O pacto que é preciso acontecer
Vamos precisar de um Ministro da Saúde que queira ser mais do que um agente anódino.
O estado atual da saúde dos Portugueses resulta de uma contínua evolução de virtuosos investimentos em múltiplas áreas de que se devem realçar o saneamento básico, a rede de transportes e acessibilidades, o combate ao analfabetismo, a escolaridade obrigatória, a melhor preparação dos profissionais de saúde, a emergência de novas profissões, a rede de emergência pré-hospitalar e as tecnologias de saúde, para só referir alguns dos sucessivos acontecimentos que têm marcado o nosso País, em particular depois da adesão à União Europeia. Tudo isto está estruturado num sistema de saúde onde o Serviço Nacional de Saúde, e todo o enquadramento legal que o rodeia, são as peças centrais. Nesta sucessão de acontecimentos positivos para a saúde dos Portugueses não se pode atribuir méritos a nenhum Governo, singularmente considerado, mas, com especial reverência, deve-se agradecer aos profissionais, que têm feito funcionar o País, e aos Portugueses, que são os criadores e beneficiários da saúde que temos. Contudo, esta saúde ainda está longe de ser a ideal, pelo que, demonstradas a tendência para o aumento da longevidade e a estabilidade da mortalidade infantil, há que ganhar a batalha de aumentar o número de anos vividos com qualidade e, como condição prévia, diminuir significativamente a mortalidade que ocorre antes dos 70 anos. Para atingir estes desideratos faz sentido que exista um pacto político para a saúde. Mas esse pacto terá de ser mais abrangente e não poderá estar apenas confinado à declaração de vontades políticas em torno da sustentabilidade do sistema de saúde. Terá de ser um consenso que seja mais do que um texto. Um pacto para a saúde tem de ser um compromisso de cidadania em que todos os Portugueses se revejam.
Tal como não há quem possa reclamar, só para si, os ganhos obtidos na saúde em Portugal, culpar o Governo em funções, seja ele qual for, da exclusiva responsabilidade do que de mau aconteça é um absurdo e uma desonestidade. Contentarem-se com a dramatização e crítica destrutiva, amedrontar os portugueses com o colapso do SNS, como os Partidos do ajuntamento que agora nos governa fizeram durante os anos da coligação PSD-CDS, foi um erro que só serviu para cavar fossos. Saúda-se, por isso, que haja, no PS e no XXI Governo, quem queira, depois de quase 5 anos de recusa de diálogo e de profundo entrincheiramento ideológico, encetar um discurso sério e profícuo que possa contribuir para o modelo, adoção e implementação de medidas que levem à melhoria sustentada da situação sanitária em Portugal.
Assim, vamos precisar de um Ministro da Saúde que queira ser mais do que um agente anódino, que procura a pacificação por via da inação, ou um venturoso “politicamente correto”, que navega por entre os pingos da chuva dos problemas. Tal como precisamos de uma oposição que não tenha medo de afrontar os limites do pré-estabelecido e não receie ideias que possam ser potencialmente menos populares. Neste caso, há necessidade de fazer alguma coisa para que haja mudança, não para que tudo fique na mesma. Garantir um futuro melhor, com menos doenças, mais saúde, melhor SNS e menos custos exige saber ultrapassar diferenças e saber trabalhar no que nos une.
Ex-Ministro da Saúde, Professor da Escola Nacional de Saúde