Erro do MP condicionou processo em que ex-secretário de Estado foi absolvido

Procuradora exigia condenação de Francisco José Viegas por não ter entregado declarações de rendimentos e património em 2007, 2008 e 2009. Supremo lembra que então o escritor ainda nem tinha chegado ao Governo.

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Ex-governante invocou "questões de saúde" para não ter entregado a declaração a tempo Nuno Oliveira

A procuradora pretendia que José Viegas fosse condenado a uma pena até cinco anos de inibição do exercício de cargos públicos sujeitos à entrega daquelas declarações, a que estão obrigados os titulares de cargos políticos. Viegas foi repetidamente absolvido. Só depois de o processo subir até ao Supremo Tribunal Administrativo é que a incorrecção foi detectada. Os juízes, no acórdão ao qual o PÚBLICO teve acesso, não vislumbraram, contudo, um “erro”. Consideram que o MP pretendia antes uma “alteração substancial” que implicaria “uma mudança da imputação temporal” e da “omissão assacada”.

Não acolheram, por isso, o apelo do MP. “Lapsos de escrita”, disseram, são apenas aqueles notados de forma “ostensiva”. Aliás, os juízes consideraram que o MP denunciou o próprio erro “em desespero de causa”. Antes, confrontada com a impugnação do ex-secretário de Estado, a procuradora nem o invocou. Questionada pelo PÚBLICO, a Procuradoria-Geral da República não comentou o caso. Também o TC não quis comentar “decisões de outros tribunais”.

O desfecho do caso resulta na absolvição formal de Francisco José Viegas, mas o seu advogado, Nuno Dente, sublinha que, na verdade, restará sempre uma dúvida “que não é boa” para o ex-governante e escritor. “Nunca se saberá se ele seria ou não absolvido”, não tivesse existido a falha do MP. Os factos não chegaram a ser analisados pelos juízes. Viegas argumentava questões pessoais e de saúde para não ter apresentado em tempo a declaração que entregaria depois no final de 2013.

“Esse erro reduziu as garantias de defesa de Francisco [José Viegas] que sempre entregou todas as declarações. Estava em causa apenas aquela, relativa ao tempo da sua cessação de funções. E, mesmo nesse caso, a declaração que entregou no início do ano em nada era diferente daquela que tinha de entregar”, realçou o advogado.

“Razões de saúde” ditaram saída
O actual editor no grupo Bertrand abandonou a tutela da Cultura no Governo de Passos Coelho em Outubro de 2012, alegando “razões graves de saúde”. Foi já no recurso para o Supremo que o MP “reconheceu que cometeu um erro de escrita quando na sua petição inicial acusou” o ex-secretário de Estado “pela prática de uma ilegalidade com fundamento na falta de declarações relativas aos anos de 2007, 2008 e 2009.

O Supremo não teve outra opção senão considerar que os factos imputados ao escritor não foram provados. “O secretário de Estado da Cultura iniciou funções em 2011 e não em 2007 como alegou o MP” e a “cessação das funções ocorreu em 2012 e não em 2009”, criticaram os juízes, apontando as discrepâncias óbvias entre as alegadas declarações em falta” e o “verdadeiro e único incumprimento na apresentação da declaração”.

No acórdão, os juízes do Supremo Tribunal Administrativo avisam ainda o MP de que não lhes caberia “indagar” se a “acção administrativa” se referia a outros anos e corrigi-la. O processo terminou, então, com os juízes da secção de contencioso administrativo do Supremo a rejeitar o recurso do MP, mantendo a decisão das duas anteriores instâncias judiciais.

A acção do MP ficou marcada ainda por outras divergências. A procuradora garantia que o antigo governante foi “notificado em Maio de 2012” para apresentar a declaração. Viegas, que teve de apresentar provas de só ter exercido o cargo entre 2011 e 2012, garantiu no processo só ter sido notificado em Maio de 2013. Insistiu ainda que faltou “sem culpa” à entrega.

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