BE quer criar comissão para apurar responsabilidades no caso da 2ª Circular
O líder do partido na Assembleia Municipal de Lisboa entende que “há muitas perguntas por responder” e sugere um prazo de três meses para a conclusão dos trabalhos. Medina diz não ter qualquer indício de falhas dos serviços.
Por acreditar que “há muito que é preciso explicar” sobre o caso, o Bloco de Esquerda propõe que seja criada, na Assembleia Municipal de Lisboa, uma “comissão eventual de inquérito à empreitada de requalificação da Segunda Circular”. O objectivo, explica Ricardo Robles, é que “sejam apuradas todas as responsabilidades, todos os factos, todos os intervenientes, todos os responsáveis” deste processo.
A proposta foi apresentada esta terça-feira na assembleia municipal e deverá ser discutida na próxima semana em conferência de representantes. Aquilo que o BE sugere é que a referida comissão inclua representantes das dez forças políticas representadas neste órgão municipal e desenvolva o seu trabalho, de “apuramento dos factos que levaram à anulação do concurso público da Empreitada de Requalificação da Segunda Circular”, durante três meses.
“A transparência e a responsabilidade não podem apenas ser invocadas, têm que ser exercidas”, sustentou o bloquista Ricardo Robles, acrescentando que “compete” à assembleia municipal “a responsabilidade e a transparência de fiscalizar o executivo municipal”. “E o que se passou na Segunda Circular exige o nosso empenho nisso”, rematou.
O líder da bancada bloquista considera que “há muitas perguntas por responder” neste processo. Entre elas, enunciou, a de saber se a Consulpav (a empresa que foi consultora da obra e que está no centro desta polémica) é de facto fornecedora do pavimento que ia ser utilizado, se tinha capacidade para o fornecer para a totalidade da empreitada, se o vendia em exclusividade e se foi ela que forneceu o material em causa para o troço já em construção.
Ricardo Robles quer também ver esclarecido “quem definiu o caderno de encargos”, “quem aceitou o material alternativo em questão”, se o júri do concurso ouviu a Consulpav antes de concluir o relatório em que recomendava a anulação do concurso e se não era possível manter o procedimento excluindo a empresa de ser fornecedora.
A proposta do BE levantou dúvidas à assembleia municipal, incluindo à sua presidente. “Não está previsto nas nossas competências a criação de comissões de inquérito”, afirmou Helena Roseta, defendendo que é preciso esclarecer se a iniciativa agora sugerida “tem enquadramento legal ou não”.
Mais taxativo foi o socialista Pedro Delgado Alves: “Existem competências às quais esta assembleia municipal está adstrita. E realizar comissões de inquérito é algo que não resulta nem do regimento nem da lei e não é uma função de um órgão municipal como uma assembleia municipal”, afirmou, acrescentando que “há possibilidade, obviamente, de obter todos os esclarecimentos junto do município” sobre a Segunda Circular.
Face a essas intervenções, o BE acabou por deixar cair a expressão “comissão de inquérito” da sua proposta, recentrando-a na criação de uma “comissão eventual”. Esta última figura está prevista no regimento da assembleia municipal, no qual se estipula que as comissões eventuais “são constituídas para a prossecução de um objectivo determinado, extinguindo-se quando o mesmo seja concluído”.
Na reunião desta terça-feira ouviram-se várias vozes em defesa da decisão do presidente da câmara de anular o concurso para a requalificação da Segunda Circular entre o Nó da Buraca e o Aeroporto. Entre elas a de Ana Gaspar, dos Cidadãos Por Lisboa, que elogiou Fernando Medina porque este “ousou ser transparente e dizê-lo muito claramente a toda a população”.
“Temos felizmente um presidente de câmara que ousa ir à televisão e dizer houve um erro, suspende-se e será julgado”, disse a deputada. “Nós chamamos a isto transparência, chamamos a isto a beleza da poesia do que fazemos diariamente”, acrescentou, concluindo a sua intervenção com um entusiástico “bravo”.
Já José Leitão, líder da bancada do PS, sublinhou que a requalificação da Segunda Circular “é um projecto extremamente importante para a cidade”, mas salvaguardou que “as obras não podem ser feitas a qualquer preço e de qualquer maneira, ao preço da idoneidade e seriedade dos procedimentos”. Por sua vez Rute Lima, eleita pelo mesmo partido, desdobrou-se em elogios a Fernando Medina, que em sua opinião agiu com “máxima e inequívoca responsabilidade, coragem e seriedade”.
Pelo CDS, Diogo Moura defendeu que há “suspeições, indícios” que “devem ser investigados” e que “é preciso apurar responsabilidades” neste processo, mas aconselhou também “prudência”. Em nome do PEV, Cláudia Madeira falou numa “confusão total” e acusou o executivo camarário de “falta de rigor”, enquanto Vasco Santos, do MPT, se manifestou preocupado com as indemnizações que a câmara pode vir a ter que pagar.
No encerramento deste debate (que ficou marcado pelo completo silêncio do PSD), Fernando Medina acusou a oposição de “criticar por criticar” e de “dar voz” a quem não ficou satisfeito com a sua decisão de anular o concurso e frisou ter actuado “na estrita defesa do interesse público, seguindo sempre os mais elevados padrões éticos”.
“Não há, de tudo quanto conheço deste processo, algo que possa ser criticável”, afirmou o autarca referindo-se à actuação dos serviços municipais. “Não tenho indício de que tenham tido qualquer falha”, conclui, lembrando no entanto que já determinou a realização de um inquérito interno com vista ao “apuramento cabal dos factos”.