Com a chegada da época natalícia, chegam também os jovens e crianças à porta dos supermercados, a distribuir sacos do Banco Alimentar. Com uma estratégia bem desenhada, estes pequenos com um ar inocente são utilizados como chantagem emocional perante os cidadãos na sua rotina do dia-a-dia.
Se achavam que após um dia de trabalho, em que vão fazer as vossas compras, para depois chegarem a casa e tratar do jantar, iriam ter descanso, desenganem-se, terão apontados a vocês os olhos de uma criança de classe média, que até agora tem sido ensinada que entregar estes sacos é o maior acto exequível para ajudar os mais necessitados.
Mas não se combate a fome, consequência de uma situação de pobreza, com campanhas sazonais e discursos cheios de boas intenções. Combate-se através da construção de políticas sociais, desenhadas com o foco na erradicação da pobreza, mas isso não interessa às grandes empresas, para eles é mais benéfico manter este círculo vicioso. O Capital não pretende melhorar as condições sociais dos cidadãos, tem como objectivo a criação de lucro e é aí que os Bancos Alimentares lhes servem de sobremaneira.
Instituições sociais, com o foco na caridade, que permitem a todos uma performance de trabalho e preocupação com as condições do outro. Porque continuamos num país que assenta a sua estrutura empresarial numa política de baixos salários, atravessamos uma crise habitacional, causada principalmente pela especulação imobiliária, que resulta numa população que passa a vida a ter de se gerir com o muito pouco que sobra e a quem é pedido para ajudar os que ainda têm menos.
E no final, alterou-se alguma coisa?
Nada, a sequência continua, no próximo ano voltaremos a ouvir os números de famílias que não têm rendimento suficiente para conseguirem comprar a sua alimentação, voltaremos a ter as notícias dos volumes angariados pelo Banco Alimentar e assim sucessivamente.
Porque não é do real interesse, daqueles que beneficiam dos resultados do grande capital, acabar com ele. Por isso dá imenso jeito, por exemplo, aos grandes grupos de retalho, permitir que estes jovens estejam parados à sua porta, ajuda na transmissão da ideia de que se preocupam e trabalham para a melhoria das condições reais destas pessoas, sem na realidade efectuarem nenhuma acção.
Para erradicar a fome não basta recolher alimentos e distribuí-los, por mais altruísta que seja a nossa motivação. É necessário garantir que são desenhadas estratégias e políticas que garantam que os cidadãos tenham uma vida digna, que tenham acesso a uma remuneração adequada e habitação acessível, para que consigam pagar pela sua alimentação, tal como desenvolver família, caso assim o desejem e garantir a alimentação dessa família.
O saquinho de papel é bonito, o gesto de cada um dos cidadãos que contribui deve ser valorizado, mas temos de ir para lá disso, temos de entender que o objectivo destas instituições falha quando o foco não passa pela transformação social que necessitamos, tornando-se assim uma bengala de quem mantém esta sociedade com fome.