Registados 71 casos de agressões a condutores que trabalham com a Uber
Números contabilizam episódios ocorridos desde o início de 2015. Em Lisboa a PSP registou 22 casos de agressões e de danos o ano passado e mais seis até final de Fevereiro deste ano. O PÚBLICO foi ouvir os homens e as mulheres que habitualmente não têm voz nesta “guerra”.
Desde o início do ano passado, foram reportados às autoridades pelo menos 71 casos de agressões a condutores que trabalham com a multinacional norte-americana Uber em Lisboa e no Porto, as duas cidades onde a empresa opera em Portugal. A maior parte terá sido cometida por taxistas, uma classe que, nesta segunda-feira, arranca com uma semana de luta contra a actividade da Uber em Portugal e contra o Governo que dizem “nada fazer para travar” a plataforma “ilegal” e “criminosa”.
O ano passado a PSP contabilizou em Lisboa 22 denúncias “por ameaças e agressões a condutores e danos” nas viaturas disponíveis através da plataforma digital, a que acrescem mais seis casos ocorridos até final de Fevereiro passado. No Porto, a PSP só conseguiu recolher dados entre o início do ano e a passada sexta-feira. Nesse período, foram registados 11 casos de danos em viaturas, duas agressões e uma ameaça.
Um porta-voz do comando metropolitano do Porto admite, contudo, que estes números podem pecar por defeito, já que alguns dos casos noticiados como envolvendo parceiros da Uber não incluem nos respectivos autos qualquer indicação a essa empresa, não sendo, por isso, integrados nesta estatística.
A própria empresa tem números mais gravosos, contabilizando 43 inquéritos-crime por agressões ocorridas apenas no Porto. São processos instaurados desde Janeiro de 2015 até ao passado mês de Fevereiro. Na passada segunda-feira, o Jornal de Notícias revelou que o director europeu da Uber, o holandês Rob van der Woude, apresentou uma queixa na Procuradoria-Geral da República contra casos de violência de taxistas a motoristas que trabalham com a plataforma. Na queixa, o director apresenta uma lista de 43 inquéritos referentes a agressões ocorridas no Porto.
Estes casos, somados aos 28 registados em Lisboa desde o início do ano passado, permitem chegar aos 71 casos de agressões.
"Ao longo das últimas semanas e meses temos assistido a uma escalada de violência de motoristas de táxi para com motoristas ligados à plataforma da Uber e, por vezes, também para com utilizadores", diz Rob van der Woude na queixa cuja existência o PÚBLICO confirmou.
O director da empresa teme que, “dada esta situação e a evolução ao longo das últimas semanas” estes casos “se possam agravar e tenham consequências mais severas para motoristas, utilizadores e público em geral”.
A “guerra” entre o sector do táxi e a empresa do aplicativo para dispositivos móveis que coloca os utilizadores em contacto com os automóveis de passageiros com condutor dura praticamente desde que a empresa chegou a Portugal, em Agosto de 2014. Isto apesar de o PÚBLICO ter detectado casos de taxistas que são donos de empresas que trabalham com a Uber.
Os taxistas já fizeram uma marcha lenta que quase parou Lisboa e o Porto, já fecharam a praça de táxis do aeroporto alfacinha durante toda uma tarde, já tiveram várias reuniões com o actual e anterior Governo, já foram para os tribunais e não conseguiram travar a plataforma que opera em diversos países. Uma providência cautelar intentada pela Associação Nacional dos Transportadores Rodoviários em Automóveis Ligeiros (Antral) contra a Uber Technologies Inc, a empresa mãe que opera apenas nos Estados Unidos, proibiu aquela empresa de prestar serviços em Portugal. Tal nunca impediu outra empresa do universo Uber, com sede na Holanda, de continuar a operar em Portugal. Mesmo assim a Uber Technologies Inc recorreu, esperando-se uma decisão do Tribunal da Relação de Lisboa.
Conforme crescem os protestos dos taxistas, mais cresce a Uber. Em Agosto de 2014 começou com meia dúzia de carros na UberBlack, que opera com carros topo de gama. Em Dezembro lançou a Uberex, mais barata que a Black, com automóveis de gama média, mas com matrículas recentes.
Em Setembro do ano passado, quando da primeira marcha lenta em Lisboa e no Porto, a aplicação da Uber foi a mais descarregada do dia em Portugal na App Store da Apple. Nos dias que se seguiram ao protesto foram tantos os pedidos de carros que era quase impossível apanhar um Uber.
Segundo os responsáveis da plataforma em Portugal, hoje operam em Lisboa e Porto cerca de mil carros de empresas, a maior parte de operadoras com licença do transporte de turistas e de alugar de automóveis, que prestam serviço à Uber. No total, ainda segundo a empresa, já foram realizadas em Portugal mais de um milhão de viagens.
Em Junho do ano passado, deu entrada na Assembleia da República uma petição pública com cerca de 10.500 assinaturas a pedir a discussão pública no Parlamento para impedir que o transporte privado concorrente dos táxis seja impedido de operar no país.
Os clientes dizem-se satisfeitos com um serviço porta a porta, que opera com carros novos, bem cuidados, com uma maioria de motoristas simpáticos e com um serviço que pode mesmo sair mais barato que uma corrida de táxi em igual percurso, especialmente se se tiver de pagar o serviço de bagagem ou a chamada telefónica.
Com a Uber a crescer e os táxis a perderem serviço, cresce a revolta no sector. E no meio dos protestos algo de grave tem vindo a acontecer. Há quem não se tenha ficado pelas palavras e partiu para as agressões e ameaças.
Em Lisboa um taxista já foi condenado em tribunal por ter sido apanhado em flagrante pela polícia a cortar os pneus de um carro ao serviço da Uber. Em Lisboa e no Porto há varias notícias de agressões a motoristas da plataforma. No Porto ainda no final de Março passado houve mais uma notícia de um motorista que viu o seu carro apedrejado por taxistas e teve de receber tratamento hospitalar.
Os dirigentes das associações representativas do sector dos táxis – a Antral e Federação Portuguesa do Táxi (FPT) – já por diversas vezes vieram a público condenar estas agressões e dizem até “temer” que, dada a “enorme revolta entre os taxistas, algo mais grave possa vir acontecer”. Se tal suceder, afirmam que a responsabilidade “será do Governo que nada faz para acabar com a ilegalidade que está a matar o sector.”
“Condenamos vivamente estas atitudes, mas, de alguma forma, até as entendemos porque a revolta é muito grande. Por outro lado, há provocações dos motoristas da Uber, como carregarem as pessoas junto a praças de táxis. Quem não se sente, não é filho de boa gente…”, disse ao PÚBLICO António Florêncio, presidente da Antral.
As vítimas directas desta guerra entre o sector dos táxis e a Uber são os motoristas ao serviço das empresas associadas à plataforma. Homens e mulheres trabalhadores por contra de outrem, muitos deles a recibos verdes, que encontraram nesta empresa uma oportunidade de trabalho. Muitos vivem em pânico nas horas em que andam agarrados ao volante.
Alguns já foram agredidos ou ameaçados, outros vivem os dias com ansiedade. O clima de tensão em que vivem, faz com que só aceitem contar as suas experiências sob anonimato e sem imagem.
A filha de Fernando pede-lhe “cuidado”
“O senhor já percebeu que está a ser conduzido num carro eléctrico?”, pergunta Fernando, 56 anos, pouco tempo depois de o cliente entrar no carro, um Toyota Yaris com matrícula de 2014.
O motorista fala entusiasmado deste “transporte ecológico que dentro de pouco tempo vai acabar com os carros a gasolina”, mas só aceita falar sobre a sua experiência na Uber se o seu apelido não for revelado. “Já tive problemas que cheguem”, diz.
Este antigo professor de educação física e mais recentemente proprietário de um pequeno café “que fechou com a crise”, estava no desemprego e “já nem subsídio recebia” quando, há cerca de nove meses, um amigo lhe falou na possibilidade ir trabalhar para uma empresa que presta serviço para a Uber. Foi à entrevista na empresa e ficou. Está satisfeito, tem um “ordenado satisfatório”, mas vive “com medo todas as horas” que está “ao volante”.
“Estou sempre à espera de uma desgraça”, diz, que pode vir “de um taxista violento dos muitos que para aí andam”. “Não são todos, conheço gente muito séria que anda nos táxis e que nem sequer está preocupada com a Uber, mas há alguns…”
Fernando já foi “atacado duas vezes”. Na primeira, recebeu um pedido para o Bairro Alto e quando chegou ao local indicado na aplicação dois homens chegam-se ao carro. “Um deles entrou para o lugar da frente e com uma pedra deu uma mocada no telemóvel” colocado no tablier, junto ao volante e com a aplicação da Uber ligada. Com medo, diz ter “arrancado repentinamente”, projectando o agressor para o chão”. Parou para o ajudar, mas “o outro homem correu para o carro aos gritos”. Fugiu, “sem mazelas, mas em pânico”. Na segunda, já em Março deste ano, não houve agressões. “Fui ameaçado de levar uma tareia junto a um hotel em Lisboa, se voltasse ao local, e os dois estrangeiros que tinham acabado de entrar para o carro foram expulsos da viatura.”
Em nenhuma das ocasiões apresentou queixa junto das autoridades. “Para quê? Não sei quem eles são, não ia dar em nada e só ia perder tempo.”
Já pensou desistir, mas não encontrou alternativas. “Ando aqui a medo todo o dia, mas o que posso fazer, preciso do dinheiro lá para casa. Tenho uma filha de 10 anos para criar.” Há algo que diz custar-lhe: “Sabe o que é sair de casa e ouvir a minha filha dizer ‘tem cuidado com os inimigos’ e eu ter de lhe explicar que não há inimigos, apenas algumas pessoas más, mas que a maioria são boas? Dói muito.”
A oportunidade de futuro de Miguel
Quando comprou um Volkswagen Golf a gasóleo, em 2014, Miguel nunca pensou que o investimento seria a porta de entrada num novo negócio: o transporte turístico.
Decidira abrir uma confeitaria, no Porto, e, por isso, comprara o carro. Mas dois assaltos abalaram a sua fé no negócio e fizeram-no desistir. Andava à procura de uma oportunidade e, em Fevereiro, a Uber abriu-lhe a porta. Ou melhor, quem lhe abriu a porta foi um empresário, associado da multinacional norte-americana, que o contratou como condutor no Porto.
Miguel, 27 anos, com um curso profissional de técnico de informática, gostou da experiência, mas vicissitudes várias levaram-no a prescindir dos intermediários. Montou em Março uma empresa e lançou-se numa parceria com a Uber.
No balanço, só lamenta o excesso de burocracia. Foi obrigado a inscrever-se como Agente de Animação Turística, o que implicou a contratação de vários seguros (acidentes pessoais, responsabilidade civil e assistência a pessoas). “Gastei nos seguros anuais cerca de 1300 euros”, contabiliza.
Pouco mais de um mês após ter criado a empresa, faz um balanço positivo do negócio. E confessa que já paira no horizonte a compra de um novo carro. Neste momento, faz um turno diário de 12 horas, das 8h às 20h, hora em que é rendido por um jovem que contratou por 650 euros/mês para conduzir a outra metade do dia. Um dia normal, só à sua conta, rende-lhe entre 50 a 60 euros, mas num bom sábado o valor pode chegar aos 150. Desde meados de Março até 20 de Abril já arrecadou 3500 euros. “Ilíquidos”, faz questão de frisar. Mesmo assim, dá para pagar a prestação do carro, o gasóleo, os seguros e ficar com um bom salário.
Por isso, defende a multinacional com unhas e dentes. “Está a dar emprego a muita gente e pode representar um futuro para muitos jovens”, sustenta, lamentando a guerra declarada pelos taxistas.
No currículo das peripécias, uma vez foi identificado pela polícia, após a queixa de um taxista. Não tem grandes episódios para contar. Cauteloso, evita algumas “zonas quentes”, como passar em frente aos taxistas na Estação de Campanhã, no Porto. “Prefiro deixar os clientes na porta de trás ou apanhá-los um pouco mais à frente”, exemplifica.
A conversa permitiu-nos ir do centro do Porto até ao Aeroporto Francisco Sá Carneiro, na Maia, e voltar. Demorámos 57 minutos para fazer 32,7 quilómetros em hora de ponta. Feitas as contas, pagámos 28,23 euros pela viagem. Miguel ficou com 21,22 euros e a Uber com 7,01.
A miúda que não tem medo
Tem 21 anos e adora conduzir. Começou a trabalhar muito jovem, aos 19 anos, após concluir o 12º ano. Passou pela restauração, mas resolveu “experimentar algo novo” e agarrou com as duas mãos a oportunidade que, há cerca de seis meses, lhe foi dada por uma empresa de turismo associada à Uber.
Carolina conduz com à vontade um Renault Captur com matrícula deste ano. Diz estar “muito satisfeita” com uma profissão em que alia o seu gosto pela condução ao contacto “com pessoas muito interessantes e simpáticas”. “Os clientes são cinco estrelas.”
Afirma ser “bem paga”, embora não queira fazer carreira como motorista, até porque tem vontade de voltar à restauração com um negócio próprio.
Carolina pede para que não seja revelado o seu apelido. “Embora não tenha tido qualquer problema, já ouvi muitas histórias e o melhor é ser o mais discreta possível.”
Apesar das muitas histórias que diz ter ouvido de colegas que contam “agressões e ameaças” por parte de taxistas aos motoristas ao serviço da Uber, Carolina diz não ter “qualquer tipo de medo.”
“Se eles [taxistas] vierem falar comigo eu falo-lhes, embora saiba que a comunicação com muitos deles é difícil. Se partirem para ameaças, chamo as autoridades.”
Carolina diz não compreender “esta atitude estúpida e agressiva por parte de alguns taxistas”. “Porque não pedem melhores condições para eles em vez de pedirem o fim da Uber? Porque não impõem regras no seu sector que melhorem o serviço, com carros novos, com motoristas que prestem um melhor serviço, virados para satisfazer o cliente? Será que não percebem que, se a Uber é um sucesso, é porque algo está mal do lado deles?”, pergunta a jovem motorista, que, para já, pretende continuar ao serviço da Uber, “sem medo”.
Rebuçados que podem valer estrelas
No lugar do cinzeiro que serve os bancos traseiros do Mercedes Classe A com matrícula de 2014, está um copo de plástico repleto de rebuçados. “Pode servir-se dos rebuçados, são para os clientes”, diz Bernardo, 26 anos, há cinco meses ao serviço de uma empresa de transporte associada à Uber.
Ter um rebuçado para oferecer aos clientes é uma prática muito usual entre estes motoristas. Tão usual como perguntarem se a temperatura do carro está adequada, se o cliente tem preferência por alguma estação de rádio ou qual o percurso que deseja fazer. Agradar ao cliente contribui para que, no final da viagem, o motorista consiga a melhor nota possível por parte do utilizador.
A prática das notas (de uma a cinco estrelas) é uma das marcas da Uber em todo o mundo. Findo o serviço, o motorista dá estrelas ao cliente e este faz o mesmo em relação ao motorista. Se um motorista é mal avaliado por um cliente, é obrigado a justificar-se perante a empresa. Se as más avaliações forem frequentes, o motorista é mesmo despedido, asseguram vários condutores.
Bernardo trocou um emprego na indústria hoteleira pelo de motorista da Uber. “É mais bem pago e mais tranquilo”, afirma. Embora o salário dependa dos serviços que faz (muitos dos motoristas que trabalham para empresas ligadas Uber ganham à comissão), diz estar satisfeito e até afirma que a sua empresa “é das que melhor paga”.
Não quer ser identificado. “Se puder ser, é melhor não. Já basta os motoristas de táxi que andam a tirar fotografias aos motoristas e às matrículas dos carros da Uber para partilharem no Facebook como se fossemos bandidos.”
Diz já ter sido “ameaçado várias vezes por motoristas de táxi”, mas até agora ainda não foi “vítima de medidas extremas”. “Tenho tido sorte, há colegas meus que já foram perseguidos, os carros apedrejados ou atingidos com ovos. Tudo isto nos causa uma grande ansiedade, medo até.”
Bernardo até admite que os motoristas de táxi “possam ter razão” em algumas das suas revindicações. “Se calhar pagam taxas a mais, se calhar deviam ter o gasóleo mais barato. Mas se é assim, protestem para pedir melhores condições aos governantes que lhes permitam baixar os preços aos clientes. Agora, pedirem para acabar com o trabalho dos outros, agredirem e ameaçarem é inadmissível. A minha empresa paga impostos, eu pago impostos e não são poucos porque ando a recibo verde”, afirma.
Nuno, táxis e Uber ao mesmo tempo
Nuno, 43 anos, é uma espécie de dois em um: tem um táxi na rua e ao mesmo tempo é proprietário de uma empresa de turismo que presta serviço à Uber com duas viaturas, uma na Uberx (o serviço mais barato), com um Toyota Yaris com matrícula de 2014, e outra na Uberblack (o mais caro com carros topo de gama), com um BMW com matrícula do mesmo ano.
Diz ser a prova de que “os táxis e os Uber podem viver lado a lado e ambos ganharem dinheiro”.
Nuno esteve emigrado dez anos em Inglaterra. Foi recepcionista num hotel, o que lhe permitiu “conhecer muito bem o sector do turismo.” Há sete anos regressou a Portugal. Subalugou um táxi (paga uma verba todos os meses ao detentor do alvará) que ainda hoje tem ao seu serviço e abriu uma empresa para transporte de turistas.
Assim que a Uber chegou a Portugal, com a Uberblack, em meados de Agosto de 2014, fez “de imediato uma parceria”. O empresário “sabia que ia ser um sucesso porque já conhecia o que faziam no estrangeiro”.
Também fala sob anonimato. Até agora ainda não teve qualquer problema e espera não vir a tê-los com um sector em que distingue os “motoristas de táxi” dos “taxistas”. “Os ‘motoristas’ de táxi, sejam empregados ou patrões, preocupam-se com o cliente, em prestar um bom serviço com seriedade. Trabalham com carros limpos e em boas condições. Querem ganhar dinheiro, mas de forma honesta.”
Já “os taxistas”, acrescenta, “são os maus profissionais, as maçãs podres, que dão mau nome a todos. “Os ‘taxistas’, na maioria patrões, são os que aproveitam todas as oportunidades para a vigarice. São os que são apanhados pela polícia todas as semanas no aeroporto a enganarem turistas.”
É o serviço no aeroporto que está a motivar “a cegada dos taxistas contra a Uber”. “O aeroporto foi uma mina durante anos, mas foi cometida tanta aldrabice que os turistas já vêm avisados e só não apanha um Uber quem não pode.”
“Quem se quer meter num carro com um tipo que agride pessoas e atira pedras a carros? Quem quer entrar num carro velho, sujo e muitas vezes sem condições para andar na estrada, quando tem um serviço como a Uber e muitas vezes mais barato?”, questiona.
Para Nuno, “os taxistas e os patrões dos táxis que dominam os sindicatos e querem o monopólio têm vistas curtas.” Diz ter uma certeza: “Os motoristas de táxi vão sobreviver e competir sem problemas. Os taxistas vão ‘morrer’, sem terem percebido que foram eles que se ‘mataram’.”
O complemento do negócio de António
A relação de António, 47 anos, com os automóveis nasceu da paixão. E essa paixão, associada à necessidade, fez nascer um negócio. Este gestor de empresas que já foi quadro da Sonae (proprietário do PÚBLICO) dedicou-se ao negócio do transporte privado de passageiros e ao transporte turístico há dois ou três anos no Porto, ainda não se vislumbrava a Uber no mercado nacional. A plataforma surge como um complemento de um negócio que deixa, muitas vezes, horas mortas, explica. A facilidade de se ligar à Uber apenas quando lhe é conveniente encaixa como uma luva na estratégia da sua empresa. De manhã tem clientes particulares, que lhe pagam avenças, para os levar diariamente ao local de trabalho, assegura os regressos a casa e outros serviços especiais para hotéis, empresas e afins. Faz igualmente visitas turísticas ao Douro e ao Minho. Sempre para um público exigente, que procura um serviço personalizado.
Neste momento, a empresa tem dois carros. António conduz um deles e contratou um motorista para guiar o outro. Normalmente, só o empresário trabalha com a Uber. Chateia-o não poder dar a cara. “Sinto-me como se estivesse na clandestinidade, apesar de pagar todas as licenças e de ter todos os seguros que a lei exige”, sublinha. E as exigências não são poucas, diz. “Todos os condutores têm que entregar a cada três meses uma cópia do registo criminal”. Contrariamente ao que acontece noutras actividades similares, aqui ninguém foge aos impostos. Todos os serviços são obrigatoriamente facturados, mesmo que o cliente não o exija, o valor cobrado é debitado automaticamente no seu cartão de crédito. Mal o serviço é concluído, a plataforma emite a factura - em nome da empresa parceira que prestou o serviço e não da Uber - e a mesma é enviada para o email do cliente. “Tudo transparente, como eu gosto”, sublinha.
No final do ano passado, foi barrado por três taxistas junto à Estação de Campanhã, no Porto. Estava a apanhar uns clientes e foi impedido de prosseguir. Outros taxistas vieram com ameaças e insultos. Valeu-lhe a cabeça fria e a experiência. Chamou a polícia. A PSP identificou os oito taxistas, mas António não pensa avançar com uma queixa-crime. “Não houve consequência de maior”, justifica. Desde então, aguçou as medidas preventivas e recusa apanhar clientes naquela estação. Aos contestatários, deixa uma pergunta: “Porque é que há clientes que preferem andar meio quilómetro até um Uber do que apanhar um táxi, logo ali?”