entrar na Europa e nos PALOP
O projecto começou por ser contestado pela Associação Portuguesa dos Fabricantes de Equipamentos Informáticos (APFEI) mas, entretanto, o seu andamento ficou em suspenso devido à demissão do anterior administrador executivo, após terem sido apontadas irregularidades contabilísticas e fiscais ao grupo. Leandro Raimundi assumiu o comando do grupo e, por isso, esteve em Portugal há poucos dias para retomar as negociações do projecto.
Com a Universidade ainda não falei mas estive reunido com a API, com o dr. Costa Lima. Mas há intenção de chegar a acordo com a Universidade não só para desenvolver o pólo tecnológico de Ponte de Lima, mas também para ir buscar mão-de-obra qualificada, como engenheiros. Encontrei-me igualmente com o presidente de Ponte de Lima e com um empresário da área das telecomunicações. Vim apresentar-me como novo presidente da companhia e reafirmar o interesse no projecto e a intenção institucional de o promover e de o desenvolver.
Têm surgido dúvidas sobre a viabilidade do projecto...
Acreditamos que o projecto é estratégico e realizável. Nesta fase, vamos começar a desenvolver um estudo de viabilidade, um pré-requisito exigido pela API, e o seu resultado vai dar orientações para contextualizar o projecto. O estudo é também uma exigência do Banco do Brasil, como controlador da Cobra, para poder ter um documento que dê consistência ao projecto.
Quando estará concluído o estudo e arranca a construção do "cluster"?
Acredito que dentro de 60, o mais tardar 90 dias. O prazo inicial aponta para o primeiro trimestre de 2005 mas acredito que só será no segundo semestre.
E se o estudo de viabilidade indicar que o projecto não é viável?
O estudo de viabilidade vai dar-nos apenas a indicação sobre a dimensão do projecto. Nós já temos dados que indicam que ele é viável e é mesmo para arrancar. O cluster poder ser viabilizado com uma maior ou menor dimensão, mas ele viabiliza-se movendo toda a cadeia produtiva. O estudo apenas nos irá dar indicações mais precisas.
Qual é o investimento?
Tudo dependerá da composição do "cluster". Estamos a propor um pólo tecnológico envolvendo fabricação de "hardware", de desenvolvimento de soluções na área de "software" para a área da automação bancária e comercial, com mão-de-obra especializada, engenheiros de "software" e técnicos. Dependendo da composição do "cluster" e de quantas empresas o vão integrar é que se conseguirá definir qual o investimento necessário.
Quais as contrapartidas que vão receber da Câmara de Ponte de Lima (CMPL) e da API?
A Câmara doa o terreno, que fica na zona industrial de Ponte de Lima, que está 90 por cento destinada ao "cluster", e os apoios da API dependem do projecto. O que vai determinar é o contexto do projecto que será definido pelo estudo de viabilidade.
Fica-se com a ideia de que a essência do projecto está ainda numa fase muito indefinida. Pois falar em montagem de computadores é uma coisa, com pouco de estruturante; falar em desenvolvimento de "software" é outra coisa...
A nossa intenção é fabricar "hardware", tanto computadores de secretária como de equipamento de automação bancária (as chamadas ATM) e todo o portfólio de soluções de sistema que suportem essa plataforma. Agora, será o estudo e o perfil do "cluster" que vão determinar quantas empresas podem participar nele, sem haver canibalismo e havendo uma integração e sinergias. E só o porte dessas empresas é que indicará qual o investimento que se irá realizar.
Acordo com a Solbi, o principal fabricante português de PCO que está em discussão é o montante de investimento ou a vinda para Portugal?
A vinda para Portugal é certa. É uma intenção institucional, delineada com o Governo do Brasil e o Banco do Brasil que é nosso accionista maioritário. Já estamos a abrir um escritório em Lisboa, da Cobra Tecnologia, para poder firmar base em Ponte de Lima, e já estamos a fazer trabalho de selecção de fornecedores no Brasil.
Qual a importância estratégica do projecto para o grupo Cobra?
É total: é uma oportunidade que temos de nos instalarmos na Europa, de desenvolver uma estratégia para abraçar os países de língua portuguesa e o Leste europeu, mas também de consolidar o fabrico de equipamento com a marca Cobra.
Está a referir-se aos componentes de equipamento mais simples, como caixas, parafusos...? Porque os mais complexos (processadores, discos, placas gráficas, etc.) vêm inevitavelmente do Oriente, onde há preços mais competitivos... Viabiliza-se uma produção de PC com 50 mil unidades/ano, e uma de ATM com três mil/ano.
Não necessariamente e será o resultado do estudo que o vai determinar.
Existem competências em Portugal para fabricar para além de caixas ou parafusos?
Sim, acho, tanto na área de "hardware" quanto na de "software". A competência existe e vocês têm pólos de desenvolvimento tecnológico nas universidades que permitem fazer um projecto fabril. Exceptuando a questão do processador, os restantes componentes são possíveis de fabricar em Portugal. No Brasil fabricam-se... A ideia é convidar empresas brasileiras a instalar-se em Ponte de Lima, contratando mão-de-obra da região e desenvolver os componentes.
Estão a trabalhar com que consultora?
Ainda com nenhuma, mas uma forte candidata é a Deloitte e pensamos fechar negócio no início de Janeiro. Quem a contratará é o Banco do Brasil.
Os fabricantes nacionais de PC têm-se mostrado preocupados com a vossa vinda para Portugal?
Não vejo como. Existe a possibilidade de alguns fabricantes portugueses virem a integrar o pólo. Existe um acordo com a Solbi, o principal fabricante português de PC. Mas a sua integração no "cluster" vai, mais uma vez, depender do resultado do estudo.
O objectivo do "cluster" é exportar para outros mercados a partir de Portugal?
Em Portugal, não existe procura suficiente para justificar que se produza para o mercado interno. O objectivo estratégico é ter Portugal como rampa de lançamento de produtos para o mercado europeu, nomeadamente o dos novos Estados da União Europeia. É importante desenvolver uma plataforma que atenda os países de língua portuguesa: tem a ver com acordos diplomáticos envolvidos mas também com o interesse estratégico da empresa. Mais de 80 por cento da produção do pólo tecnológico destina-se a exportar a partir de Portugal.
Falou-se na possibilidade de instalar em Ponte de Lima os "call centers" da Varig e do Banco do Brasil...
Em princípio, o "call center" do "cluster" estará centrado no serviço às empresas integrantes do "cluster", no sentido de dar um atendimento de primeiro nível e suporte aos consumidores ou às empresas. Mas depois poderá alargar-se a outras áreas: é tudo uma questão de escala.
Outros projectos da área das tecnologias de informação desistiram de investir na região alegando iliteracia da população. Há seis anos, a Samsung desistiu de investir à última hora, já depois de assinado o convénio com as autoridades portuguesas, porque concluiu que precisava do inglês para comunicar com os trabalhadores. No caso da Cobra, o problema da comunicação básica está resolvido...
Claro e muita coisa mudou entretanto. Há seis anos estavam a sair os primeiros formados da Universidade do Minho.
Como vê as actuais condições de suspensão política que se vive em Portugal?
Discutimos esse ponto quer com a API quer com a CMPL e verificámos que existe uma grande tranquilidade, pois tudo o que está a ser feito é independente do posicionamento político. O país continua, isto apesar da crise política, o que é bom. Na reunião com a API, não nos foi suscitada qualquer questão sobre esse ponto.