No saco e no papo
Ter no saco e no papo é impossível.
A ganância de ter, ao mesmo tempo, alguma coisa no saco e no papo corresponde à deliciosa mas contraditória ambição que, na língua inglesa, é having your cake and eating it too. Em ambas as línguas começa-se pelo mais difícil, que é arranjar um bolo (ou outra coisa óptima) que apeteça logo comer e, comendo, diminuir.
Não sei de onde vem o saco dos portugueses. Terá algo que ver com a figura do “homem do saco” que assustou gerações inteiras de crianças portuguesas já aterrorizadas pelo facto de terem nascido?
O “homem do saco” levava as crianças que se portavam mal. Lembro-me de ser criança e de rezar a Deus que se enganasse e, em vez de mim, levasse uma criança que se tivesse portado bem.
Um exemplo: descobri em Janeiro deste ano umas deliciosas e saudáveis tostas francesas de trigo sarraceno que deixam brilhar os queijos (sobretudo os franceses) muito mais apagadamente do que qualquer pão. Dei assim comigo a bradar que não só são caras essas tostas (3 euros por 24 peças), como é quase impossível comprá-las, porque nunca há. É uma queixa com a mesma perversa glória de quem insulta um restaurante por servir refeições que, para além de serem mal cozinhadas, são servidas em doses miseráveis.
“É caro e, para mais, é impossível de comprar” é a versão século XXI do “é horrível e, para mais, é mal servido”. Ter no saco e no papo é impossível. Mas todos nós nos portamo estupidamente como se fosse a melhor coisa que nos pudesse acontecer.