Moçambique: pelo menos 56 mortos em manifestações desde 2.ª feira

No total do país, além dos 56 mortos, houve ainda 152 pessoas que foram baleadas. Hospital da Beira considera situação preocupante. “Temos doentes nos corredores e estamos a ficar sem capacidade”.

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Cidade da Beira, Moçambique (foto de arquivo) Daniel Rocha
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Pelo menos 56 pessoas morreram em Moçambique desde segunda-feira, na sequência da contestação aos resultados das eleições gerais moçambicanas, e 152 foram baleadas, segundo balanço feito nesta quarta-feira pela plataforma eleitoral Decide. Só na região da Beira, morreram 18 pessoas vítimas de balas e outras 81 contraíram ferimentos e estão em tratamento. Hospital local está preocupado com a situação.

De acordo com o levantamento daquela Organização Não-Governamental (ONG) que monitoriza os processos eleitorais em Moçambique, com dados de 23 e 24 de Dezembro, 31 das vítimas mortais registaram-se na província de Sofala, centro do país, e nove em Nampula, no norte, além de seis em Maputo (cidade e província), no sul.

Dos 152 baleamentos, aquela ONG contabiliza 56 na cidade de Maputo e outros tantos em Sofala, apontando ainda um total de 102 detenções, 40 das quais na cidade capital, onde uma pessoa está desaparecida.

O Conselho Constitucional de Moçambique proclamou na tarde de segunda-feira Daniel Chapo, candidato apoiado pela Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo, no poder), como vencedor da eleição a Presidente da República, com 65,17% dos votos, sucedendo no cargo a Filipe Nyusi, bem como a vitória da Frelimo, que manteve a maioria parlamentar, nas eleições gerais de 9 de Outubro.

Este anúncio provocou o caos em todo o país, com manifestantes pró-Venâncio Mondlane — que segundo o Conselho Constitucional obteve apenas 24% dos votos — nas ruas, barricadas, pilhagens e confrontos com a polícia, que tem vindo a realizar disparos para tentar a desmobilização.

Armazéns na periferia de Maputo estão hoje a ser saqueados por centenas de populares.

Antes, nas paralisações e manifestações de contestação convocadas por Venâncio Mondlane, aquela ONG já tinha contabilizado 120 mortos, desde 21 de Outubro.

A polícia moçambicana registou 236 “actos de violência grave” em 24 horas, na contestação aos resultados eleitorais, incluindo ataques a esquadras e cadeias, que provocaram 21 mortos, anunciou na terça-feira à noite o ministro do Interior, garantindo o reforço imediato da segurança.

“Ninguém pode chamar, nem considerar, estes actos criminosos de manifestações pacíficas”, afirmou esta noite o ministro Pascoal Ronda, em conferência de imprensa em Maputo, num momento de caos generalizado no país, com barricadas, saques, vandalizações e ataques diversos, um dia depois do anúncio dos resultados finais das eleições gerais de 9 de Outubro.

O governante revelou que entre essas 236 ocorrências nas últimas 24 horas “em todo o território”, incluem-se 25 viaturas incendiadas, duas das quais da Polícia da República de Moçambique (PRM), 11 subunidades policiais e um estabelecimento penitenciário “atacados e vandalizados, de onde foram retirados 86 reclusos”, quatro portagens incendiadas, três unidades sanitárias vandalizadas, um armazém central de medicamentos incendiado e vandalizado e dez sedes do partido Frelimo incendiadas.

“Tiveram como consequências 21 óbitos, dos quais dois membros da PRM, 25 feridos, sendo 13 civis e 12 membros da PRM”, acrescentou Pascoal Ronda, dando conta que 78 pessoas foram detidas e que a polícia está a investigar os autores morais e materiais destes crimes, que representam um momento “difícil” e “nefasto”.

“Diante da gravidade dos eventos registados, o Governo de Moçambique determinou o reforço imediato de medidas de segurança em todo o território nacional e as Forças de Defesa e Segurança [FDS] vão intensificar a presença em pontos estratégicos e críticos”, avançou ainda Pascoal Ronda.

Situação crítica na Beira

Só na região da Beira, morreram 18 pessoas e 81 foram baleadas desde segunda-feira nas manifestações de contestação aos resultados das , segundo o balanço feito hoje pelo hospital local, no centro do país.

“A situação é muito preocupante. Temos doentes nos corredores do hospital e estamos a ficar sem capacidade. No total são 18 pessoas que morreram vítimas de balas e outras 81 contraíram ferimentos e que estão em tratamento”, disse Ana Tambo, directora clínica do Hospital Central da Beira, na província de Sofala.

A responsável acrescentou, no balanço preliminar dos feridos que deram entrada em resultados das manifestações, que dos 18 óbitos, oito ocorrem já no hospital e os restantes já chegaram sem vida.

Referiu ainda que dos 81 feridos recebidos no HCB, alguns contraíram traumatismo craniano em resultado de baleamento, outros apresentam fracturas nos membros superiores e inferiores e outros têm balas alojadas no corpo.

“Temos uma anciã de 76 anos de idade que tem uma bala alojada no seu tórax e contraiu ferimentos nos membros inferiores. Segundo o seu histórico médico, ela foi baleada na sua residência na Munhava”, disse ainda Ana Tambo.


*Notícia actualizada às 13h com dados gerais do país e não apenas da Beira.