Centeno afasta 35 horas para trabalhadores do Estado com contrato individual

Ministro das Finanças diz que estes trabalhadores exigem uma intervenção distinta. 35 horas implicam custos de 27 milhões para contratar enfermeiros, adiantou.

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António Costa e Mário Centeno defendem "válvula de escape" para redução do tempo de trabalho. Nuno Ferreira Santos

O ministro das Finanças, Mário Centeno, deixou claro nesta terça-feira que os trabalhadores dos hospitais EPE com contrato individual de trabalho não serão abrangidos pela redução do horário semanal de 40 para 35 horas e que no restante sector da saúde será necessário um período de adaptação para que a medida não ponha em causa as finanças públicas, nem a prestação dos serviços aos cidadãos.

A reposição das 35 horas foi o principal assunto debatido durante a audição de Mário Centeno na comissão parlamentar de Trabalho e Segurança Social.

Os deputados do PSD - com Adão Silva a abrir o período de perguntas e respostas - questionaram insistentemente se os trabalhadores com contrato individual seriam abrangidos ou não pelas 35 horas. O ministro acabou por dizer que “a resposta é não e por muitos motivos”. Não explicitou quais, realçando apenas que nem todos os trabalhadores da administração pública fazem 35 ou 40 horas semanais e alertando para a existência de tempos normais de trabalho diferenciados em várias carreiras. Antes, já tinha alertado que os trabalhadores com contrato individual de trabalho requerem “um tipo de intervenção completamente distinto daquele que estamos a falar para os trabalhadores em funções públicas”. Centeno lembrou que os trabalhadores com contratos ao abrigo do Código do Trabalho são uma situação que afecta sobretudo os hospitais empresa, acrescentando que eventuais alterações ao horário de trabalho terão de ser discutidos noutro contexto.

Na origem das perguntas está o texto legislativo que os deputados do PS apresentaram na sexta-feira no Parlamento e que apenas “estabelece as 35 horas como período normal de trabalho dos trabalhadores em funções públicas”. Ou seja, por lei, apenas os funcionários com contrato de trabalho em funções públicas terão acesso às 35 horas a 1 de Julho. Mas no caso dos serviços com falta de pessoal, há uma norma transitória que prevê que o horário reduzido entre em vigor de forma faseada até ao final do ano.

Este entendimento é contrário às propostas que o PCP e o BE entregaram na Assembleia da República e que pretendem que as 35 horas abranjam todos os trabalhadores do Estado, independentemente do tipo de vínculo.

O BE questionou o ministro sobre a entrada em vigor do diploma das 35 horas nos serviços com carência de pessoal, nomeadamente na saúde e em particular na carreira de enfermagem. “Ao longo da discussão pública, 1 de Julho foi aparecendo como uma data consensual para a entrada em vigor [das 35 horas]. A maioria dos funcionários tem essa certeza, mas há um sector que não tem essa certeza. Falo do sector da saúde e falo dos enfermeiros e dos funcionários da saúde que trabalham por turnos”, destacou a deputada Joana Mortágua. “O que respondemos a estas enfermeiras e a estes enfermeiros? As 35 horas são também para elas e para eles ou não são”, perguntou.

Aqui Mário Centeno evitou uma resposta de sim ou não, preferindo destacar que será necessário um período transitório “que não ponha em causa do ponto de vista financeiro e dos serviços a transição sustentável para as 35 horas", frisando que será necessário explicitar a norma transitória.

Mais tarde, na segunda ronda de perguntas, Mário Centeno deixou a sua interpretação dessa norma, sublinhando que ela permite que haja "instrumentos de gestão do lado do Governo para acautelar um efeito potencial indesejável que pode comprometer a aplicação com sucesso da medida, o que ninguém deseja".

Já durante a manhã o primeiro-ministro tinha explicado que a existência de uma "válvula de segurança" tem como objectivo “pontualmente proceder a ajustamentos de horário em serviços em que, por dificuldades concretas de contratação de pessoas necessárias, esteja em causa a continuidade e qualidade dos serviços prestados aos cidadãos".

Instado pelo PSD e pelo CDS a divulgar os resultados do inquérito feito aos serviço para avaliar o impacto das 35 horas, Centeno acabou por reconhecer que é necessário harmonizar a metodologia para poder somar os dados recolhidos. Mas adiantou que o sector da saúde é “de longe” aquele onde o impacto é maior. “Os custos de contratação de enfermeiros no segundo semestre do ano seriam de 27 milhões de euros”, exemplificou.

O horário de trabalho na função pública aumentou de 35 horas para 40 horas semanais em Setembro de 2013, sem o correspondente aumento de salário, uma decisão do Governo PSD/CDS-PP viabilizada pelo Tribunal Constitucional.

Neste momento estão em discussão na especialidade quatro projectos de lei do PS, PCP, BE e PEV para a reposição das 35 horas. A votação final global ficou marcada para dia 27 de Maio.

Novo recenseamento de funcionários operacional em 2017

Durante a audição parlamentar, o ministro adiantou ainda que o recenseamento da Administração Pública vai avançar em 2017.

Neste momento está a ser preparada uma candidatura por parte da Direcção-Geral da Administração e o Emprego Público e a intenção é que no próximo ano “esteja em funcionamento uma evolução do actual SIOE [Sistema de Informação da Organização do Estado] de carácter censitário”, explicou.

No Orçamento do Estado para 2016, o Governo promete fazer um recenseamento da Administração Pública para saber quantos funcionários públicos existem, quanto ganham, as suas qualificações individuais, quantas horas trabalham e a forma como se organizam as suas carreiras.  

Em cima da mesa esteve ainda a nomeação dos dirigentes públicos, com o BE a criticar a Cresap e a classificar os actuais concursos como uma "cortina de fumo", e o aumento do número de trabalhadores do Estado no primeiro trimestre do ano, com o CDS a questionar o ministro sobre como irá conciliar mais funcionários com as 35 horas e com a promesa de que não haverá aumento das despesas com pessoal. "Como é possível fazer esta quadratura do círculo", questionou o deputado António Carlos Monteiro.

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