Intervir é preciso, assistir não é preciso

Esperará o canil de Sintra que aconteça um incidente para depois justificar o abate dos animais?

1. Pertenci ao grupo de pessoas que, antes das eleições de 4 de Outubro de 2015, reflectiu seriamente sobre o significado de voto útil e daí a opção de votar PS, a que se seguiu o profundo receio de que o meu voto, assente no forte desejo de mudança, fosse de novo entregue, por imposições, internas e externas, à tenebrosa dupla Passos Coelho/Paulo Portas. E “tenebrosa” é o termo correcto, precisamente pelo carácter destruidor, numa postura de regozijo, que caracterizou a sua governação.

As eleições de 4 de Outubro foram pois encaradas como a ponte de salvação que poderia libertar-nos de um discurso vazio e de um constante espezinhar de valores, que chamava justiça à clamorosa falta de justiça e verdade à mais desenfreada mentira. Tudo agravado pela imensa corte de comentadores e jornalistas “voz-do-dono”, incapazes de imparcialidade e exclusivamente apostados na defesa do indefensável ou no silenciamento do que não devia ser lembrado, numa falta de pudor exasperante que ainda se mantém. Como esquecer os complementos de reforma retirados aos reformados do Metro e da Carris, ou as mentiras sobre os refugiados que não queriam vir para Portugal, ou a escravatura de horários de trabalho, ou os subsídios de desemprego cortados em tempo record, ou a rapidez do processo da privatização da TAP ou tantas outras situações, pondo à prova a nossa capacidade de resistência para tanto evento ultrajante. Aplaudi por isso a decisão do PS em concretizar acordos à esquerda, num processo que vinha ao encontro do que muitos portugueses durante anos ansiaram, ou seja, ver a esquerda unida e empenhada num diálogo contínuo e sério.

Neste momento, o que profundamente desejamos é que as diferenças que existem entres os vários partidos de esquerda não sejam motivo para anular a união histórica conseguida e que se mantenha indomável a sua vontade de superar os momentos difíceis, que a todo o momento surgem, interna e externamente, não cedendo igualmente a tentações de protagonismo ou ao desejo tão em moda de decidir rápido e atabalhoadamente.

2. As eleições de 4 de Outubro trouxeram a gratificante surpresa de um novo partido na Assembleia da República – PAN – que  interveio no diálogo com António Costa, o que seguramente contribuirá para a concretização de medidas em defesa dos animais, um tema que recolhe o apoio de cada vez mais portugueses, muitos dos quais, num trabalho voluntário pela causa.

O que se passou no canil municipal de Lisboa é um exemplo a registar. Na verdade, se o pesadelo que constituía a sua direcção e o seu funcionamento se desvaneceu, dando lugar, em Julho de 2014, à Casa dos Animais de Lisboa (CAL) e a uma nova direcção, cuja postura se elogia por estar à altura de uma verdadeira defesa dos animais, isso ficou a dever-se ao trabalho incansável do Grupo de Lisboa da Campanha de Esterilização de Animais Abandonados, coordenado por Margarida Garrido, e ao seu persistente diálogo, nem sempre fácil, com a Câmara, ao longo de vários anos, tendo mesmo sido solicitada, em Maio de 2013, e dado o impasse criado, a intervenção directa do presidente António Costa.

Num trabalho conjunto de esterilização massiva de gatos silvestres, mediante a assinatura de protocolos entre a CAL e o referido Grupo, e ainda outro recém-formado e dele decorrente (Movimento de Esterilização de Gatos) tem-se vindo a actuar, com êxito, em inúmeras freguesias de Lisboa, procurando assim controlar “a sobrepopulação destes animais.” Esta situação comprova quão importante é que os cidadãos ajam no sentido da concretização do que pensam ser justo e dever ser solucionado, procurando o apoio dos partidos que, no fundo, os representam em instituições várias.

Vem a este propósito, e por contraste, referir a grave e desumana situação que ocorre junto ao cemitério do Lourel, em Sintra, sem que o canil municipal intervenha, indiferente às inúmeras denúncias de munícipes e de outras pessoas que in loco verificam o que ali se passa. Resume-se o caso ao abandono de dois cães, macho (pastor alemão) e fêmea. Em Junho de 2015, alguém alertou para o facto de a cadela estar grávida e de ser urgente que o canil a apanhasse para esterilizar. A falta de resposta ao problema determinou que de 2 se passasse para 6 animais, e neste momento, depois de novos e vãos pedidos de intervenção ao canil para esterilizar a cadela-mãe e uma filha, há mais duas novas ninhadas de cachorros, estimando-se agora o número de cães em 12, na melhor das hipóteses. Agrava o problema o facto de a cadela mais velha ter sido atropelada, encontrando-se com uma pata partida e numa magreza impressionante. As pessoas só podem atirar comida para o local onde os animais se encontram, receando-os por estarem sempre famintos, e o canil municipal em vez de intervir continua sereno no seu gabinete. Um comportamento que em nada se assemelha ao da Direcção da Casa dos Animais de Lisboa.

Esperará o canil de Sintra que aconteça um incidente para depois justificar o abate dos animais?

Professora

Sugerir correcção
Comentar