Assad diz que não queria sair da Síria e que foi retirado pela Rússia
O comentário, numa declaração publicada no canal Telegram da presidência síria a partir de Moscovo, foi o primeiro de Assad em público desde que foi derrubado há mais de uma semana.
Bashar al-Assad disse, esta segunda-feira, que foi retirado para a Rússia a partir da base aérea de Hmeimim, na Síria, na noite de 8 de Dezembro, quando esta foi alvo de ataques de drones, depois de ter deixado Damasco nessa manhã, com o cerco dos rebeldes a ficar cada vez mais apertado. “A minha partida não foi planeada, nem ocorreu durante as últimas horas das hostilidades”, garantiu.
A declaração publicada no canal Telegram da presidência síria e datada de 16 de Dezembro a partir de Moscovo marca a primeira vez que Assad fala em público desde que o seu regime caiu há mais de uma semana.
“Ao chegar à base aérea de manhã, tornou-se claro que as nossas forças se tinham retirado completamente de todas as linhas de defesa e que as últimas posições do exército tinham cedido”, relatou Assad. Depois, a base aérea de Hmeimim, controlada pela Rússia, foi alvo de um ataque de drones e deixou de “haver meios viáveis para sair”. Foi aí que Moscovo solicitou uma “retirada imediata para a Rússia” na noite de domingo, 8 de Dezembro.
O ditador sírio garantiu que queria ficar em Damasco e continuar a lutar, mas foi obrigado a deixar a Síria pela Rússia, negando as acusações que dizem que omitiu a fuga já planeada para Moscovo tanto de assessores como dos familiares. “Quando houver oportunidade”, afirmou, irá relatar com pormenor todos os acontecimentos recentes na Síria.
“Quando o Estado cai nas mãos do terrorismo e se perde a capacidade de dar uma contribuição significativa, qualquer cargo perde o propósito”, acrescentou na mensagem.
Ainda no mesmo domingo, uma fonte do Kremlin confirmou à TASS, agência de notícias estatal russa, que Bashar al-Assad e a família estavam na Rússia, mas ainda não se sabe ainda ao certo onde estão. Não surgiram, até agora, fotografias do ditador sírio no país e o Presidente russo, Vladimir Putin, ainda não comentou a queda do regime de Assad. O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, disse esta segunda-feira que a Rússia está “em contacto com os representantes das forças que controlam agora a situação no país”.
Assad aproveitou para afastar e desmentir os relatos que documentam a vasta corrupção da família que têm sido tornados públicos desde que se exilou na Rússia. Ao longo de dois anos, o banco de Assad terá transportado cerca de 250 milhões de dólares em dinheiro para Moscovo para cobrir dívidas de apoio militar. A família alargada comprava secretamente bens em Moscovo: em 2019, o Financial Times noticiou que, desde 2013, tinham adquirido pelo menos 20 apartamentos de luxo em Moscovo, utilizando uma série complexa de empresas e acordos de empréstimo.
“Reafirmo que a pessoa que, desde o primeiro dia da guerra, se recusou a trocar a salvação da sua nação por ganhos pessoais, ou a comprometer o seu povo em troca de inúmeras ofertas e benefícios, é a mesma pessoa que esteve ao lado dos oficiais e soldados do exército na linha da frente, a poucos metros dos terroristas, nos campos de batalha mais perigosos e intensos”, afirmou.
No passado dia 8 de Dezembro, os rebeldes sírios anunciaram que a Síria está “livre de Assad”. O ditador sírio, que tinha herdado o poder do pai há 24 anos, saiu do país ainda antes de as forças opositoras terem alcançado Damasco. Os rebeldes tomaram a cidade e foi comunicado aos militares que o regime de Bashar al-Assad tinha caído.
Uma semana e meia antes, os opositores começaram por tomar Idlib, no Noroeste, e, dia após dia, foram assumindo controlo das cidades mais importantes do país até chegarem à capital. Nessa noite de domingo, um porta-voz das forças lideradas pelos islamistas do Hayat Tahrir Al-Sham (HTS) anunciou: “Damasco foi libertada e o tirano Bashar al-Assad foi derrubado, e os prisioneiros oprimidos nas prisões do regime foram libertados.”
Os rebeldes informaram que o poder transitaria para a alçada de um governo provisório. Seguiram-se enchentes nas ruas, muitas mãos a agitar bandeiras e vozes a entoar músicas de liberdade. Também no Líbano, um dos países que mais sírios acolheram desde 2011, houve festejos em várias locais.
Esta segunda-feira, o enviado especial das Nações Unidas para a Síria, Geir Pedersen, visitou Damasco e disse às forças opositoras que derrubaram Assad que a transição deve ser “credível e inclusiva”. Geir Pedersen acrescentou ainda que a ONU espera “um fim rápido das sanções” para que seja possível “ver uma mobilização em torno da construção da Síria”.
Israel tem atacado constantemente a Síria desde dia 8 de Dezembro com o objectivo declarado de destruir arsenal militar do regime de Assad, de forma a impedir que essas armas sejam utilizadas para atacar território israelita. O Observatório Sírio dos Direitos Humanos (OSDH), organização não governamental com sede em Londres e com uma extensa rede de informadores na Síria, já disse que estes são os ataques “mais pesados desde 2012” na região costeira de Tartus, onde há uma base naval russa.