Processo Vórtex: Pessegueiro diz que Câmara de Espinho “atravessou-se” para aprovar projeto imobiliário

Empresário disse acreditar que o ex-presidente da Câmara de Espinho, Miguel Reis, tenha exercido pressão sobre arquitecto para aprovar de forma célere o projecto de arquitectura do 32 Nascente.

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Ministério Público deduziu acusação contra oito arguidos e cinco empresas, incluindo dois ex-presidentes da Câmara de Espinho, Miguel Reis e Pinto Moreira (à direita na foto) JOSÉ COELHO / LUSA
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O empresário Francisco Pessegueiro, arguido no processo Vórtex, disse esta quinta-feira em tribunal que a Câmara de Espinho, tal como ele, se "atravessou" para garantir que o projecto do empreendimento 32 Nascente andasse "à velocidade da luz".

"Havia uma relação de confiança absoluta [entre Pessegueiro e a autarquia], e de certa forma a câmara [à data liderada por Miguel Reis, também arguido] atravessou-se, e eu também, porque havia um projecto que estava atrasado e [a autarquia] teria culpa e por isso ajudou", reconheceu o construtor, cuja inquirição foi retomada esta quinta-feira.

Respondendo ao Ministério Público (MP), o empresário disse acreditar que o ex-presidente da Câmara de Espinho, Miguel Reis, tenha exercido pressão sobre o arquitecto Pedro Castro e Silva, também arguido processo Vórtex, para aprovar de forma célere o projecto de arquitectura referente àquele empreendimento, uma vez que em jogo estava uma contrapartida para a autarquia.

Na sexta audiência de julgamento, o empresário contou ao colectivo de juízes que a autarquia exigiu como contrapartida, para aprovar o projecto em causa, que o promotor assumisse os custos de execução de um arruamento com uma dimensão diferente da que constava do Pedido de Informação Prévia (PIP) inicialmente apresentado.

"Acredito que tenha feito pressão, porque havia uma contrapartida. Isso é inegável", declarou, reconhecendo que o arquitecto Pedro Castro e Silva [arguido] não tinha conhecimento das taxas de urgência que haviam sido pedidas por Miguel Reis que lhe garantiu que ia "pôr tudo a andar à velocidade da luz".

De acordo com o arguido, a autarquia estava a trabalhar num projecto de desenvolvimento da zona nascente da cidade e queria aproveitar o empreendimento em causa para o alavancar.

Como condição para aprovação do 32 Nascente, o promotor Paulo Malafaia (também arguido) teria de suportar os custos da execução de arruamento que, em área, era cerca do dobro do inicialmente previsto no PIP.

"Houve um abuso da parte deles [câmara] que queriam fazer ali alguma coisa e nós é que tínhamos de fazer aquilo tudo", disse.

Francisco Pessegueiro assume, aliás, que "foi esse arruamento que deu azo a esta celeuma toda", facto pelo qual pediu ao tribunal a junção de dois documentos - o PIP inicial e o levantamento topográfico - que a defesa advoga serem essenciais ao apuramento da verdade.

O construtor esclareceu que o arruamento inicialmente previsto e aprovado faria a ligação à garagem dos dois edifícios a construir, numa extensão de cerca de 300 metros.

A condição imposta pela autarquia de prolongar este arruamento implicava a negociação e compra dos terrenos confinantes, alguma propriedade privada, outros municipais, tal como cinco casas existentes naquele local.

Como contrapartida, o construtor beneficiaria de um aumento da capacidade construtiva em cerca de mais dois mil metros.

"Ou tinha o arruamento ou não tinha licença. Eles querem, podem e mandam. Eu não tinha grande hipótese. Teria de o executar [o arruamento] e ponto", declarou, recordando estar pressionado para cumprir o prazo imposto por Paulo Malafaia de ver o projecto aprovado até 31 de Dezembro de 2022.

O processo Vórtex está relacionado com "projectos imobiliários e respectivo licenciamento, respeitantes a edifícios multifamiliares e unidades hoteleiras, envolvendo interesses urbanísticos de dezenas de milhões de euros, tramitados em benefício de determinados operadores económicos".

A operação culminou em 10 de Janeiro de 2023 com a detenção do então presidente da Câmara de Espinho, Miguel Reis (PS), o chefe da Divisão de Urbanismo e Ambiente daquela autarquia, um arquitecto e dois empresários por suspeitas de corrupção activa e passiva, prevaricação, abuso de poderes e tráfico de influências.

Em 10 de Julho do mesmo ano, o Ministério Público deduziu acusação contra oito arguidos e cinco empresas, incluindo dois ex-presidentes da Câmara de Espinho, Miguel Reis e Pinto Moreira, que também viria a ser constituído arguido no âmbito deste processo, após ter sido ouvido no Departamento de Investigação e Acção Penal Regional do Porto.