Polícias querem levar direito à greve ao Constitucional e consideram que Montenegro desautorizou ministra

Poucas horas depois de dizer que admitia discutir o direito à greve dos polícias, Margarida Blasco recuou. ASPP diz que vai “iniciar diligências” junto do Tribunal Constitucional e dos partidos.

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A ministra da Admnistração Interna, Margarida Blasco, esteve no Congresso da Associação Sindical dos Profissionais da Polícia, em Lisboa TIAGO PETINGA / LUSA
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Os sindicatos da polícia consideram que a ministra da Administração Interna (MAI), Margarida Blasco, foi desautorizada pelo primeiro-ministro, Luís Montenegro, quando, horas depois de ter dito que admitia discutir o direito à greve, o seu ministério enviou um comunicado a esclarecer que afinal esse tema não fazia parte das negociações previstas para Janeiro. Face ao impasse, a Associação Sindical dos Profissionais da Polícia (ASPP/PSP) anunciou que vai "iniciar diligências" junto do Tribunal Constitucional e dos partidos políticos para discutir o direito à greve em Portugal.

Ao PÚBLICO, Paulo Santos, presidente da ASPP/PSP, lembrou que as declarações iniciais da ministra foram proferidas no âmbito do Congresso da ASPP, onde foi abordado, entre outros assuntos, o direito à greve nas polícias”. “Concluiu-se que o direito à greve não está proibido pela Constituição da República Portuguesa e que não há qualquer incompatibilidade entre esse direito efectivo e uma prestação de segurança pública”, afirmou Paulo Santos, sublinhando que “a ministra demonstrou sensibilidade e compreensão”. Porém, segundo Paulo Santos, a ministra foi “mais tarde desautorizada”.

Apesar de considerar que estão em causa "decisões internas do funcionamento do Governo” que a ASPP prefere abster-se de comentar, o sindicalista dirige um apelo “ao poder político, especialmente a Luís Montenegro”, pedindo-lhe que "evolua na sua interpretação para ir ao encontro da liberdade e da liberdade sindical pura, sem medos e sem receios, pois a maturidade dos polícias é uma realidade e existem mecanismos de salvaguarda, como, por exemplo, os serviços mínimos".

A abertura da ministra relativamente ao direito à greve dos polícias fez com que Armando Ferreira, presidente do Sindicato Nacional da Polícia (SINAPOL), lhe tivesse dado pela “primeira vez nota positiva". Concomitantemente, o Governo merece-lhe “obviamente nota negativa". “Durante muitos anos em Portugal tudo foi feito para impedir os sindicatos na PSP e há anos que se tenta impedir o direito a greve”, recorda, dizendo-se convencido de que o direito à greve entre os agentes das forças de segurança “vai acontecer mais cedo ou mais tarde”.

“Era melhor que acontecesse pelo diálogo e negociação e não através do recurso à Justiça”, considerou. Armando Ferreira defende que o “direito à greve está consagrado na Constituição, que não o veda à polícia”. “Há uma restrição, limitações, mas não proíbe”, alegou, acrescentando que “esta reivindicação é algo muito anterior à existência de alguns partidos que agora a vêem defender”.

“Já em 2010 eu fui suspenso porque fiz um pré-aviso de greve. O processo foi arquivado e foi-me dada razão”, recordou.

Também Bruno Pereira do Sindicato Nacional de Oficiais de Polícia (SNOP) considerou que o Governo não tinha necessidade de colocar a ministra nesta situação. “É uma situação que no limite chega a roçar a tragicomédia. Como é que há uma alteração de posição num espaço de apenas algumas horas?", questionou.

“O primeiro-ministro tinha assumido, quando ainda era candidato, que esta questão não devia ser discutida e houve um desencontro de opiniões”, interpretou, acrescentando que, “a ministra, por motu próprio, e não se recordando disso, assumiu uma posição em relação a uma discussão onde não pode haver assuntos tabus”.

“O direito à greve, tratando-se de um direito dentro das liberdades e garantias, que constitui um dos direitos laborais mais importantes da Constituição, não pode ser um tema tabu”, insistiu.

Para Bruno Pereira, “a Constituição abre a porta a que direitos fundamentais possam ser restringidos, mas não diz nem poderia dizer que o direito x ou y relativamente aquele pode ser absolutamente suprimido”, disse, acrescentando que “isso seria inconstitucional”. “Dizer-se, de forma canónica e dogmática, que não se quer discutir este assunto também não me parece um bom princípio”, atirou, lembrando que outras forças de segurança têm direito à greve, nomeadamente a Polícia Judiciária (PJ). “Não ficou bem ao Governo vir dar o dito por não dito", afirmou.

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