Teresa Alegre Portugal - uma lutadora por causas nunca morre

Foi deputada na Assembleia da República, mas sobretudo deputada municipal e vereadora da Cultura de Coimbra; foi militante do PS, mas afirmou sempre a sua independência.

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No meio de tantas notícias sobre o falecimento de meus familiares e amigos, chegou-me mais uma — a morte da Teresa Alegre Portugal. Os jornais registaram o facto com frases em que falavam do seu trabalho cultural e político, salientando sobretudo o que fez a nível regional e local: "A sua ligação à cultura e ao ensino, aliada à sua dedicação à vida política, fazem com que Teresa Alegre Portugal seja recordada como uma figura marcante para a cidade de Coimbra e para o universo socialista local" — dizia o Diário de Coimbra.

Será assim, porque, numa sociedade profundamente centralista e de espectáculo, recordam-se como figuras de significado nacional, com justiça ou não, as que frequentemente surgem nos meios de comunicação social. As que trabalham discretamente na "Província" são consideradas figuras não direi secundárias, mas de relevância essencialmente local ou regional. Daí que os meios de informação nacionais não tenham anunciado a morte de Teresa Portugal ou pouco tenham dito, reflectindo geralmente as informações regionais. E, no fundo, por contraditório que pareça, esse relativo silêncio talvez se justifique, porque todos os que lutam ao longo da vida em termos de cidadania e nada fazem para serem lembrados nunca morrem.

É o caso da Teresa, que foi deputada na Assembleia da República, mas sobretudo deputada municipal e vereadora da Cultura de Coimbra, o que nunca aqui foi esquecido; foi militante do PS, mas afirmou sempre a sua independência, lutando muitas vezes por causas fora do sistema que todos os partidos acabam por impor; foi prática, mas lutou fundamentalmente por princípios; originária de uma família de oposição ao Estado Novo com créditos políticos e culturais — irmã de Manuel Alegre e esposa do guitarrista da canção de Coimbra e de baladas de intervenção, António Portugal —, nada fez para conseguir qualquer estatuto especial; enfim, foi uma pessoa que poderia ter sido tudo, mas que nada quis nesta sociedade pragmática, nem fez para se impor…

Para mim, recordá-la-ei como colega no ensino, desde que eu era um simples assistente e aprendiz de historiador e conversávamos, num velho colégio onde eu dava aulas de Filosofia e a Teresa de Inglês e de Alemão, sobre a vida nacional, com a angústia de quem não via meios para ser destruída a ditadura e pôr fim à Guerra Colonial (eu viera há pouco tempo Guiné), até ao dia 16 do último mês de Outubro, quando participámos num debate, que será para mim inesquecível, sobre a vida de Coimbra nos anos 50 e 60, a convite do Departamento de Arquitectura. Recordá-la-ei como uma mulher combatente por princípios e por causas, muitas delas perdidas, inteligente e sempre solidária.

Na verdade, pessoas assim não morrem e pertencem a todos os universos. Mesmo ao universo do silêncio. Nunca, porém, ao do esquecimento.

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