‘Bora lá, Portugal: vamos sair da UE!
Adoro quando Catarina faz voz grossa e imagino o pânico de Merkel – um Tuguexit!
Uma das consequências maçadoras do Bloco de Esquerda fazer parte da solução de governo inventada por António Costa é sermos obrigados a levar a sério aquilo que Catarina Martins propõe. Antigamente, os congressos do Bloco eram uma breve notícia que líamos ensonados nos diários de segunda-feira. Agora dão origem a várias páginas nos jornais e directos nas televisões. Antigamente, se o Bloco ameaçava com um referendo sobre a permanência de Portugal na União Europeia, o comentário mais longo sobre o tema seria “pfffff”. Agora estamos tristemente condenados a articular palavras.
Articulemos, pois, até porque Catarina Martins teve este fim-de-semana o seu momento Pedro Nuno “As Pernas Até Lhes Tremem” Santos. Recordam-se com certeza que em 2011 o então escanhoado vice-presidente da bancada parlamentar do PS disse, a propósito do pagamento da dívida, que estava a “marimbar-se para os nossos credores”. “Nós temos uma bomba atómica que podemos usar na cara dos alemães e dos franceses”, afirmou. “Ou os senhores se põem finos ou nós não pagamos. E se nós lhes dissermos que não pagamos a dívida, as pernas dos banqueiros alemães até tremem.”
Certamente inspirada pela presença de Pedro Nuno Santos no congresso, Catarina Martins teve o seu momento “As Pernas Até Lhes Tremem”, não com a dívida, mas com um referendo à presença de Portugal na União Europeia. “Se a Comissão Europeia aplicar uma sanção inédita e inaceitável e provocatória pelo mau desempenho das contas de Passos Coelho e Maria Luís Albuquerque, enquanto aplicaram as medidas da troika, declara guerra a Portugal. Neste caso, Portugal só pode responder recusando as sanções e anunciando que está disposto a pôr na ordem do dia um referendo para tomar posição contra a chantagem.” Adoro quando Catarina faz voz grossa e imagino o pânico de Merkel – um Tuguexit! Conhecem a anedota do elefante e da formiga que foram ao cinema? A formiga ficou sentada atrás do elefante. Como não conseguia ver nada, levantou-se, foi sentar-se na cadeira à frente do elefante e disse-lhe: “É tramado, não é?”
É, Catarina, é tramadíssimo. Proponho, aliás, um duplo referendo: perguntamos aos portugueses se querem a União Europeia e perguntamos aos cidadãos da União Europeia se querem Portugal. Porque quando Catarina Martins acusa os políticos europeus de “mostrarem todos os dias que estão dispostos a destroçar a Europa para aguentar uma política que assusta os povos”, ela esquece-se de responder a duas questões fundamentais: que “política” e que “povos”. Um dos maiores atentados à lógica nas discussões acerca do futuro da Europa está em considerar que existe uma única política responsável por todos os males e um povo europeu imbuído de um único desejo. Nada disso existe. Os ingleses não votaram pela saída porque os portugueses sofreram muita austeridade. Votaram “leave” por quererem mais soberania, mais controlo de fronteiras, mais foco nos seus problemas e menos países – como Portugal, Espanha ou Grécia – a chatear. Convém recordar que foram ingleses que inventaram a sigla PIIGS. O problema da União Europeia é precisamente esse: a incapacidade em conciliar interesses contraditórios. E dá-se o notável fenómeno de os pobres países torturados do Sul quererem com toda a força permanecer na União – até os gregos! E os países ricos do Norte, esses torturadores, começarem a querer dar à sola. Explica lá isto, Catarina.