Único banco público de gâmetas não tem sémen de dadores negros
Serviço está no Porto, enquanto a maior comunidade de origem africana se situa em Lisboa, observa dirigente da Associação Portuguesa de Fertilidade
O único banco público de gâmetas em Portugal não dispõe de sémen de dadores negros, revelando-se incapaz de ajudar os casais que já o solicitaram para poder ter filhos.
Criado em Maio de 2011 na maternidade Júlio Dinis, no centro hospitalar do Porto, o banco público de gâmetas já ajudou a nascer 74 crianças. Os gâmetas são angariados através de dadores de óvulos e espermatozóides, que para tal recebem uma compensação financeira definida por lei. Os beneficiários são seguidos no centro de Procriação Medicamente Assistida.
O banco foi criado com o objectivo de os gâmetas serem disponibilizados não só aos utentes do centro hospitalar do Porto mas sim a todas as instituições públicas que o solicitassem - o que ainda não acontece. Desde o início que o banco se tem deparado com dificuldades na obtenção de dadores, sendo que estes têm de obedecer a uma série de critérios. Além disso, este material genético necessita de ficar em "quarentena" antes de poder ser usado.
Até ao momento, não foi recolhida, armazenada ou disponibilizada qualquer amostra de dadores negros, diz a responsável do banco, Isabel Sousa Pereira. Por esta razão, sempre que o banco foi procurado por casais negros - ainda assim poucos casos - não pode responder positivamente à solicitação.
A presidente da Associação Portuguesa de Fertilidade, Cláudia Vieira, lamenta a situação. "O facto de haver uma resposta mais deficitária para os casais de raça negra coloca-os ainda mais no final da lista", observa, adiantando que existe dificuldade na angariação de dadores, matéria que vai merecer da parte da associação que dirige especial atenção durante este ano. Segundo Cláudia Vieira, "os poucos [dadores] que são seleccionados após o processo de triagem não chegam para a procura".
Por outro lado, a comunidade de origem africana é menor no Porto do que, por exemplo, em Lisboa, o que dificulta ainda mais as doações, uma vez que o banco de gâmetas está no Norte, acrescenta. Cláudia Vieira frisa que o problema penaliza ainda mais quem não tem capacidades financeiras, pois só recorre a este banco quem está a fazer tratamentos no sector público, enquanto no privado há disponibilidade de todo o tipo de gâmetas, que são importados. “Em todo este processo de tratamento da fertilidade o factor dinheiro é preponderante”, sublinha Cláudia Vieira.
Um estudo sobre o recurso a gâmetas de dadores, que envolveu mais de 1500 adolescentes, revelou em 2013 que os jovens portugueses estão pouco predispostos a doarem óvulos e espermatozóides, apesar de aceitarem esta técnica. Mesmo assim, "os resultados revelaram uma baixa predisposição dos adolescentes, quer para recorrer no futuro a dadores, caso necessitem, quer para serem dadores".