Eutanásia chega ao Parlamento numa altura em que aumentam os testamentos vitais

Movimento quer que despenalização da eutanásia seja votada no Parlamento e está disposto a avançar com iniciativa legislativa popular. Até esta terça-feira, 2567 pessoas tinham feito testamentos vitais.

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A demora dos pareceres tem contribuído para arrastar os casos de negligência médica nos tribunais Nuno Ferreira Santos

O movimento cívico Direito a morrer com dignidade admite dinamizar uma iniciativa legislativa de cidadãos, que necessita de um mínimo de 35 mil assinaturas, se nenhum grupo parlamentar avançar com um projecto-de-lei para a despenalização da eutanásia. Mas esta segunda-feira o Bloco de Esquerda (BE) garantiu que vai apresentar uma iniciativa legislativa nesse sentido, ainda que num horizonte temporal alargado, até ao final da legislatura.

Com mais de 8400 assinaturas, a petição pela despenalização da morte assistida (eutanásia e suicídio medicamente assistido) entregue à tarde ao presidente da Assembleia da República vai ser discutida no plenário da Assembleia da República mas não será votada. Por isso, antes da discussão, os representantes do movimento - que colocou o tema na ordem do dia com a divulgação, em Novembro, de um manifesto subscrito por mais de cem personalidades - vão pedir audiências a todos os grupos parlamentares para os sensibilizarem para esta temática.

Num texto lido pelo médico e professor catedrático jubilado Machado Caetano, deixam claro que se ninguém avançar avançam eles. Como? Dinamizando “uma iniciativa legislativa de cidadãos", que precisa no mínimo de 35 mil assinaturas para ser votada no Parlamento. Também já está marcado para 18 de Junho um seminário com profissionais de saúde, juristas, filósofos e bioeticistas para discutir os pontos principais do modelo de eutanasia e suicídio assistido em Portugal. 

Reafirmando a recusa de um referendo, como tem sido reclamado por várias personalidades, os representantes do movimento frisam que tanto a petição como o manifesto pretendem que deixe de ser crime a ajuda à antecipação da morte a pedido consciente da pessoa doente. No fundo, explicam, trata-se de “despenalizar os raros casos de antecipação de morte a pedido dos doentes" que se encontrem "em sofrimento implacável e sem qualquer esperança de cura ou remissão”.

Tudo indica que o facto de este tema estar na ordem do dia estará, para já, a fazer com que o número de pessoas que redigem um testamento vital esteja a aumentar. Em menos de quatro meses, cerca de meia centena de portugueses preencheram o seu testamento vital, documento em que deixam claro a que tipo de tratamentos aceitam ser submetidos, caso fiquem impossibilitados de decidir no fim da vida. Até esta terça-feira, existiam 2567 testamentos vitais, segundo dados do Ministério da Saúde, quando, no final do ano passado, um ano e meio depois de os testamentos vitais começarem a poder ser feitos através da internet, eram 2052.

BE quer apresentar "uma boa lei"

Entretanto, os partidos políticos não têm pressa, incluindo o BE que assegura que vai apresentar um projecto de lei mas apenas mais tarde, até porque quer apresentar “uma boa lei”, como explicou José Manuel Pureza. ”É preciso continuar o debate e ponderar qual é o melhor momento para apresentar a iniciativa, porque o tema é complexo e exige minúcia e rigor", acrescentou. Este é o momento de discutir a petição "para que ela seja respeitada na sua totalidade" e só mais tarde haverá produção legislativa.

Nos outros partidos, não há compromisso com qualquer tipo de posição. Pela parte do PS, a deputada Maria Antónia Almeida Santos, que assinou o manifesto, assume que  vai levar este tema ao próximo congresso do partido, mas ainda não sabe em que moldes. “Poderá ser através de uma intervenção ou de uma moção. Acho que há quase uma obrigação de a petição ter consequências e não se ficar apenas pela discussão, depois de um processo que não se quer apressado”, explicou ao PÚBLICO.

Do lado do PSD, o que se sabe é que os deputados terão liberdade de voto. O líder da bancada, Luís Montenegro, disse à Renascença na semana passada que esta matéria “interpela aquilo que são as convicções pessoais e de consciência de cada um dos deputados” e o deputado Miguel Santos acrescentou ao PÚBLICO que, no partido, estão "abertos à discussão". "Vale a pena fazê-la", considera Miguel Santos, ainda que note que  "a sociedade civil não está muito desperta para este tema". Para o deputado, será previsível que se venha a promover entretanto a audição de especialistas, associações e entidades, dada a complexidade do assunto. O PCP não se pronunciou ainda sobre o tema e no CDS-PP foi aprovado o não à ideia, sem votos contra, no Conselho Nacional do partido este mês.

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